A gripe maricas…

Poema aos homens constipados – Lobo Antunes!

Pachos na testa, terço na mão,

Uma botija, chá de limão,

Zaragatoas, vinho com mel,

Três aspirinas, creme na pele

Grito de medo, chamo a mulher.

Ai Lurdes que vou morrer.

Mede-me a febre, olha-me a goela,

Cala os miúdos, fecha a janela,

Não quero canja, nem a salada,

Ai Lurdes, Lurdes, não vales nada.

Se tu sonhasses como me sinto,

Já vejo a morte nunca te minto,

Já vejo o inferno, chamas, diabos,

Anjos estranhos, cornos e rabos,

Vejo demónios nas suas danças

Tigres sem listras, bodes sem tranças

Choros de coruja, risos de grilo

Ai Lurdes, Lurdes fica comigo

Não é o pingo de uma torneira,

Põe-me a Santinha à cabeceira,

Compõe-me a colcha,

Fala ao prior,

Pousa o Jesus no cobertor.

Chama o Doutor, passa a chamada,

Ai Lurdes, Lurdes nem dás por nada.

Faz-me tisana e pão de ló,

Não te levantes que fico só,

Aqui sozinho a apodrecer,

Ai Lurdes, Lurdes que vou morrer.

António Lobo Antunes – (Sátira aos HOMENS quando estão com gripe)

 

 

 

 

Comments

  1. O poema é muito giro. No entanto, começa com uma daquelas calinadas que o Adão e eu, às vezes, andamos a caçar: «Pacho» não é nada; ele queria dizer parche. Sendo escritor e médico (embora os «parches» pertençam mais à medicina do século XIX), o Lobo Antunes não devia escrever coisas assim. «Pacho»! É boa!  

  2. Desculpa, António! Pacho existe! É a forma popular de parche – tanto o Machado como o Houaiss registam. Meti água.

  3. maria monteiro says:

    Coitados deles… estão sempre a morrer  :- )

  4. Maria, mas estar na caminha e ter uma mulher preocupada à nossa volta, com chás e tisanas e pachos quentes no peito…Jamais me vacinarei para não ter gripe!

  5. maria monteiro says:

    pois, pois… piores que as crianças

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