A formidável derrota de Maria de Lurdes Rodrigues: Balanço de um mandato (2.º semestre de 2006)

(continuação daqui)

Em meados de 2006, o Ministério da Educação ainda tentava «atirar areia para os olhos» com a autonomia das escolas. No entanto, como referia Paulo Guinote a 15 de Julho, «praticamente só falta dizer em que cores e tamanhos os horários devem sair das impressoras (e já agora em que modelos)».
Preparava-se então o novo ano lectivo e o Ministério precisava de cativar os órgãos de direcção, aos quais não retirava poderes, para atingir os seus objectivos. Pela primeira vez, Maria de Lurdes Rodrigues desloca-se ao Parlamento e, como diz Paulo Guinote, «parece que o estado de graça da Ministra da Educação está a dar as últimas.» Foi uma barracada. Quem não se lembra da forma como a Oposição a cilindrou! Sem saber como reagir, Maria de Lurdes Rodrigues olhava desesperada para Augusto Santos Silva, a seu lado, em busca de um socorro que não chegava. Foi uma das grandes derrotas políticas da ministra ao longo do seu mandato. Dois dias depois, Marcelo Rebelo de Sousa demolia a sua competência.
Em Setembro de 2006, o Ministério anunciava que existia um computador com ligação à internet por cada 10 alunos. Curioso que ainda hoje não se chegue a esse número, ou uma demagogia sem contraditório.
Estava à porta o início do ano lectivo e ainda não se sabia muito bem, nem os pais, quais as escolas primárias que iam fechar, numa febre imparável que tomara conta do Ministério da Educação. Em vez de criar condições nas escolas de recepção, o Ministério preferia fechar de imediato as escolas de origem, algumas delas com mais de 20 alunos e com obras feitas há pouquíssimo tempo. E foi o que se viu: alunos que tinham de levar facas e talheres para as suas novas escolas, alunos sem transporte para se deslocarem, alunos que recebiam uma sandes como almoço. A falta de coração de uma equipa ministerial que, desde o início, viveu apenas para as estatísticas e para a poupança.
Iam começar a ser renegociadas as alterações ao Estatuto da Carreira Docente – desta vez, os professores estavam em vantagem perante uma Ministra que já não tinha a aura do ano anterior e a protecção da opinião pública. A classe começava a mobilizar-se como nunca e reflexo disso era a blogosfera. A 9 de Setembro, Paulo Guinote congratulava-se por ter atingido as 150 visitas diárias.
Estatuto da Carreira Docente e Avaliação do Desempenho Docente começavam a ser dois problemas com que os professores tinham de se defrontar, sendo que, com o decorrer do tempo, a tendência foi para dar maior destaque ao segundo em detrimento do primeiro – encarregando-se aqueles que dantes eram independentes, como Miguel Sousa Tavares, de fazer passar a ideia de que os professores não queriam ser avaliados. Por esta altura, já os Sindicatos eram apontados como aqueles que estavam na origem do descontentamento docente, numa estratégia que subsiste ainda hoje.
A maior ajuda vinha, no entanto, do «Prós e Contras» de Fátima Campos Ferreira, todo ele um verdadeiro programa de Legislatura. Como se viria a tornar habitual nos anos seguintes, na edição de 18 de Setembro os sindicalistas foram vetados e nem um se pôde sentar no palco. Claro que não, o tema era o ECD e a ADD, nada que interessasse os Sindicatos… Mesmo assim, sentado na plateia, Avelãs ainda conseguiu que Maria de Lurdes Rodrigues perdesse a cabeça e que dissesse que um professor tinha de dar as suas aulas, mesmo que tivesse um acidente ou uma doença súbita – só com 97% das aulas dadas os professores podem progredir, sejam quais forem as causas das faltas. Mesmo assim, só deu Prós, nesse e nos Prós e Prós que se seguiram.
A 27 de Setembro, Paulo Guinote desabafa o tédio em que se transformou a profissão docente. Burocracia e papelada, sempre mais papelada. E tão bom que é ensinar no verdadeiro sentido do termo. Quanto a mim, também não tenho a mínima paciência para papeladas e burocracias…
Estávamos nas vésperas da primeira grande manifestação do consulado rodriguista. Nada que se possa comparar com as manifestações de 2008, mas para a média habitual, 25 mil professores em manifestação, a 5 de Outubro de 2006, um feriado, foi um grande número! Tão grande, para o costume, que as gentes ligadas ao Governo procuraram desvalorizar, dizendo que muitos dos que estavam lá eram primos, cunhados e tias dos manifestantes. O que diriam se soubessem o que se preparava em termos de manifestações?
A 9 de Outubro, Marcelo Rebelo de Sousa refere que o modelo de avaliação de professores é inexequível e que a melhor maneira de o demonstrar é implementá-lo na íntegra e de forma rigorosa. Em algumas escolas, mais papistas do que o Papa, foi precisamente isso que se fez com os resultados que se viram. Na mesma altura em que, curiosamente, nos Açores se admitia a não-existência de quotas.
17 de Outubro, dia de Greve nacional e mais uma demonstração de força dos professores. As habituais guerras de números e o Ministério sem perceber que a luta estava para durar e que, nessa guerra, alguém ia sair derrotado. Hoje sabemos quem foi, por mais que os ataques aos professores, por parte da Ministra, ainda tenham continuado durante um par de anos.
Passando ao lado da falecida TLEBS, da qual nunca mais se ouviu falar, uma palavra para a indisciplina nas escolas, que não parava de aumentar. O Estatuto do Aluno, de David Judtino, tentara remediar o desastroso 270/98, de 1 de Setembro, mas não o resolvera. De resto, durante o mandato de Maria de Lurdes Rodrigues, a indisciplina nas escolas não parou de aumentar. Porque, à medida que a exigência com os professores era cada vez maior, a permissividade e o facilitismo para com os alunos ia também aumentando.
Entretanto, o Ministério quer acabar com o sistema de colocação de professores que David Justino conseguiu implementar e substitui-lo por contratos ad hoc. Ao mesmo tempo que apresenta aos Sindicatos a sétima versão do ECD, sem que se toque no que realmente interessa. Quanto ao abandono escolar, continua a aumentar e já atinge os valores da década de 90. Operações estatísticas de maquilhagwm resolverão o problema.
«Quem se importa com os professores?» – o ano de 2006 dava as últimas com um belo artigo de José Gil, que punha o dedo na ferida relativamente à forma como os professores estavam a ser tratados. Vinha aí 2007, um ano de novas e mais duras lutas.

Comments

  1. Miguel Tavares says:

    Vocês Professores são ridiculos!!Têm 3 meses de ferias, adse, formações, … e ainda se queixam!!Deviam andar como a maior parte dos trabalhadores deste pais a recibos verdes que ja viam o que era bom!!Assim depressa se acabavam as manifestação e o não querer trabalhar.Cumprimentos

  2. maria monteiro says:

    Sr. Miguel Tavares, não percebo essa sua razão dos professores serem ridículos… esse seu “ódio” é ele simplesmente ridículocumprimentosmaria

  3. Belina Moura says:

    Miguel, mas se nós os professores temos assim tantas regalias, porque não tiras um “cursosinho de trazer por casa”, tal como os que nós tiramos, tipo os da “farinha Amparo” e recebemos o diploma pelo correio, e depois de teres o teu diploma que te permita dar aulas, vais lá para uma escola destas onde nós temos leccionado, carago, e vais gramar aquilo que nós gramamos há décadas, que nos últimos 5 ou 6 anos é cada vez melhor, vais lidar com alunos educadinhos, daqueles que te cantam o hino português à entrada da aula, que se levantam sempre que tu assomes à porta da sala, onde te esperam paciente e calmamente. Depois vais gramar os paizinhos deles, que te dizem na cara que não entendem porque é que tu não autorizas que o filhinho deles diga “foda-se” na sala de aula quando “até o Herman o diz na telebisão”!!!E quando chegas a casa, com a cabeça cheia de gente mal formada e malcriada, sentas-te no sofá e encharcas-te com todas as novelas que apareçam, inclusivé aquelas novelas sobre a política deste país, as que te vêm no telejornal. E depois de jantares, sentas-te ao PC e escreves as tuas estratégias de acção para lidares no dia seguinte novamente com as belas escolas que temos hoje em dia, com os belos alunos que não te tiram o sono, porque só te dão alegrias.É tão gratificante, qualquer um pode ir dar aulas, experimenta, e ainda tens N férias, carago!

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