A prosa de Paulo Portas embotada pelo Expresso

Estava o meu fim-de-semana (com hífenes, claro) a decorrer tranquilamente, quando alguém teve a excepcional ideia de me dar a ler um texto publicado hoje, na Revista do Expresso, em que Filipe Santos Costa nos indica que Paulo Portas terá escrito,

em Agosto de 1988, sobre Miguel Cadilhe,

Quem promete números tem de os cumprir. Quem fala algarismos tem de ser exato. Quem faz a política do rigor não pode desconversar.

em 1992, sobre o Tratado de Maastricht,

(…) é a própria conceção de uma Europa de negociação e respeito que está em causa dando lugar à chantagem dos mais fortes sobre os mais fracos (…)

em 1993, sobre Braga de Macedo,

Não há um número certo não há uma conta exata não há uma previsão verificada.

e, no último texto como director d’O Independente, em 1995,

O objetivo do défice obriga a renúncias sociais que o eleitor nem sonha ou então a uma vaga de despedimentos na administração pública.

Terei começado a ler episodicamente O Independente poucos meses depois das linhas sobre Cadilhe e terei certamente lido as passagens sobre Maastricht e Braga de Macedo e, provavelmente, ter-me-á passado despercebida a reflexão sobre o deficit e a vaga. Contudo, parece-me muito pouco credível imaginar-se um autor português “completamente contra o Acordo Ortográfico” (como revelou Miguel Esteves Cardoso exactamente ao Expresso, em 24 de Março de 2012) e com “prosa afiada como um bisturi” (como descreve hoje o próprio Filipe Santos Costa, acrescentando “e demolidora como um caterpillar”) a escrever ‘conceção’, ‘exata’, ‘exato’ ou ‘objetivo’, ainda por cima, imagine-se, entre 1988 e 1995. Parece-me evidente que Paulo Portas terá escrito ‘concepção’, ‘exacta’, ‘exacto’ e ‘objectivo’ e que, agora, alguém no Expresso levou os textos à máquina, embotando a prosa. Uma hipótese remota – mas possível – é a ocorrência de gralhas nos textos originais d’O Independente: mas a ausência do expediente sic nas transcrições do Expresso, das duas, uma: ou infirmará tal conjectura, ou será falha de quem transcreveu e de quem reviu.

Nem o Expresso é o Conselho de Ministros, nem os textos que Paulo Portas escreveu n’O Independente são vistos e aprovados por Paulo Sacadura Cabral Portas, MNE. É bom lembrarmo-nos de que no Expresso até há colunistas a quem é atribuída a (inexactíssima, mas essa é outra conversa) advertência “escreve de acordo com a antiga ortografia”. Assim sendo, não se percebe qual o direito que assiste ao Expresso de embotar artigos em ortografia portuguesa europeia escritos por alguém que não pertence aos seus quadros e, ainda por cima, publicados noutro jornal. E não me venham dizer que no Expresso se aplica o Acordo Ortográfico de 1990: leia-se a forma como é anunciado o texto sobre Paulo Portas.

Comments

  1. Nem mais.
    A seguir quero o Auto da Barca do Inferno em português moderno…

  2. edgar says:

    Marques Mendes confirmou que o PSD quis humilhar Paulo Portas mas, a ser verdade o que relatou sobre o funcionamento do CM e a forma como são apresentadas e aprovadas as propostas do Ministro da Finanças, todos os ministro são humilhados ao saberem pelo Expresso do corte de 4% à função pública.

  3. Vera Carvalho says:

    um texto sobre um não assunto

  4. vitor cambra says:

    grande farsola !

  5. vitor cambra says:

    Ele sabe da phoda….

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