Jerónimo de Sousa no «Gato Fedorento»
Jerónimo de Sousa, dos candidatos às eleições, é o mais genuíno de todos. Aliás, é o único. Um velhinho simpático, o avozinho que eu nunca conheci. Gosto realmente dele.
Depois de uns debates cinzentos, parece querer acordar para a campanha. No Domingo, no Palácio, era vê-lo a dançar a Carvalhesa com toda a alegria, com toda a espontaneidade. Hoje, no «Gato Fedorento», desfiou sem estratégias a história da sua vida e das suas netinhas. Só se engasgou quando Ricardo Araújo Pereira lhe falou em Zita Seabra, mas voltou a sair-se airosamente. Zita Seabra e, já agora, Santana Lopes.
O camarada Jerónimo ainda vai surpreender muito, no próximo Domingo, todos aqueles que auguram um mau resultado ao PCP.
FutAventar: Mais um «penalty» fantasma
São de Olhão…
Banho de bola ao leão sem juba. Demos dois de avanço à nossa quarta filial mais antiga. Tivemos 3 bolas dentro da baliza. Com 5 árbitros, tínhamos ganho a reinar.
Afinal, é essa – reinar – a função do rei da selva…
o senhor que queria pertencer à confraria dos escritores
pois então cá vai. eu até nem queria falar mais nisto mas já agora, se faz favor, vamos adiante. já nem sei quando isto começou. talvez com o sucesso da margarida rebelo pinto? até pode ser que não. não interessa quando começou. eis que, certo dia, em portugal, os jornalistas começaram a escrever livros. uns escreveram romances cor-de-rosa. outros optaram pelas biografias desportivas. uns terceiros optaram pela literatura dita séria, sim, séria, ficcional ou documental pouco importa. qualquer posto servia: pivot de telejornal, jornalista de fundo ou comentador. já cá temos um dan brown português que invadiu o mercado norte-americano e se não vendeu está ou esteve para vender os direitos da sua obra para o cinema. já cá temos um outro que escreveu romances policiais (?) ditos seríssimos e argumentos para o belo mundo do cinema português. já cá temos biógrafos de mourinhos, de camachos e o canastro, bem entendido. já cá temos literatura documental para dar e vender e para juiz de instrução, ou não, ler. temos livros seríssimos sobre a casa pia, os partidos, a maddie e sabe-se lá mais o quê. pois, portanto, vamos lá a ver. és jornalista e queres abrir horizontes. eh, pá, escreve um livro. tudo podes. tu consegues. já escreves todos os dias, não é ? então, será canja. mais a mais existem peças jornalísticas que são verdadeira sobras literárias, não é ? então por que esperas ? e então impulsionado pelo céu ou pela terra, o jornalista começa a escrever romances. novelas. biografias. só não escreve dicionários porque ainda não se lembrou. no molho tipográfico deste mundo o jornalista vende. e vende porque o povo compra. porque o povo, e aqui não há volta a dar-lhe, conhece o jornalista e acha que quem escreve, escreve. pois, bem entendido. a bem dizer, compra ainda mais porque conhece a efígie do jornalista. entra-lhe todos os dias pela casa adentro. e depois é ver finalmente o povo a ler o jornalista no metro, sim, finalmente no metro, como em paris, londres, ou nova iorque. e aqui, neste preciso momento, a modernidade avança. então quando vier o tvg é que se vai ler ! talvez o povo pense que o jornalista não deveria escrever um calhamaço pois é muito incómodo ler um calhamaço no metro em hora de ponta. ou talvez o povo pense que quantas mais páginas e folhas tiver o dito cujo, mais importante, sério, inteligente e adjectivante é o jornalista. e , por extensão, o leitor. o jornalista, em última instância, instruído pelo sucesso da sua obra prima vê-se a si próprio como um escritor. sim, um escritor ! e logo quer entrar nos clubes, nas confrarias, nos círculos dos outros escritores que só são escritores e nunca foram jornalistas. e pensa: vendo, logo imito ! mas não é que depois a figura do crítico lhe urina para cima, a bem dizer, porque os dados históricos que utilizou estão errados e ou o ignora ou diz mal dele num pasquim ou suplemento de pasquim com crítica literária especializada ou dita especializa ? como pode ser? quem são esses malandros? vendo, imito e dizem mal de mim. se não vendesse e não imitasse talvez o caso mudasse de figura. mas não. ai não, não! ser um kafka, um bulgakov, um jorge de sena, um desses desgraçados que nunca teve um banho de multidão na vida ? ai, isso não ! escrevo, logo ganho! esse é que é o lema. qual imitar qual quê ! já sabem de quem é que eu estou a falar, já dizia o outro. tudo isto a propósito de mais uma reportagem que assina e assinala a desgraça e o génio incompreendido do senhor miguel sousa tavares e da sua caminhada pelas hordes literárias portuguesas adversas. haja pudor, meu caro miguel ! haja pudor ! um pintor pinta toda uma vida para ser pintor. um escritor escreve toda a vida para ser escritor. um escultor esculpe toda a vida para ser escultor. mas isso não é nada. o senhor miguel acha que o leitor é que manda, as vendas é que o provam e a partir daí é entrarno túnel da luz (perceberam?) e ser aplaudido em surdina como génio literário. o crítico e o literato que se danem. pois. se um dia um pintor de paredes começar a fazer debuxos antes das demãos e um estucador se lembrar de começar a utilizar mármores temos produção artística para dar e vender. qual miguel ângelo qual quê ! o meu filho desenha e pinta melhor que o miró, pá!
ass: anarquista duval
post scriptum: o referido autor deste texto acrítico até gosta que o miguel sousa tavares e os outros que tais vendam muito. pois deste modo as editoras podem perder dinheiro com os escritores menores que editam a fundo perdido, só para compôr os catálogos das ditas cujas com nomes que vendem muito pouco e que já estão todos mortos ! … e não estámos a falar do sarabago ou do entunes que ainda estão vivos, bem entendido !
Crítica à Crítica
Reparei que ultimamente, muita gente discorda da crítica em tom de sátira. Mas mais importante que isso, reparei que meio mundo critica o facto do outro meio mundo criticar alguma coisa. A própósito disto, queria só dizer uma coisinha rápida…
Uma crítica que faço a mim próprio é a de ser demasiado agressivo verbalmente. Volta e meia, perco as estribeiras e rebento em asneiradas. Está mal. Às vezes, sou até bastante estúpido, precisamente porque fervo em pouca água. Embora, a quente, discorde de mim próprio. É estranho, mas é verdade. Critico tanta coisa, que acabo até por me criticar. Ainda há pouco tempo estive envolvido numa discussão acesa, na qual, depois de longa argumentação, consegui piorar mais ainda a situação, chamando estúpidas às pessoas que vêem telenovelas, porque, para mim, as telenovelas são mesmo uma estupidez pegada e uma anestesia cerebral. Obviamente, a mãe ou a avó de alguém (eu incluído) vê religiosamente “a telenovela” (como se não existissem aí umas quinze) e acho que até acreditam que aquela porcaria é mesmo verdadeira, e que aquelas personagens se chamam mesmo Dulcineide e Wordinaldo. Portanto, devido a esse estranho item denominado de “proximidade”, não se pode dizer estúpido, nem nada. E também por respeito, mas hei!, estamos no século XXI, que respeito é que estamos mesmo a falar?!? A minha liberdade de falar abertamente (e criticar) esbarra na liberdade de outro não me querer ouvir e querer responder na mesma moeda. Ou, levemente inspirado, nas palavras do “nosso” ainda Primeiro Ministro: a minha vontade de te dar um soco nas trombas, termina na falta de vontade do teu nariz. Percebo isso. Mas também aprendi a ser verdadeiro. Sempre me ensinaram a não mentir, e analisando o mundo em meu redor, todas as suas implicações e todas as suas complexas relações, e se acho que algo é estúpido, não sinto nenhum pudor em lhe chamar como acho que deve ser chamado. Tenho é de o fazer “para dentro” ou muito baixinho, precisamente por causa da tal dualidade própria de me exprimir livremente. E também porque entendo o conceito de empatia. É que do outro lado, pode estar um gajo com um maior “arsenal de asneiras” e mais meio metro de altura. É tudo uma questão de força. Eu, por exemplo, reajo muito mal à crítica. Tanto positiva como negativa. Se no caso da crítica positiva, não sei muito bem o que fazer ou dizer e preferia muito sinceramente que ninguém dissesse nada, por outro lado, a reacção às críticas negativas pode ser, digamos, um pouco violenta. Violenta, não. Emotiva, como se diz na política. “Tanta coisa está terrivelmente mal no mundo e eu é que sou o criticado, só por criticar?” Não reajo bem. Não sou político ou figura pública, portanto sou imune à perfeição e posso ser violento/emotivo, como todo o ser humano normal por esse mundo fora. Não podem ser só virtudes. E depois penso novamente na empatia e critico-me a mim próprio por estar sempre a criticar tudo. Portanto, não sei muito bem se a crítica, no sentido geral, é válida. Mas também, se não criticar o que acho que está mal, acabo por entrar na lógica do “quem cala consente”. Dúvidas existenciais profundas só porque um gajo qualquer se lembrou de fazer um provérbio. É claro que se a crítica girar em torno de algo em que toda a gente (ou uma maioria) está de acordo, esse problema de contenção e “proximidade” já não existe. Se num grupo de pessoas apolíticas alguém critica a política e/ou chama a um qualquer político de ladrão ou mentiroso, todos os outros aplaudem e conseguem até arranjar uma forma de criar novos palavrões ainda piores. Mas isto acontece num círculo fechado. Em aberto, publicamente, pura e simplemente não acontece.
E assim, devido a todos estes condicionalismos, a crítica cómica, o sketch e a sátira, tornam-se a arma de eleição para criticar sem criticar e, principalmente, para criticar sem esperar represálias. Tudo com um sorriso nos lábios, que é bem melhor do que levar um soco nos dentes. E também por uma questão de audiência. Ninguém (ou quase) quer estar a ouvir um homenzinho muito sério, com um tom de voz sério, à frente de um cenário muito sério, a falar de coisas sérias. Mesmo o Marcelo R. Sousa tem aqueles tiques todos e uma maneira esquisita de falar, só para não parecer tão sério. Aquelas histórias de ele ler 20 livros enquanto dorme também é com o mesmo propósito. Gajos sérios não têm piada nenhuma. Os portugueses já são um Povo deprimido por natureza, não estão para aturar mais um gajo sério. Por outro lado, a crítica “séria” quase não existe, e não existe porque paira no ar uma consciência de que não é possível criticar os gajos sérios, sem se meter numa carga de trabalhos, arranjar inimizades duradouras, passar um longo tempo em tribunais, atolados em papéis para provar que não disse o que disse. Enfim, a suprema violência burocrática. E a carga de trabalhos é proporcional ao tamanho do criticado. Tenho ideia de que na altura em que a crítica se tornar mais séria, directa e objectiva, as contendas vão-se resolver à porrada, num mano-a-mano de mangas arregaçadas. Alguém tem tomates suficientemente grandes para ir contra e criticar aberta e publicamente o núcleo duro da Política? Da Banca? Das Corporações? Bem, o Francisco Louçã faz isto, mas como tem também aquela maneira esquisita de falar e um programa de governo de extrema-esquerda ninguém o leva a sério. Eu sou sincero e desmarco-me desde já. Ainda é preciso levar muitos “carolos” e umas chapadas “à padrasto” para chegar a esse ponto. Mas para lá caminho. Fico com a dúvida se a crítica “na brincadeira” existe porque afinal as coisas não estão assim tão más, até porque ainda dá para ir “mandando umas piadinhas”… ou se existe porque quem critica está meio acagaçado e é melhor não abrir a boca toda.
Pensando bem, para quê tanto trabalho, para quê as nódoas negras e um corte no sobrolho, para quê o “inferno dos papéis” se se pode criticar exactamente a mesma coisa, ainda por cima, com a possibilidade de o alvo das críticas poder estar ao nosso lado a rir-se, apenas tendo para isso, que fazer um pouco de parvo para ninguém me levar demasiado a sério? É preciso ter noção que, hoje em dia, para criticar alguém ou alguma coisa na praça pública, é necessário fazer um inquérito prévio para determinar todas as opiniões e tomadas de posição envolvidas, de modo a não suscitar acesas discussões que suscitem demasiada argumentação. Até porque toda a gente sabe que, acabando os argumentos, só resta virar costas à discussão ou dizer palavrões e/ou falar mais alto que os outros, e isso é considerado uma extrema falta de educação. Novamente, o exemplo da política: sendo que a argumentação há muito que já não existe, resta apenas o insulto (apesar de muitos virarem as costas à discussão). E um dos poucos insultos permitidos é chamar o outro de demagogo, o que não aflige quase ninguém, porque também quase ninguém sabe o quer quer dizer. Fica apenas o recado para “dentro” e é praticamente uma piada própria da Assembleia da República. É o sinal para acabar com as discussões, antes que alguém chame outro de néscio.
Conclusão: actualmente, quem tem voz pública, tem uma táctica que passa por criticar mas sem criticar ninguém, nem magoar ninguém, nem insultar ninguém. O P.R. deu o mote institucional: falar, falar e não dizer nada. A única crítica verdadeiramente autorizada é a crítica positiva, mas também não seria de esperar outra coisa, já que vivemos no Tempo do Optimismo-Salvador e dos Manuais de Auto-Ajuda. Para criticar alguém convenientemente, de preferência têm de se citar autores mais ou menos desconhecidos que criticaram dissimuladamente situações mais ou menos parecidas com o que se quer criticar ou utilizar linguagem que quase ninguém perceba. E depois discute-se se o autor A tem mais livros editados do qu
e
o autor B e esquece-se a crítica.
A crítica aberta, em praça pública, fica assim restrita a um estilo moderno de “Revista à Portuguesa”, sem os adereços populares, o improviso e uma vareira a cantar um “faduncho”, até porque sendo a Identidade de Portugal, o fado, esse ninguém o critica. Pessoalmente, continuo a ver a crítica, seja ela qual for (positiva, negativa, séria, cómica, colorida), apenas como uma gigantesca sondagem ao País e ao Mundo. Obviamente, menos fiável, mas muito mais abrangente. Mas também, qual é a sondagem que é fiável hoje em dia? Por isso mesmo, acho que todos devem criticar e ser criticados de volta. Todos, menos eu, claro.
Digo tudo isto a brincar, não vá alguém se ofender…
POEMAS ESTORICÔNTICOS
Canção de Natal
Sábado à noite
dia vinte e um
vésperas do Santo Natal.
O frio enrugava os ossos
a rua de Santa Catarina era um rio de gente
um rio de águas desencontradas
sem destino nem rumo
umas correndo para baixo outras para cima
e mesmo para os lados
-se algum dia se viu -!
gente por cima
gente por baixo
gente saindo e entrando
não se sabe bem onde
tanta porta aberta
tanta porta fechada
não se sabe ao certo.
Pessoas em cima de gente
embrulhadas em pessoas e sacos
e mais gente
e mais sacos
pendurados nas mãos
nos ombros
no pescoço
nas orelhas
nos olhos.
Uma velha andrajosa
suja e gorda
– de doença seria a gordura e não de fartura! –
uma provável anasarca cardíaca
que faz do doente
uma espécie de boneco Michelin
rebentando de inchaços
uma velha gorda
excrescente tumoral
– de trapos seria a gordura também! –
(o frio enroscara-lhe o corpo
com todos os farrapos do lixo)
uma velha suja tentava subir a rua
por entre a multidão limpa.
Com grande agonia arrastava pelo chão
puxada por um cordel
uma caixa de papelão
que dentro continha outras caixas
e restos de caixas
e mais papelão
provavelmente
toda a sua mobília de quarto
que haveria de montar
nesse arrastado andar
lá para o meio da noite
no vão de uma porta muito acima do 575
mais fora dos olhos dos enxotadores de pobres.
A velha cuja idade mirraria as carnes
se os inchaços se escoassem
não ia bem disposta
nem dava ideia de estar bem
no meio daquele mar de gente.
Antes de tudo sentia-se afogar.
Não era inveja dos sacos nem dos cheiros
nem dos casacos nem do luxo
– sabia cá ela o que era o luxo! –
importava-se lá ela com todo o papelão dos outros
todo o papelão
que ia dentro daquele mundo de sacos!
Ela só queria o seu papelão
e que não estorvassem
os seus bocados de passos
que juntos
não dariam mais do que dez à hora.
Ela só queria que aquela gente toda
ali parida pelo diabo
a não impedisse de arrastar a sua casa
então praguejava bem alto:
vão todos pró caralho vão-se todos foder.
Ouvia-se como música de fundo
um lindo cântico de Natal…
filhos da puta deixai-me passar
vão-se todos foder.
Dois putos atiçaram a velha:
vai-te foder tu velha ranhosa
ao mesmo tempo que ironizavam à gargalhada:
avariou-se o mercedes à gaja!
A velha não se agastou mais do que já vinha
estava treinada na cena para não perder energias
com a inutilidade de erguer a voz
e ripostou num grunhido cavo:
vai levar no cu paneleiro de merda.
A melodia de Natal
escorria pelos ouvidos cheios de sacos
de paz e harmonia.
Já quase exausta
com voz mais cava a velha dizia:
deixai-me passar bandalhos.
Lá em cima
Deus não deve ter levado a mal.
Como reza o Divino Testamento
dos pobres é o reino do Céu.
Em breve ela estaria com Ele
para usufruir da eterna justiça
e…
na altura devida
Ele lhe daria com ternura
um puxãozito de orelhas.

A formidável derrota de Maria de Lurdes Rodrigues: Balanço de um mandato (2.º semestre de 2006)
(continuação daqui)
Em meados de 2006, o Ministério da Educação ainda tentava «atirar areia para os olhos» com a autonomia das escolas. No entanto, como referia Paulo Guinote a 15 de Julho, «praticamente só falta dizer em que cores e tamanhos os horários devem sair das impressoras (e já agora em que modelos)».
Preparava-se então o novo ano lectivo e o Ministério precisava de cativar os órgãos de direcção, aos quais não retirava poderes, para atingir os seus objectivos. Pela primeira vez, Maria de Lurdes Rodrigues desloca-se ao Parlamento e, como diz Paulo Guinote, «parece que o estado de graça da Ministra da Educação está a dar as últimas.» Foi uma barracada. Quem não se lembra da forma como a Oposição a cilindrou! Sem saber como reagir, Maria de Lurdes Rodrigues olhava desesperada para Augusto Santos Silva, a seu lado, em busca de um socorro que não chegava. Foi uma das grandes derrotas políticas da ministra ao longo do seu mandato. Dois dias depois, Marcelo Rebelo de Sousa demolia a sua competência.
Em Setembro de 2006, o Ministério anunciava que existia um computador com ligação à internet por cada 10 alunos. Curioso que ainda hoje não se chegue a esse número, ou uma demagogia sem contraditório.
Estava à porta o início do ano lectivo e ainda não se sabia muito bem, nem os pais, quais as escolas primárias que iam fechar, numa febre imparável que tomara conta do Ministério da Educação. Em vez de criar condições nas escolas de recepção, o Ministério preferia fechar de imediato as escolas de origem, algumas delas com mais de 20 alunos e com obras feitas há pouquíssimo tempo. E foi o que se viu: alunos que tinham de levar facas e talheres para as suas novas escolas, alunos sem transporte para se deslocarem, alunos que recebiam uma sandes como almoço. A falta de coração de uma equipa ministerial que, desde o início, viveu apenas para as estatísticas e para a poupança.
Iam começar a ser renegociadas as alterações ao Estatuto da Carreira Docente – desta vez, os professores estavam em vantagem perante uma Ministra que já não tinha a aura do ano anterior e a protecção da opinião pública. A classe começava a mobilizar-se como nunca e reflexo disso era a blogosfera. A 9 de Setembro, Paulo Guinote congratulava-se por ter atingido as 150 visitas diárias.
Estatuto da Carreira Docente e Avaliação do Desempenho Docente começavam a ser dois problemas com que os professores tinham de se defrontar, sendo que, com o decorrer do tempo, a tendência foi para dar maior destaque ao segundo em detrimento do primeiro – encarregando-se aqueles que dantes eram independentes, como Miguel Sousa Tavares, de fazer passar a ideia de que os professores não queriam ser avaliados. Por esta altura, já os Sindicatos eram apontados como aqueles que estavam na origem do descontentamento docente, numa estratégia que subsiste ainda hoje.
A maior ajuda vinha, no entanto, do «Prós e Contras» de Fátima Campos Ferreira, todo ele um verdadeiro programa de Legislatura. Como se viria a tornar habitual nos anos seguintes, na edição de 18 de Setembro os sindicalistas foram vetados e nem um se pôde sentar no palco. Claro que não, o tema era o ECD e a ADD, nada que interessasse os Sindicatos… Mesmo assim, sentado na plateia, Avelãs ainda conseguiu que Maria de Lurdes Rodrigues perdesse a cabeça e que dissesse que um professor tinha de dar as suas aulas, mesmo que tivesse um acidente ou uma doença súbita – só com 97% das aulas dadas os professores podem progredir, sejam quais forem as causas das faltas. Mesmo assim, só deu Prós, nesse e nos Prós e Prós que se seguiram.
A 27 de Setembro, Paulo Guinote desabafa o tédio em que se transformou a profissão docente. Burocracia e papelada, sempre mais papelada. E tão bom que é ensinar no verdadeiro sentido do termo. Quanto a mim, também não tenho a mínima paciência para papeladas e burocracias…
Estávamos nas vésperas da primeira grande manifestação do consulado rodriguista. Nada que se possa comparar com as manifestações de 2008, mas para a média habitual, 25 mil professores em manifestação, a 5 de Outubro de 2006, um feriado, foi um grande número! Tão grande, para o costume, que as gentes ligadas ao Governo procuraram desvalorizar, dizendo que muitos dos que estavam lá eram primos, cunhados e tias dos manifestantes. O que diriam se soubessem o que se preparava em termos de manifestações?
A 9 de Outubro, Marcelo Rebelo de Sousa refere que o modelo de avaliação de professores é inexequível e que a melhor maneira de o demonstrar é implementá-lo na íntegra e de forma rigorosa. Em algumas escolas, mais papistas do que o Papa, foi precisamente isso que se fez com os resultados que se viram. Na mesma altura em que, curiosamente, nos Açores se admitia a não-existência de quotas.
17 de Outubro, dia de Greve nacional e mais uma demonstração de força dos professores. As habituais guerras de números e o Ministério sem perceber que a luta estava para durar e que, nessa guerra, alguém ia sair derrotado. Hoje sabemos quem foi, por mais que os ataques aos professores, por parte da Ministra, ainda tenham continuado durante um par de anos.
Passando ao lado da falecida TLEBS, da qual nunca mais se ouviu falar, uma palavra para a indisciplina nas escolas, que não parava de aumentar. O Estatuto do Aluno, de David Judtino, tentara remediar o desastroso 270/98, de 1 de Setembro, mas não o resolvera. De resto, durante o mandato de Maria de Lurdes Rodrigues, a indisciplina nas escolas não parou de aumentar. Porque, à medida que a exigência com os professores era cada vez maior, a permissividade e o facilitismo para com os alunos ia também aumentando.
Entretanto, o Ministério quer acabar com o sistema de colocação de professores que David Justino conseguiu implementar e substitui-lo por contratos ad hoc. Ao mesmo tempo que apresenta aos Sindicatos a sétima versão do ECD, sem que se toque no que realmente interessa. Quanto ao abandono escolar, continua a aumentar e já atinge os valores da década de 90. Operações estatísticas de maquilhagwm resolverão o problema.
«Quem se importa com os professores?» – o ano de 2006 dava as últimas com um belo artigo de José Gil, que punha o dedo na ferida relativamente à forma como os professores estavam a ser tratados. Vinha aí 2007, um ano de novas e mais duras lutas.
Zelaya voltou
O Presidente constitucionalmente eleito das Honduras chegou clandestinamente à capital hondurenha e estará num edifício da ONU segundo o Público, ou na Embaixada do Brasil, informação via Facebook.
A luta dos democratas hondurenhos, dura mas persistente, reprimida mas corajosa, passa agora para uma nova etapa.
Esperemos que vença.
Actualização – Confirma-se: está na embaixada do Brasil, reunido com representantes da resistência, e milhares de hondurenhos estão já nas ruas para receber o seu presidente.
Cavaco Silva renuncia ao cargo depois das eleições
Quem o aventa é Francisco Louçã a propósito do caso das escutas e do mais recente desenvolvimento, o afastamento de Fernando Lima.
Não me parece. Cavaco vai sair mais ou menos limpo desta história. A culpa foi do assessor e pronto, está encontrado o culpado. Os crentes acreditam, os não-crentes não interessam. E se formos a ver, também não é caso para a demissão de um Presidente da República. Se um primeiro-ministro não se demite depois dos projectos da Guarda, da licenciatura manhosa, da Sovenco, da casa comprada a metade do preço, do Freeport, da Cova da Beira, das declarações de rendimentos ao Tribunal Constitucional, dos documentos do Notários desaparecidos ou das casas compradas através de «off-shores», por que raio havia um Presidente da República de se demitir? Por causa de umas escutazitas que nunca existiram?
Fernando Lima afastado
Vejamos. O Presidente da República “afastou” Fernando Lima do cargo de responsável pela assessoria para a Comunicação Social, que passará a ser desempenhado por José Carlos Vieira.
Afastou. Não sabemos se foi demitido, se preferiu demitir-se, se ambas as coisas ou nenhuma. Fernando Lima, a “fonte anónima” do jornal Público no caso das escutas, já não mora no Palácio de Belém. Afinal, Cavaco preferiu não esperar mais tempo e agiu. Ou mandou agir.
Fernando Lima não se deve queixar. Tal como José Sócrates no caso de Manuela Ferreira Leite, o ex-assessor de Cavaco Silva, primeiro no Governo e agora na Presidência, pôs-se a jeito. Orquestrando ou não o caso das escutas, é agora claro que foi a ‘garganta funda’ do jornal.
Cavaco Silva, tenha ou não alguma responsabilidade em todo o caso, resolveu cortar o mal pela raiz e apontar um culpado. Mas também ele sai derrotado nesta história.
FUTAventar – jogo perigoso (sujo como o LIZ )
A maioria dos observadores interessados no futebol são de opinião que o penalti de que o Glorioso beneficiou, não o foi na realidade. A maioria dos benfiquistas, perante a evidência, dizem que o jogador da União de Leiria fez jogo perigoso ao levantar a perna até ao peito do Aimar. Se fez jogo perigoso, o que não é pacífico, então o árbitro deveria ter mandado marcar um livre indirecto dentro da área.
O que se vê na imagem é o jogador da União afastar a bola que estava à altura do peito do jogador do Benfica que, em movimento, chocou contra o defesa do Leiria. O defesa do União não pontapeia o jogador do Benfica, pontapeia a bola e o jogador Aimar é que choca com o defesa.
Aliás, a bola vai para bem longe nem sequer é uma bola dividida, não estava na posse do Aimar, tinha saído do movimento de a parar com o peito era, para todos os efeitos, uma bola jogável.
E não me venham com o argumento que o Porto tambem é beneficiado, porque aqui no Aventar só sou faccioso para chatear os meus amigos da Areosa.
OS PRISIONEIROS
Mais um conto, verdadeiro, da Guiné.
OS PRISIONEIROS
No tempo de sem janelas e sem vistas para o mar, eu dormia a madrugada dessa noite igual a tantas outras. Igual…não seria. Dois gritos lancinantes atravessaram a noite degolando o silêncio. Como ecos do inferno. Os ataques não explodem assim! Nenhum homem grita do fundo do tempo! Nenhum animal selvagem ruge tão perto!
Virei-me para dentro do medo e verguei-o à razão. A razão das sobras do medo.
Passos na picada. Voz de sentinela apunhalando o escuro.
– Sr. doutor, sr. doutor.
Dei um salto da cama levando de rosto a rede mosquiteira. Não dei com a luz, mas o raiar da madrugada permitiu que eu visse a silhueta do soldado.
– Algum problema?
– Um prisioneiro.
– Prisioneiro? Que prisioneiro?
– O sr. doutor não sabe?
Entre a minúscula enfermaria e a pista térrea de aviação havia um bloco de cimento com meia dúzia de metros por outra meia. Uma porta, duas sentinelas, outra porta. Esta última era uma barragem de tábuas pregadas e entrelaçadas, com uma frincha no meio por onde enfiavam restos de comida. Dentro do ventre de cimento, disseram que eu iria encontrar quatro pessoas, três homens e uma mulher. Da garganta de uma delas haviam rebentado os gritos que arrepiaram os soldados. Maior este medo do que o medo das balas. Soava a algo do outro mundo, a almas penadas.
Tínhamos chegado ao mato há poucos dias. Os soldados sabiam de quatro prisioneiros deixados pela companhia anterior. Mas não sabiam o que continha aquela enxovia. Que seres havia para lá daquela porta. Entrei. Ia desmaiando. Devo ter inalado o cheiro mais nauseabundo que algum dia a minha imaginação concebeu. Misto de excrementos putrefactos, de fetidez condensada e de gangrenosas decomposições liquefeitas em suores, lágrimas e merda. Nem um buraco. Nem uma nesga de luz.
Arrastámos para o pequeno átrio o corpo que gritava. Um monte de trampa invadido de convulsões epilépticas. A boca espumava sangue. As carnes eram de pedra.
Já o sol enchia a entrada. Mandei retirar os prisioneiros daquele túmulo de cimento e deitei-os sobre a terra seca. Abri os olhos. Em toda a minha vida nunca vi tal coisa. Na explosão da luz, todos aqueles pares de olhos se injectaram de sangue como se houvessem rebentado. Uma violenta conjuntivite, reacção imediata a uma luz que não viam há muitos meses. Não é fácil descrever este quadro mesmo a anos de distância. Ainda sinto o espírito retorcido como pano de limpar o chão. Perguntava-me eu, ao olhar aqueles corpos dilacerados, o que teria acontecido. Um deles tinha um pedaço de lábio fendido cicatrizado por segunda intenção, a par de inúmeros golpes na face e no pescoço. Outro tinha parte da orelha colada à cara e um sobrolho caído. Outro era apenas um velho. Os cabelos cresceram e formavam uma pasta de alcatrão agarrada à cabeça. Restos de trapos colavam-se aos corpos. Um deles parecia uma mulher. Era uma mulher. A não ser que lhe tivessem cortado o pénis. Pela vagina escorria pus esverdeado e chamava-se Maria. Provavelmente era virgem, apesar de tantos soldados terem violado a sua podridão.
Atravessei num vómito a parada e fui falar ao capitão. Ele não assumia a responsabilidade da libertação. Assumi-a eu como médico.
Foram tratados e alimentados. O epiléptico, que era o mais novo, fugiu. Atravessou a pista galgou o arame farpado, e desapareceu na selva. A sentinela ainda engatilhou uma rajada que não chegou a disparar. Outro foi integrado. Quando vim embora cultivava arroz e algum medo pela minha ausência. O velho, recuperadas as forças, gastou-as a cortar a garganta com os vidros de uma garrafa. Poupados os vasos do pescoço, vi que valia a pena pedir uma evacuação “Y”, ou seja, emergente. Duas semanas depois o helicóptero trouxe-o de regresso, curado. A Maria foi cuidadosamente tratada durante meses, de todas as infecções físicas e psíquicas. Teve um filho nascido do amor de um soldado. Quando a deixei, não consegui ver o que havia por detrás do mar de lágrimas dos seus olhos. Penso que era vida.

(manel cruz)
Alegre e Soares agora são apoiantes do Sócrates?
Andaram quatro anos a dizer que nada tinham a ver com a política seguida por Sócrates, na Educação, na Saúde, na Justiça, mostraram, e bem, a sua incomodidade com as políticas do governo, agoram aparecem aí como virgens ofendidas.
Já ninguem acredita em ninguem, Soares ainda diz alto e bom som que o BE é um bom parceiro, Alegre não diz mas adivinha-se, andam a preparar as hostes para a união de facto? E Louçã, noiva dificil, vai negociar o quê, as privatizações, acelerar a reforma na Justiça, apoiar o SNS e uma escola pública mais autónoma?
Tudo a nível da Assembleia da República, em acordos que deixem margem de manobra ao BE mas que lhe dê influência ao nível da governação. E os megainvestimentos, a divida externa limita o Louçã economista?
Entretanto, Sócrates vai dizendo que as políticas são para continuar o que é um verdadeiro escândalo face à situação a que levou o país. A tenda está montada pelo PS, por um lado namorando o BE e por outro mantendo a propaganda. Quer segurar o PS dos negócios e dos lugares bem pagos e chamar a ala esquerda com o namoro ao BE.
Cá está o PS que bem conhecemos, adúltero e promíscuo!
ESTÁ NA HORA DE VOLTAR A LUTAR
ESCREVI ISTO, ESTÁ A FAZER UM ANO…
QUE MUDOU ENTRETANTO?
Estará na altura de voltar a lutar?
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COMO SE FORA UM CONTO – Au Berto, Duas Letras
AU BERTO, DUAS LETRAS!
Há muitos anos, ainda meu pai era rapazote, havia em casa de meu avô, em Paços de Ferreira, um empregado (chamava-se criado na altura, e isso nada tinha de pejorativo) de seu nome Alberto. Era o homem de confiança de meu avô, e a palavra dele quando consultada, fazia lei lá em casa.
Paços de Ferreira, era na altura, e ainda o foi até à minha juventude, uma aprazível Vila, com Amoreiras espalhadas por várias ruas da terra, cujas amoras brancas eram deliciosamente doces, e as folhas serviam em grande parte para alimentar os bichos-da-seda de uma fábrica de fio de seda, pertença do meu tio Simplício, e existente no centro do Porto, e para criar uma maravilhosa sombra nos dias de canícula. A casa de meu avô ficava mesmo no centro da terra e tinha um terreno de aproximadamente meio hectare, e que nos dias de hoje é um (mais um) Centro Comercial. A vida corria calma e a feira da rotunda, nos dias em que realizava, era um dos locais onde eu mais gostava de ir.
Alberto era extremamente esperto, quiçá mesmo muito inteligente. Era ele que fazia os negócios em nome de meu avô, no que dizia respeito à compra ou venda de vacas, vitelos, ou porcos, à compra ou venda de terrenos para cultivo, ou de pinhais, ou outros quaisquer negócios que fossem necessários ou vantajosos. Bastava-lhe olhar para um pinhal para dizer, sem nunca errar quantos metros cúbicos de madeira ele produziria. Bastava-lhe olhar para uma vaca para dizer se valeria a pena comprá-la e quantos litros de leite poderia dar por dia. Meu avô era Solicitador Encartado com escritórios montados em várias comarcas e o seu tempo para estas lides era limitado, para além de ter uma demasiada brandura nas negociatas, sendo muitas vezes levado à certa.
No entanto, Alberto tinha uma dificuldade que lhe trazia de quando em vez alguns transtornos.
Não sabia ler nem escrever!
Minha avó, e também minhas três tias que estudavam para virem a ser professoras primárias, diziam-lhe que tal era necessário, até mesmo para um dia ele poder arranjar uma noiva e casar. Na sua boçalidade e com uma certa arrogância dizia que tal não era preciso para nada, que lhe bastava a sua sabedoria e esperteza. Em tom de brincadeira, dizia que para casar não precisaria de saber dessas coisas, que as mulheres eram como as vacas leiteiras, desde que tivessem perna fina e pescoço alto, seriam o ideal. Nestas conversas recebia sempre admoestações das senhoras da casa, e incentivos à aprendizagem das coisas das letras.
Minha avó e minhas tias, meteram na cabeça que teriam de conseguir ensinar Alberto a ler e a escrever, e ele acabou por concordar em ser aluno delas. Meu avô, sempre muito céptico quanto às capacidades para as letras do seu homem de confiança, dizia que quando elas conseguissem isso, e se, lhes daria o que elas pretendessem, fosse o que fosse. Tudo dito com a certeza de que nunca teria de concretizar tal obrigação.
Mesmo assim, mesmo sabendo das dificuldades que iriam encontrar, meteram mãos à obra, uma de cada vez, primeiro minha avó que ao fim de algum tempo desistiu, depois meu pai, que também tentou intrometer-se no assunto e que dizia ao fim de três semanas que era uma missão impossível, depois, cada uma das minhas duas tias.
Toda a gente desistiu, e em conjunto foram dizer-lho. Apesar de toda a sua esperteza e inteligência, no que dizia respeito às letras Alberto era verdadeiramente um calhau com dois olhos.
Ao ouvir tal decisão, dita pela minha tia mais velha, ripostou que tal não era possível, que o esforço de todos tinha sido compensado e que ele já sabia as letras todas, pelo que deveriam continuar a ensiná-lo, e quis ir falar com o meu avô.
Já na sua presença, disse:
-Senhor doutor, sinto-me muito triste e ofendido. Algumas meninas, poucas, disseram-me que não me ensinavam mais a ler e a escrever pois que eu nunca o conseguiria. Isso não é verdade e por favor diga-lhes e mande-as continuar a ensinar-me. Eu até já sei muitas letras.
Perante tal, meu avô interpelou-o:
-Se é assim Alberto, diz-me lá, quantas letras tem o teu nome?
-Duas senhor doutor!
-Duas?
-Sim, claro, duas, Au e Berto!
Claro que Alberto, que ainda trabalhou muitos anos em casa do meu avô, ganhou algum bom dinheiro em negócios, acabou por casar com uma mulher pequena, rechonchuda e de perna bem curta e gordinha, teve um rancho de filhos e foi muito feliz até ao fim dos seus dias. Morreu muito velho.
Nunca mais se livrou do seu novo nome, que ostentava com orgulho:
Au Berto Duas Letras.
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POEMAS DO SER E NÃO SER
Delicadamente
ela abriu a blusa e levantou os olhos decidida.
Era uma mulher de guerra combatida
daquelas cuja face conta a história.
Mansamente
baixou a medo as alças do soutien
inclinou a cabeça
e fechou os olhos à espera da minha mão.
Depois comemos pão de centeio molhado num gole de azeite
bebemos um capitoso vinho
e fomos à procura de uma paisagem com cegonhas.

(adão cruz)
A máquina do tempo: a Academia Galega da Língua Portuguesa
Em 6 de Outubro de 2008 foi criada a Academia Galega de Língua Portuguesa, sediada em Santiago de Compostela e presidida pelo Professor José Martinho Montero Santalha. Segundo Montero Santalha, a criação da Academia corresponde a uma ideia do Professor Carvalho Calero que, na década de 80, concebeu o projecto de uma instituição que «mantivesse de modo inequívoco a unidade linguística da Galiza com os outros países de língua portuguesa». A cerimónia de fundação da Academia, de qual pudemos apreciar alguns dos momentos mais importantes no vídeo acima, realizou-se no Centro Galego de Arte Contemporânea, em Santiago de Compostela. Foi apadrinhada pelos Professores Malaca Casteleiro e Artur Anselmo, da Academia das Ciências de Lisboa, pelo escritor moçambicano João Craveirinha (filho de José Craveirinha), pelo Professor Carlos Reis, reitor da Universidade Aberta, pelo Professor Evanildo Bechara, da Academia Brasileira de Letras, pelo Professor Elías Torres Feijó, presidente da Associação Internacional de Lusitanistas e vice-reitor da Universidade de Santiago de Compostela, entre outros.
Como se vê, padrinhos não faltaram à jovem Academia. Ângelo Cristóvão, presidente da Associação promotora da AGLP comentou: «Não podemos dizer que viemos ao mundo sem padrinhos!» E acrescentou: «queremos devolver ao galego o lugar que lhe corresponde, que é o de uma forma do português e não o de um dialecto do castelhano».
Em 23 de Maio deste ano de 2009 realizou-se em Lisboa, na Academia das Ciências, uma sessão inter-académica entre as duas entidades. Agora, quando falarmos em países de língua portuguesa, nunca devemos esquecer a Galiza. Somos nove e não oito, como se costuma dizer. Tanto mais que foi ali, na Galiza, que o nosso idioma comum, o galego-português, nasceu. Foi ali que pela primeira vez se falou a nossa língua, a língua de Camões, de Rosalía de Castro e de Fernando Pessoa e de Eduardo Pondal.
No entanto, na Galiza, além dos que defendem a reintegração no português, dos que são pelo acentuar da castelhanização do galego e dos que pugnam por uma via autónoma, ligada à fala popular distanciada do português por oito séculos de deriva, há também quem defenda uma mais versão radical, ainda que, em parte, apoiada na palavra do Professor Carvalho Calero e cientificamente verdadeira. Digo em parte, porque o Professor sempre defendeu a integração do galego no universo da lusofonia – a tal tese radical é a de que o nosso idioma se devia chamar galego e não português. Vamos tentar saber se esta corrente de opinião é válida. Numa outra crónica, falei aqui um pouco da história da Galiza, um tema que me apaixona. Hoje pedi reforços ao professor Ramon Villares e à sua «Historia de Galicia», um livrinho de bolso editado em castelhano, que, há mais de 20 anos (em Agosto de 1988) me foi oferecido por um professor da Universidade de Santiago de Compostela. Ponhamos então a nossa máquina a funcionar.
Não vou recuar tanto no tempo como seria desejável. Jorge Castro (OrCa), num amável comentário ao meu texto anterior sobre este tema, sugere que a irmandade galego-portuguesa poderá ter raízes ancestrais, localizadas para lá da última grande glaciação (Teoria da Continuidade Paleolítica). É uma possibilidade cuja exploração deixo para quem saiba, mas que, a ser provada, nos daria conta de uma afinidade que não deve e não pode ser destruída; muito menos pela gula hegemónica de um estado artificial como o estado espanhol. Por hoje, não recuando tanto, limitar-me-ei a visitar a época em que o condado de Portucale e o da Gallaeciae seguiram caminhos diferentes.
Quando, em 1065, morreu Fernando I de Leão e Castela, reino de que os dois condados eram vassalos, o seu reino foi dividido entre os filhos, ficando D. García com a Galiza, um território que se estendia até ao Mondego, pois Fernando I, o Magno, conquistara aos Mouros Lamego (1057), Viseu (1058) e Coimbra (1064) território que o conde governou entre 1065 e 1070. Deposto D. García e levado preso a Leão, a Galiza ficou transformada numa província de Leão, dirigida por sucessivos condes. Assim, em 1090 foi enviado para a Galiza como conde Raimundo de Borgonha, casado com D. Urraca, uma das filhas de Afonso VI. No ano seguinte, o condado portucalense foi entregue a Henrique de Borgonha, casado com a irmã de Urraca, D. Teresa. Quando Raimundo morreu, em 1107, verificou-se uma profunda crise política em que a nobreza galega participou activamente, tanto a laica ( Pedro Froilaz, conde de Traba), como a eclesiástica (D. Gelmírez. Uma parte desta nobreza aliou-se a D. Urraca, ligando-se à ideia imperial leonesa, enquanto outro grupo defendeu os direitos de Alfonso Raimúndez, filho de Urraca, que em 1109 foi proclamado rei da Galiza. Porém Alfonso Raimúndez, transformou-se, mercê da sua posição na linha dinástica, em Afonso VII de Castela e Leão, proclamando-se «Imperator totius Hispaniae». De certo modo, foi o último rei da Galiza, pois com ele integrou-se na monarquia leonesa a nobreza galega mais rebelde, representada pela estirpe dos Traba.
O que nos diz respeito sabemos nós bem – Afonso Henriques, primo direito do autoproclamado imperador, queria um reino só para ele, venceu sua mãe, D. Teresa que alinhara com a nobreza galega, prestando vassalagem ao sobrinho, na batalha (ou escaramuça; ou torneio) de São Mamede, em 1128, e proclamou unilateralmente uma independência que só em 1143, pelo Tratado de Zamora, seria reconhecida pelo rei de Leão. Como José Mattoso salienta e Ramón Villares cita, a independência de Portugal não pressupõe qualquer reacção anti-galega, pois entre os que apoiaram o nosso Afonso I estavam famílias galegas, entre as quais a dos Traba, que procurava em Portugal o êxito que na Galiza lhes era negado.
Resumindo – a formação de Portugal obedeceu a causas complexas que remetem para diferenças existentes desde a época romana entre as regiões bracarense e lucense, que constituíam a Galécia. E como Villares sublinha, correspondeu também à «incapacidade da nobreza galega para se constituir em reino próprio desde os primeiros momentos da reconquista»; a expansão territorial portuguesa, seria feita a partir da parte meridional da Gallaecia, enquanto que a região lucense, mais recolhida sobre si mesma, inserida perifericamente na monarquia castelhana, mas ligada à Europa pelo cordão umbilical do Caminho de Santiago, iria desenvolver um conjunto de traços específicos que lhe permitiriam conservar a sua identidade ao longo da história até aos nossos dias.
Nestes séculos de domínio estrangeiro, o galego foi muito invadido por castelhanismos, inquinado foneticamente e não só. Apenas no século XIX, com o Rexurdimento de Rosalía, Murguia, Pondal e tantos outros, a língua e a cultura galegas começaram a recuperar a sua identidade usurpada. Do ponto de vista da ciência linguística não parece existir dúvida de que português e galego nasceram de uma mesma matriz. Podemos chamar por isso galego-português ao idioma que, sob duas formas dialectais, falamos lá e aqui. Que fique muito claro que quando se fala de reintegrar, não estamos a falar de Portugal anexar politicamente a Galiza, estamos só a falar de uma reintegração na tal matriz comum que quase nove séculos de domínio castelhano na Galiza quiseram apagar. Gostaria muito que a Galiza fosse independente (adoptando o galego, o português ou o galego-português como língua oficial – é um problema dos galegos). Com a certeza, porém, de que chamem o que lhe chamar, as palavr
as
que os galegos pronunciarem serão as mesmas, tenha o idioma que falam o nome que tiver. Serão as mesmas e soarão aos nossos ouvidos como uma língua semelhante à nossa. Mas voltemos ao percurso histórico e ao paralelo fluir do idioma.
Referi-me à língua falada desde a Alta Idade Média nos territórios da antiga província romana da Galécia, uma variante neolatina ou, como diz com maior rigor científico Carvalho Calero, uma forma primitiva do romance hispânico ocidental. Forma que veio a resultar no galego-português (ou galaico-português). Um momento alto da evolução deste idioma é quando, no século XII, a poesia lírica produzida nesta região era escrita na língua que, além de utilizada pelos naturais, ultrapassando as suas fronteiras, chegava a Leão e Castela – as «Cantigas de Santa Maria», do rei castelhano Afonso X, o Sábio, foram escritas em galego-português. Era, pois, uma língua de cultura. No século XII ocorreu a separação de Portugal da coroa leonesa. À época a Galiza gozava de alguma independência relativamente à coroa castelhano-leonesa. Contudo, no século XIV, a intervenção galega a favor de Pedro I de Castela contra Henrique Trastâmara, motivou com a vitória deste, o exílio de muitos galegos em Portugal. Quando a sua nobreza tomou o partido de Joana, «a Beltraneja» ou, como se dizia em Portugal, da «Excelente Senhora» contra Isabel de Castela, a Galiza viu as suas instituições destruídas e a sua aristocracia perseguida, deixando de existir como nação independente.
Muito basicamente, descrevi, com a ajuda do Professor Villares, o momento da separação das duas partes irmãs, em que começou a deriva histórica e consequentemente a linguística. Dizer-se que em Portugal se fala galego é, pois um exagero radical (embora compreensível), é desconhecer o papel que Fernão Lopes, Gil Vicente, Sá de Miranda, Camões, para referir só alguns nomes, tiveram na criação da língua e na sua fixação em monumentos literários. É esquecer que os portugueses, trezentos anos decorridos sobre a independência, sulcavam os oceanos, descobriam novas terras, criavam uma maneira própria de estar no mundo. Talvez não a melhor, mas própria, em todo o caso.
Por tudo isto e não porque de algum modo a ideia nos ofenda, parece-me um exagero querer que o português se passe a designar por galego, como o pretendem os tais galeguistas radicais. Eles afirmam, em consequência, que em Portugal, no Brasil, em Moçambique se fala galego e que o galego tem, portanto, 200 milhões de falantes. Digo que são radicais porque radicam a sua tese nas raízes profundas e comuns do galego e do português. Porém, penso que o cerne do problema não se situa aí, no nome do idioma – o importante é que a língua da Galiza seja aquela que os galegos queiram como sua. Um dialecto do castelhano todos estamos de acordo que não é. É uma forma diferente de falar português (ou o português uma forma diferente de falar galego)? Penso que tudo aponta para esta hipótese. A decisão só pode ser dos irmãos galegos. Todavia, a viagem já vai longa e por hoje apenas acrescento:
– Bem-vinda ao universo da lusofonia, jovem Academia Galega da Língua Portuguesa!
IRC na Banca em 2008 – Taxa efectiva 9,6%
Justiça Fiscal, é o que podemos chamar a esta taxa em confronto com a mesma taxa aplicada aquelas empresas cheias de lucros e de trabalhadores bem pagos .
Se entrarmos com os lucros arrecadados em off shores e não contabilizados, a taxa efectiva de IRC da banca deve andar pelos 5%.
Mas quando se propõe uma taxa reduzida ,apenas sobre os lucros da actividade exportadora das empresas, não é possível, o orçamento não aguenta. Não aguentará, pois a banca leva a margem toda, assim realmente não deve aguentar.
E cá andamos neste paraíso socialista a favor dos pobres, dos reformados e da justiça social!
ETICA E EDUCAÇÃO (12)
ETICA E EDUCAÇÃO (12)
Considerações sobre Ética e Educação para além da Escola
A democracia é o regime político fundado na soberania popular e no respeito integral dos direitos humanos e abrange, como toda a gente sabe, quer a democracia política quer a democracia social. A educação, dentro da democracia, é entendida, basicamente, como a formação do ser humano no sentido de desenvolver, conscientemente, conhecimentos, juízos e opções de vida numa sociedade de seres iguais perante a lei. A democracia autêntica, baseada no respeito pela dignidade e pelos direitos humanos procura encontrar um modelo político e uma prática política que possibilitem a combinação da ética, dos ideais e valores democráticos, na procura de uma governação realista e honesta. Por vezes só é possível realizar uma parte desses ideais e desses valores, outras vezes nem isso é possível, dada a realidade dura e desumana das poderosas forças antagónicas e destruidoras.
A escola é um lugar de construção da cidadania. Formar para a cidadania implica formar para a responsabilidade e para a participação na vida activa da comunidade. Uma formação para a cidadania, num regime democrático autêntico, tem de incutir o sentimento de que os regimes de liberdade são incomparavelmente superiores aos regimes despóticos, exigindo, contudo, grandes doses de dever cívico para combater os riscos de abuso. Os valores e as atitudes, em democracia, requerem profunda divulgação e ampla aceitação, e não podem ser impostos autoritariamente ou de forma dogmática. Por isso a escola não pode ter uma acção neutra. O acto educativo transmite sempre, de forma explícita ou implícita, uma opção, induzindo valores em cada momento de comunicação, em cada acto de transmissão de conhecimentos, valores orientados por princípios que conduzem à aprendizagem de um mundo de pessoas e não de autómatos. Em resumo, o acto educativo propõe-se a conquista dos corações e das mentes, abrindo o caminho da consciência, formada de sentimentos e de razão, tornando a educação para a cidadania uma questão interdisciplinar por excelência.

(manel cruz)
Juiz Rui Teixeira: Quem se mete com o PS leva!
Como era de esperar desde que decidiu prender Paulo Pedroso por ser suspeito de pedofilia, o juiz Rui Teixeira está a braços com o Conselho Superior de Magistratura. Ao contrário dos seus colegas, nunca mais foi promovido e parece que poderá nunca vir a sê-lo. «Em 25 anos não me recordo de nada semelhante. A avaliação de um juiz ficar dependente de um processo civil em que o juiz não é tido nem achado», refere o Presidente da Associação Sindical de Juizes. «Curiosamente», foram os três magistrados indicados pelo Partido Socialista que propuseram que se aguardasse pelo fim do processo que o em tempos alegado pedófilo moveu ao Estado.
Como seria de esperar, começo por dizer. Uma Justiça subserviente para com o poder é o que temos hoje. Uma Justiça que se vinga em quem teve o desplante de se meter com o PS. A mesma Justiça que nomeia para investigar o caso Freeport a grande amiga de Almeida Santos e mandatária da candidatura de Mário Soares à Presidência da República. A mesma Justiça que só vai atrás de Vale e Azevedo depois de ele deixar de ser Presidente do Benfica. A mesma Justiça que condena Isaltino Morais porque está sem Partido e iliba Fátima Felgueiras por ela ter o «rabo» do PS bem preso.
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