O problema deve ser meu, pensei. Meu e dos três colegas que concordavam comigo. A coisa passou-se mais ou menos desta maneira: a minha professora de Sociologia resolveu dizer que os portugueses tinham uma tendência para a corrupção e para a desonestidade, dando o clássico exemplo do tipo que tira tudo o que seja canetas, marcadores, papel e restante material do trabalho para levar para casa para os putos. Logo uma horda de colegas disseram que não fazia mal nenhum, porque não prejudicava ninguém. Devem pensar os marcadores crescem nas árvores, pensei eu. A seguir deu-se o exemplo dos jornais. A minha professora mencionou que em alguns países, os jornais estão colocados na rua e as pessoas colocam a moeda e retiram o jornal. Lembro-me de ter visto esta situação em Londres várias vezes, e várias vezes me interroguei porque razão não havia ninguém que tirava o jornal e ia-se embora, sem pagar. Logo uma colega minha disse que também não percebia o que é que prejudicava tirar um jornal sem pagar. Penso, mas não tenho a certeza, que foi por essa altura que levei as mãos à cara e gemi. Depois deu-se o exemplo dos bilhetes de comboio. São poucos os que pagam porque “acham que é muito caro”, e eu respondi que depois se fossem apanhados pagavam os 70 euros de multa que era uma maravilha. Percebi então que a maior parte só não anda de comboio sem pagar por medo da multa. Ai, digo qualquer coisa como: “então é assim, fazemos as coisas bem feitas, não porque é o que deve ser feito, mas por medo da punição?”. Ninguém disse nada excepto a professora que deve ter dito qualquer coisa como “mas é evidente”.
Naquela aula percebi várias coisas, infelizmente, mas percebi uma acima de tudo: isto não está a melhorar. Dos que concordavam comigo, não chegavam a 6 e bolas, somos 25 embora alguns não tivessem ido. Eu, já exasperada, (e a professora que não estava tão chocada como eu porque, suspeito, deve estar habituada a estas tiradas) tentei explicar que se toda a gente pensasse como eles e não pagassem o bilhete de comboio, deixava de haver comboio, que se não pagassem os jornais e, basicamente, os roubassem, deixava de haver jornais, e em última análise, porque era para ai que a conversa estava a ir, se não pagassem impostos não havia Estado. Mas não. Poucos foram os que perceberam e saíram dali a continuar a achar bem que não se pague o bilhete de comboio, que a “pessoa deve ser honesta mas não pode ser parva” (juro que houve uma colega que disse isto), e que o que interessa é que cada um se vá safando à sua maneira.
Da aula saí, triste e incrédula, pronta para ir para o Cambridge, a pensar que se isto continuar assim que não fica cá de certeza, sou eu.
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