Exames do Salazar

O Sr. Ministro Nuno Crato resolveu introduzir exames no fim do 4º ano. Trata-se de mais uma medida ideológica que nãoEnsino Primário tem qualquer enquadramento pedagógico, mas que é muito bem aceite pelo sr. Senso-comum, que, infelizmente, também é parte importante da reflexão de muitos professores. Neste ponto, infelizmente, a ignorância de quem manda é acompanhada pelo desespero de quem trabalha.

Explico:

É normal (sim, a palavra não é excessiva!) encontrar alunos no 5º ano que não sabem ler ou escrever e quanto às operações, as tabuadas e outro tipo de conteúdos a situação é, em muitos casos catastrófica. Ora, para muitos docentes, a possibilidade de impedir a progressão dos alunos entre o 4º e o 5º é a solução para esta questão – ficam lá trás sugadinhos e não nos incomodam aqui. Pouco parecem preocupados em limpar o rio na nascente e estão apenas a pensar na foz.

Mas, Nuno Crato, na sua dimensão ideológica pró-pidesca, desconfia de tudo e de todos e resolveu fazer chegar às escolas um conjunto de normas para a organização destes exames que são absurdas e que mostram a desconfiança com que a administração olha para as escolas e, neste caso, para os professores.

Sugere o MEC que os exames dos meninos do  4º ano sejam concentrados na escola sede do Agrupamento, isto é, todos os meninos de 9 anos serão levados para a Escola Sede e aí realizarão exames vigiados por professores que não podem ser do 1ºciclo. E ocorrem-me algumas perguntas:

– para quê sujeitar estas crianças a esta dose de pressão acrescida?

– quem vai pagar a despesa dos autocarros para transportar os alunos? Em alguns casos estamos a falar de viagens de 30 e 40 km.

– o que vai acontecer nas escolas sede nesses dias? Não vão ter aulas? Então agora para realizar os exames do 4º ano os alunos do 5º ao 9º e em muitos casos, os do 12º têm que perder dois dias de aulas na recta final do ano? Que consequências?

Lamento mais uma vez que o voluntarismo ignorante de quem vive e conhece apenas o que fica dentro da segunda-circular venha incomodar as escolas e os professores. Mas lamento muito mais que venha perturbar e prejudicar a vida de tantas crianças. Não é assim que se faz o futuro, mas também não me parece que seja essa a maior das preocupações de Nuno Crato, companheiro de bando do Miguel Relvas.

Nota: Porque o serviço público é uma marca desta casa, deixo o link para o site onde pode ir buscar provas / exames dos anos anteriores e assim dar uma ajudinha aos mais novos aí da família.

Comments


  1. Não há comentário a fazer. Está aqui tudinho!!! 🙂

  2. Bufarinheiro says:

    Quem julgava que o Nuno Crato ia ser um bom Ministro da Educação já descobriu há algum tempo que ele é apenas, como dizes, mais um companheiro de bando do Miguel Relvas.

    • Hugo says:

      Comparar o Nuno Crato com o Miguel Relvas é como comparar um ISEG com uma Lusófona.


  3. Continua a desiludir….

    • João Paulo says:

      Confesso que nunca tive qualquer ilusão! Logo, desilusão não é um sentimento que me ocorra. Confirmação? Talvez!

  4. Maquiavel says:

    Parafraseando a despropósito:
    É normal (sim, a palavra não é excessiva!) encontrar alunos no 5º ano da Faculdade que não sabem ler ou escrever e quanto às operações, as tabuadas e outro tipo de conteúdos a situação é, em muitos casos catastrófica.

    E sim, concordo a 300% que pouco parecem preocupados em limpar o rio na nascente e estão apenas a pensar na foz, que näo só é mais caro, como é ineficaz! Nesse aspecto o Ensino em Portugal parece o Trancão, cuja foz (e näo mais a montante) foi limpa para a Expo98, mas depois…!


  5. Militares da GNR????? Mas os profs perderam a competência, a responsabilidade para o fazer?

  6. Pisca says:

    A seguir vem o quê o antigo exame da 3ª classe ? Havia sim é só procurarem


    • Chamado exame do 1º grau…no tempo do botas chegava perfeitamente,para estes, que são da mesma escola,também…

  7. Hugo says:

    Não entendo qual é o mal de exames na quarta classe e não me parece que “o Salazar fazia o mesmo” ou “coitadinhas das criancinhas” sejam argumentos válidos. Há pressão nos exames? Há e é bom que haja, porque as crianças não serão crianças para sempre e é preciso que se habituem a lidar com a responsabilidade. Eu sei que este conceito hoje está ultrapassado (porque actualmente as pessoas prevaricam à vontade ou não cumprem os objectivos impostos e não lhes acontece nada), mas, mesmo assim, eu acredito que incutir a noção de responsabilidade é um bom investimento.

    Quanto ao valor pedagógico da reprovação, não sei se será muito ou pouco elevado. Do que tenho a certeza é que o valor pedagógico do “passa tudo, quer saiba muito quer saiba pouco” é zero. Além disso o “passa tudo” dá a lição de que não vale a pena trabalhar. Para quê? Passa-se na mesma. Enquanto a reprovação passa a ideia de que só passa quem cumpre objectivos mínimos. Mais uma vez, responsabilidade, essa coisa ultrapassada.

    Em relação às crianças que não aprendem Matemática e que iscrevenhe muinto mal o purtuguês (em suma, os que são burros, ou, como se diz hoje, que têm “dificuldades de aprendizagem em virtude do ambiente sócio-psicológico envolvente”, tal como hoje se chama hiperactivas às crianças que não receberam educação dos pais), o próprio Ministério tinha proposto uma solução, que não sei se chegou a ser aplicada ou não, que era encaminhá-los para cursos profissionalizantes. Naturalmente, a vermelhada toda entrou em histeria porque isso “era coisa do Salazar, 25 de Abril sempre, fascismo nunca mais, trabalho sim, desemprego não” e outros argumentos brilhantes. Quando, na verdade, se um aluno não tem vocação, jeito, nem vontade para estar na escola, é um favor que se lhe faz mandando-o aprender uma profissão. Esse aluno retira algo útil para si da escola e não impede os alunos que têm mais capacidade para aprender de o fazer. Eu sei que isto é, para alguns, difícil de compreender, mas nem todos podem ser doutores e engenheiros e ser-se serralheiro é uma profissão tão digna como se ser advogado. Hoje, aliás, é uma profissão com mais garantias de empregabilidade, porque já há milhares de advogados (e quem diz advogados, diz outras profissões) a quem o curso não lhes serve para nada (mas mesmo assim as faculdades continuam a vomitar todos os anos centenas e centenas de novos licenciados), enquanto se uma pessoa precisar de um serralheiro, pagará 50 euros por 15 minutos do seu trabalho.


    • Hugo, obrigado pela sua reflexão. Se me permite, uma pergunta: acha que é o exame do 4º ano que vai ensinar aos putos o que eles não aprenderam durante os 4 anos? Acha que o exame vai resolver alguma coisa? E de que vai servir a sua reprovação? Comparar com o tempo em que só alguns andavam na escola não é sério. Hoje estão e ainda bem, TODOS, dentro da escola e isso é muito positivo. A Escola tem que ser capaz de ensinar a todos e não só a alguns. É neste quadro de inclusão que os exames não fazem sentido.

      • Hugo says:

        Claro que não, mas o inverso – deixar passar todos – também não resolve nada. Além disso, ao os reprovar ensina-se-lhes (e aos paizinhos) a seguinte lição: quem não se aplica, não consegue nada. Eu sei que num país onde a cunha é rainha e o nepotismo rei, esta lição só em teoria fará sentido, mas não deixa de ser uma lição que todos deveriam aprender, quanto mais não seja para ver se conseguimos depor aquele par reinante.

        Bem sei que o problema não é de fácil resolução, mas se bem entendi creio que o João Paulo está a partir de um pressuposto errado, segundo o qual TODOS vão ser alunos bem sucedidos e brilhantes, o que não é verdade. É preciso ter coragem para aceitar isto e agir em conformidade, desenvolvendo as melhores soluções para cada grupo de alunos, como me parece que fazia a tal medida do ministério que indiquei no último comentário. Também não entendo como uma reprovação fomenta a exclusão. Só se nos deixarmos iludir pela falácia do “os pobrezinhos são todos estúpidos”, o que além de não ser verdade, é insultuoso para as classes mais desfavorecidas.

        Creio que você como tantos outros toma o meio como fim, ao entender que o importante é que todos os miúdos estejam numa escola pública igual para todos, independentemente de dela tirarem partido ou não.

        Quanto à seriedade ou falta dela de comparar com o tempo da ditadura, não fui eu quem escreveu um post intitulado “Exames do Salazar”.


        • Hugo, obrigado pelo (re)comentário 🙂 Se calhar a palavra sério é excessiva. O que quis dizer foi que a Escola de hoje é incomparavelmente melhor que a da ditadura! Isto é, nessa altura só estavam alguns e até à 4ª, enquanto agora estão todos! Estar significa sucesso? Não e esse é o problema. Concordo – é a questão chave! Como garantir o sucesso de todos porque – aí não concordo consigo – TODOS podem ter sucesso, mas repito, a questão é garantir que TODOS podem ter sucesso. E, repare, eu não coloco a questão entre ricos e pobres, de todo! Há gente pobre que vai ter sucesso e gente rica que não vai conseguir. Agora, isso deve depender do trabalho e não da Escola. É que quanto mais cedo for feita a barreira (exame!) mais se vai sentir a influência da dimensão familiar, isto é, no 9º ano o efeito família nota-se menos que no 4º ano, logo, ao colocar exames que reprovam no 4º ano o MEC e Nuno Crato estão a levar as famílias a exame, mais do que os alunos.

  8. JIMFernandes says:

    Exames, sim ou não? Passar ou reprovar? Facilitar ou exigir? São perguntas que se põem, que, antes de serem adotados, deviam estar em cima da mesa para se aferir se são boas ou más para a aprendizagem da criança! Podemos, contudo, dar a nossa opinião do que inferimos sobre este assunto, mas não somos donos da verdade. Será que, um aluno deve fazer exames logo no princípio da sua vida escolar e, será que isso trás vantagens para o sistema? Será que trouxe quando esses exames existiam? O ensino naquela altura era melhor? Quando é que tivemos Sucesso no ensino? Naquela altura (e eu sou daquela altura) tudo que aprendíamos era decorado, nada, ou quase nada, era explicado, 2X2=4 porque 2X2=4 e aprende porque tens de saber para o exame, eram estas as palavras que ouvíamos. Eu sei porque estive lá (no 25 de Abril eu tinha 18 anos). Tudo era aprendido em função do exame de quarta classe era assim que se chamava e no mesmo ano tínhamos ainda o exame de admissão ao liceu e exame de admissão às escola técnicas. Na faculdade tive um exame de matemática, para o qual estava preparadíssimo, tinha estudado, sabia a matéria, Destrocava (como agora se diz). Fui para exame, começou a correr mal e foi como se me tivessem apagado a matéria toda da cabeça. no final: nota do trimestre 12 valores, Era uma injustiça porque eu sabia a matéria. No 2 trimestre, fui para exame, com parte da mesma matéria e matéria nova, não estudei mais do que tinha estudado, nota do exame 19,5 valores. Os exames mostram o que os alunos sabem? Eu, na minha modesta opinião de professor, acho que não!

  9. maria celeste ramos says:

    Então porque se revoltam tanto com as “despedidas” de professores e fecho de escolas se afinal não aprendem nada nem exemes não servem para nada – acabem com o ensino que resta – a saúde já foi – fechem mesmo o país – está quase – E como e onde parendem o quê os professoras que não tem frequ^ncia escolar e vão ensinar o quê ?’ BOA – sou burra – não poercebi esta conversa de eruditos

  10. uniaonacional says:

    mas que tenho com isso ? a menina está com azia ? antigamente diziam que iscas fazia bem !

Trackbacks


  1. […] a uma metáfora já gasta: se o Douro chegar poluído à foz do Porto, devemos intervir na foz ou ir lá cima, à fonte da […]