Estranhas aventuras… na praia de Inverno

Normalmente sou “obrigado” a ir à praia durante as férias de Verão, por causa do meu miúdo, por isso uma ida à praia de livre e espontânea vontade é um acontecimento raro. Não é que não goste de praia, mas sinceramente prefiro o campo e a montanha. Por isso mesmo, prefiro ir à praia no Inverno; o clima é mais agreste como o da montanha e como bónus, fica-se muito mais à vontade porque não há “montes” de pessoal a acotovelarem-se por um sítio livre onde possam ver e ser vistos por toda a gente. Isto faz-me pensar que na realidade as pessoas gostam do calor do sol e não da praia propriamente dita. A prova disso é que no Inverno a praia está sempre vazia.

Tenho de reconhecer que não entendo o fenómeno da praia-praia. Aquela normal praia de Verão. Não percebo como se consegue estar para ali espraiado a esturricar ao sol, tentando avidamente obter o bronzeado mais homogéneo e escuro possível. Nem sequer entendo o próprio fenómeno do querer ficar bronzeado.

Não tenho paciência nenhuma para estar sentado/deitado na areia a queimar a pele ao sol, cronometrando precisamente o número de vezes em que preciso de me virar para obter “aquele” bronzeado uniforme e espectacular. Até o conseguiria suportar se volta e meia conseguisse mergulhar na água. O problema é que as águas do Norte têm essa característica peculiar de serem absolutamente gélidas. É como acabar de tomar um banho quente e depois ir meter os pés num bidé cheio de pedras de gelo. Depois é a própria lógica da coisa que não faz sentido: aquecer o máximo possível ao sol, até a um nível insuportável que depois torne suportável entrar em águas geladas, que por sua vez tornam novamente suportável o facto de se estar tecnicamente a esturricar aos poucos… não entendo.

Mas também não vejo mal nenhum nisso. Pelo menos, existe um contacto directo com a natureza, coisa rara nos dias de hoje, repletos de betão e centros comerciais. É apenas a lógica da coisa que eu não entendo.

As raras vezes que vou à praia de livre vontade é porque me apetece apenas olhar o mar. Sentir a sua imensa força e poder, o seu cheiro e o medo que me inspira. Adoro o som forte e seco das ondas a rebentar nos rochedos. Convida à reflexão. E estando aqui a olhar para o mar não consigo deixar de me perguntar: donde veio toda esta água? Sendo que o ciclo da água é um ciclo fechado, e que eu saiba, não é possível “criar” água, portanto, donde terá vindo esta água toda? E porque é que este planeta coberto em dois terços da sua área por água se chama Terra?

Muitas mais questões me surgem enquanto olho o mar, mas sinceramente, não consigo responder. Sentado sozinho na areia, gelado pelo vento, a escrever num velho caderno preto, sem acesso ao grande cérebro digital que é a internet, sem “googlar” e “wikipediar”, chego à conclusão que não sei muita coisa básica porque tomo estes e outros "factos" como garantidos. Sentir o mar “põe-me no meu lugar” perante a complexidade e força da natureza. Põe-me no meu minúsculo lugarzinho no Mundo, mostrando-me, verdadeira e friamente, o que é a pequenez e a insignificância. Mas mostra-me acima de tudo que não é nada boa ideia ir contra a natureza e continuar na senda de destruição deste belo planeta azul. Por um lado, porque o empenho humano não tem limites (assim como a sua estupidez) e portanto, é bem capaz de o conseguir, mas por outro lado, o mais importante, é porque o planeta é capaz de “ripostar”, e já é mais ou menos evidente que  vai mesmo fazê-lo. É nitidamente uma má ideia, porque este planeta além de ser bipolar (muito inspirador belo numas alturas e muito agressivo e brutal noutras) não me parece que vá alinhar em grandes conversações, discussões ou políticas diplomáticas… Veremos se as nossas grandes acções têm ou não, grandes repercussões.

A praia de Inverno e especialmente o mar revoltoso fazem-me reflectir.

Fazem-me pensar em coisas que eu não entendo. Questões complexas e coisas simples, lá está, como ir à praia de Verão. Estender um pano no chão e bronzear ao sol. A minha visão dessa “praia de Verão” é esta: um lugar onde as pessoas se deitam em cima de um material de construção civil, a esturricar com o efeito da combustão de hidrogénio e hélio a milhões de quilómetros de distância, para depois irem mergulhar numa quantidade enorme e gélida de água que ninguém sabe donde veio.

A praia de Verão, esse sítio estranho onde, em público, se pode passear de roupa interior.

O Sôr Assis

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O REGRESSO ÀS CAMPANHAS NEGRAS CONTRA SÓCRATES II

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O sôr Assis, a quem já partiram os óculos, tendo sido um dos dois dirigentes do partido do governo a quem isso aconteceu (embora este nada tenha que o compare ao outro a não ser nessas circunstâncias, a de ter os óculos partidos e pertencerem ao mesmo partido), veio botar faladura. Mais uma vez sobre a campanha ignóbil que uns quantos fazem contra o nosso Dialogador. A exemplo das campanhas negras e pessoais de que Sócrates I se queixava, agora a campanha visa decapitar o governo de Sócrates II.

Ora o sôr Assis, entende que o facto de mandarem arquivar ou destruir ou seja lá o que for que vão fazer ou fizeram aos documentos que traduziam as escutas efectuadas ao telemóvel do sr Vara, e onde por mero acaso aparecia a voz do sr José Sócrates, na altura nosso Primeiro, com o cognome de O Arrogante, é a prova cabal de que nada se pode apontar de menos correcto ao comportamento do Primeiro Ministro. E adianta que quem quer saber o que os dois amigos disseram, é um bilhardeiro e quer cortar a cabeça ao governo.

Digo eu que, o facto de esconderem da opinião pública tais conversas pressupõe, isso sim, menos correcção ou até mesmo coisas más, ditas ou feitas pelos senhores envolvidos.

Se houvesse realmente liberdade, se o envolvido neste caso fosse outro que não o nosso Primeiro, Sócrates II, O Dialogador, será que as escutas teriam sido mandadas destruir?

A dúvida permanecerá para sempre, e mais uma vez, o sr Pinto de Sousa se vê envolvido em coisas pouco bonitas.

Onde há fumo, costuma haver fogo, e o cântaro, tantas vezes vai à fonte que, mais dia menos dia, acabará por partir.

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Governador de quê?

Ao ouvir hoje o Governador do Banco de Portugal, tive a sensação de que o Sr. Vítor Constâncio é de uma inutilidade invulgarmente transparente, pelo menos para uma pessoa como eu, que não percebe a ponta de um corno de economia. Mesmo inútil, inoperante, dispensável excrescência do sistema, conseguiu pôr-me o sangue a ferver, ao anunciar o inevitável aumento de impostos.

 

A corrupção é, indiscutivelmente, um cancro global. E as metástases já invadiram todos os órgãos do nosso corpo social. Desde os órgãos privados aos órgãos públicos, governos, autarquias, instituições, justiça, saúde, ensino, banca, desporto, empresas, finanças, tudo! Tudo está inexoravelmente invadido e corroído pela tentacular, maligna e cancerígena corrupção. Podemos dizer que o tratamento se nos afigura meramente paliativo, em fase terminal, ainda por cima supervisionado pela suprema incompetência que transparece da cara de menino de coro com que este senhor se apresenta aos nossos olhos.

 

Dizia-me um amigo, ao qual dou inteira razão, que não tinha medo dos ladrões de rua, que o assaltaram uma ou duas vezes na vida. Tem medo e vive aterrorizado, isso sim, com os que o "assaltam" legalmente todos os dias, governo, instituições, polícia etc., sem que se vislumbre uma centelha de esperança na contenção deste desenfreado meter de mão nos seus bolsos. E tal como eu, sente o sangue a ferver, e o ódio a crescer, quando percebe que o produto dos impostos que o Sr Governador quer aumentar, e de tantos outros "assaltos" legais, nada mais visa do que engrossar a torrente de massa que vai direita aos bolsos dos milhares de corruptos que auferem milhões de euros a coçar os tomates.

 

Aumento de Impostos – está no programa?

Se me tenho lembrado mais cedo, mais cedo o nosso governador do BdP teria encetado a "campanha de consciêncialização" do povo para a necessidade de aumentar impostos.

 

Nenhum partido falou nesta possibilidade, bem pelo contrário, uns mais outros menos, do que se falou foi da hipótese contrária. Baixar os impostos!

 

 

A senhora Merkel, para conseguir uma coligação com a direita, teve que ceder nesse particular, baixar impostos. Essa é, de facto, uma grande ajuda para as empresas e para o relançamento da economia. 

 

Em contraciclo, aí vamos nós para o aumento de impostos, não que isso seja bom para a economia e para o país, mas porque a despesa pública galopa, é cada vez maior, e o Estado precisa de mais dinheiro. E arranja-o da única forma que conhece, tirando-o ao cidadão e às empresas.

 

Para os que viam intenções malignas nos que bradavam que o dinheiro metido na Banca servia para salvar ricos, pagos com dinheiro dos contribuintes, têm aí a resposta. Quanto custou ao PS controlar o BCP com o dinheiro da CGD? E no BPN? E no BPP? A ressaca vem a caminho, nacionalizaram-se os prejuízos e o contribuinte paga a factura.

 

E qual vai ser o imposto a aumentar? O que dá mais dinheiro e mais rapidamente, o IVA! Levam todos pela mesma tabela, ricos e pobres, empresas produtivas e casinos, é só arrebanhar, é democrático.

 

O problema (há sempre um poblema) é que os nossos produtos vão ficar mais caros, vamos exportar menos (única saída para a crise) vamos ter menos dinheiro para gastar, comprar menos, não vamos conseguir puxar pelo consumo interno e pôr as empresas a produzir e a vender mais.

 

Como uma parte cada vez maior das receitas do Estado, vai para o serviço da dívida, cada vez maior, e o relançamento da economia não se faz, (logo não há maior receita,) apesar de aumentar impostos o Estado vai ficando com menos dinheiro, e a possibilidade de isto entrar num "buraco negro" é mais que muita.

 

Vai ficar para quem vier a seguir. O empobrecimento do país e de nós todos!

 

No Centenário (6): as chaves do tesouro

A lição da História e da Verdade. Chegaremos a isto?

 

 "As quadrilhas não lhe sahiram ao caminho pela sua tyrannia, falsa tyrannia como havemos de provar; mas por elle (El Rei D. Carlos) se ter resolvido, emfim, a defender a todo o transe as chaves do thesouro. Perdoaram-lhe todos os crimes. Não lhe perdoram essa virtude. Morto elle, a corôa, no dia seguinte, rendeu-se a assassinos. O poder cahiu na lama. O principio e a força da auctoridade, já tão abalados, extinguiram-se de todo. E desde essa hora solemne quem reinou em Portugal não foi D. Manuel, filho e successor do rei assassinado. Foi a carabina do Buiça. Podia mais este assassino, do fundo da sua sepultura, que a lei, o direito, o sceptro, a policia, o exercito, todas as forças moraes e materiaes d’uma monarchia que ha quasi oito seculos vivia."

 

Do antigo militante do PRP, Homem Christo, 1912

Portugal é mais corrupto do que a Itália – a propósito da polémica

 

Nos últimos dias, vai forte a polémica, dentro e fora do Aventar, acerca do último «post» que escrevi. Referia-me então ao arquivamento das escutas entre Armando Vara e José Sócrates, escutas essas que dois Magistrados da comarca do Baixo Vouga – um Juiz e um Procurador do Ministério Público – consideraram conter indícios de crime contra o Estado de Direito.

 Não fui eu que o disse, foram dois Magistrados independentes. Independentes porque não nomeados pelo poder político.

Não foi esse o entendimento do Procurador-Geral da República, um cargo que, como se sabe, não é, na prática, independente. Porque a sua nomeação, ao contrário dos outros Magistrados, depende do poder político: é nomeado pelo Presidente da República sob proposta do Governo. Da mesma forma, é também o Governo que pode propor ao Presidente da República a sua exoneração.

É por isso que, no que diz respeito ao conteúdo desse «post», não tiro uma vírgula – as instâncias superiores da Justiça protegem e defendem os titulares de cargos políticos e evitam que eles sejam chamados à barra do Tribunal.

Não faltam os exemplos. Sei que, como em todas as profissões, há os políticos sérios e os políticos desonestos. Mas então, como explicar que em todas as profissões haja desonestos que prestam contas à Justiça e na política não? É tudo gente séria…

Já quanto ao estilo, reconheço um certo exagero, fruto de ter escrito em cima do acontecimento. Que dizer? Olhem, que me inspirei num famoso «blogger» – que durante anos andou a chamar filho da puta a toda a gente e que, hoje em dia, é um garboso Deputado do Partido Socialista.

No meio de tudo isto, só tenho pena que a polémica tenha extravasado para a caixa de comentários de um outro «post», cujo objectivo era prestar uma sincera homenagem a Salgueiro Maia, o herói da Revolução de Abril e aquele que, se fosse vivo, estaria mutio desiludido com o estado a que isto chegou.

 

 

  

O arguido Rangel e a sua crónica

Emídio Rangel foi constituído arguido pelo DIAP de Lisboa que considera existirem indícios de prática do crime de difamação, avançando com o mesmo para julgamento. Em causa uma crónica publicada a 8 de Março de 2008 (e obviamente escrita na véspera) onde descrevia a manifestação de professores que ia ter lugar nesse dia. Emídio Rangel, o célebre homem do berbeqim, anda amofinado. A crónica desapareceu dos arquivos do Correio da Manha, certamente devido a um erro informático, mas fica aqui reproduzida, depois de recuperada das profundezas da net, onde o mais difícil é desaparecer alguma coisa. Lida hoje é um documento histórico que atesta o nível com que os professores foram tratados durante o governo de Sócrates I. De resto recuperar textos dos blogues sobre este tema deixará nos próximos tempos muito socratista à beira de outro ataque de nervos.

 

HOLIGANS EM LISBOA

 

Tenho vergonha destes pseudo-professores que trabalham pouco, ensinam menos, não aceitam avaliações .

Eles aí estão ‘em estágio’. Faz-me lembrar os hooligans quando há uma disputa futebolística em causa. Chegaram pela manhã em autocarros vindos de todo o País, alugados pelo Partido Comunista. Vestem de preto e gritam desalmadamente. Como diz um tal Mário Sequeira, em tom de locutor de circo, “à maior, à mais completa, à mais ruidosa manifestação de sempre que o País viu” .

Eu nunca tinha apreciado professores travestidos de operários da Lisnave, como aqueles que cercaram a Assembleia da República, nos anos idos de 1975, com os cabelos desalinhados, as senhoras a fazerem tristes figuras, em nome de nada que seja razoável considerar. Lembro-me bem dos meus professores. Não tinham nada que ver com esta gente. Eram referências para os seus alunos. A maior parte escolheu aquela profissão porque gostava de ensinar. Talvez por isso eram todos licenciados e com um curso (dois anos) de pedagógicas. Aprendi muito com eles e quando dei aulas, no liceu e na universidade, utilizei muitas vezes os seus métodos.

Estou-lhes grato para a vida inteira. Hoje as coisas são bem diferentes, embora seja óbvio que estes manifestantes são só uma parte dos professores. Felizmente ainda há milhares de professores (talvez a maioria) que exercem com toda a dignidade a sua profissão. A manifestação é contra uma professora que agora é ministra. Uma ministra sábia, tranquila, dialogante, que fala com uma clareza tal que só os inúmeros boatos, a manipulação e a leitura distorcida do que propõe podem beliscar o que de boa-fé pretende para Portugal. Se reduzirmos à expressão mais simples as suas pretensões tudo se pode resumir assim :

– Portugal não pode continuar a pôr cá fora jovens analfabetos, incultos e impreparados , como acontecia até aqui.

– Os professores colaboraram com um sistema iníquo que permitia faltas sem limites, baixas prolongadas sem justificação e incumprimento dos programas escolares.

– Os professores não são todos iguais. Quero referir-me àqueles que sem nenhuma vocação (com ou sem curso Superior) instalaram um culto madraceirão que ninguém punha em causa nem responsabilizava, mas que estava a matar o ensino.

Confesso que tenho vergonha destes pseudoprofessores que trabalham pouco, ensinam menos, não aceitam avaliações e transformaram-se em soldados do Partido Comunista, para todo o serviço. Maria de Lurdes Rodrigues é uma ministra determinada. Bem haja pela sua coragem. Por ter introduzido um sistema de avaliação dos professores, por ter chamado os pais a intervir, por ter fechado escolas sem alunos, por ter prolongado os horários e criado as aulas de substituição, por ter resolvido o problema da colocação dos professores, por ter introduzido o Inglês, por levar a informática aos lugares mais recônditos do País. Estas entre outras medidas já deram frutos. Diminuiu o abandono escolar, os métodos escolares estão a criar alunos mais preparados, os graus de exigência aumentaram. O PCP pode usar a tropa de choque que agora arranjou para enfraquecer o Governo e utilizar as suas artes de manipulação e demagogia até a exaustão. Mas creio que a reforma tem de se fazer, a bem do País. É absolutamente nítido que os professores não têm razão. E os estúpidos do PSD que se aliaram ao PCP perderam o tino de vez, porque Portugal não pode parar mais. Espero ver Luís Filipe Menezes à cabeça da manifestação contra os interesses do País.

Emídio Rangel

Se continuam assim não há pedras que cheguem até ao fim da temporada

O autocarro do Guimarães foi apedrejado, este domingo à noite, quando a equipa regressava a casa, após a vitória sobre o Benfica, na Luz.

 

Os Juízes que investigam Sócrates são bufos…

Incapazes de compreenderem que  um país decente e democrático, não pode ter um Primeiro Ministro sobre o qual recaem, uma e outra vez, suspeitas de favorecimento de amigos, de atropelo à lei, de tirar cursos ao domingo, de controlar bancos privados com o dinheiro do Estado, de mentir à Assembleia da Republica, de calar telejornais, de falsificar fichas pessoais enquanto deputado, passaram em desespero de causa a chamar "bufos" a quem tem o dever de investigar.

 

E a quem tem o dever de não deixar que as provas sejam destruídas, conforme a opinião de ilustres penalistas e que teve vencimento, como se vê pelo arquivar em vez de destruir.

 

É óbvio que o Juiz titular do processo, o juiz local, é independente no que se refere à instrução daquele processo e não tem que receber instruções de quem quer que seja. Que isto não agrade a quem quer calar as vozes independentes que ainda se fazem ouvir na Justiça é que é um autêntico escândalo.

 

João Palma, Presidente do Sindicato do Ministério Público, ainda ontem na televisão, dizia que o ministro que inventou a "espionagem política" ia ter que a explicar. É que hoje trava-se uma luta sem tréguas na Justiça. Entre os que querem "abafar" tudo (como aquele militante do PS, Presidente do Eurojust, que fez umas ameaças aos colegas acerca do Freeport) e os que sabem que se não avisarem a opinião pública tudo morre no ar condicionado do poder.

 

Mas agora passou-se a uma outra fase da operação. Quem critica Sócrates não é patriota. E acenam-se com créditos, com amizades e com contactos, já perceberam que no país de Sócrates estas ameaças funcionam.

 

Esquecem, todavia, que há pessoas que nunca precisaram de mudar a sua opinião ao sabor de interesses pessoais ou partidários. E muito menos de utilizar o nome honrado de Salgueiro Maia para atacarem quem não pensa de igual forma. Foi para isso que se fez o 25 de Abril!

 

Como fui eu que convidei, pessoalmente, o senhor Coronel Vasco Lourenço, para nos falar de Salgueiro Maia e face ao que foi aqui comentado por outro Capitão de Abril, irei  agradecer ao Presidente da Associação 25 de Abril, da qual sou sócio, e desvinculá-lo do convite que lhe fiz.

 

Lá estaremos, dia 5 de Dezembro, com outras pessoas e outras opiniões sobre Salgueiro Maia. É assim em democracia. Os heróis não são propriedade de ninguém!

 

Prometemos que vamos continuar a opinar com a independência e a liberdade que lhes devemos, de todas a melhor forma de  perpétuar a madrugada libertadora!

 

Déficite democrático

Há cada vez mais sintomas, bem visiveis, de uma asfixia democrática que faz o seu caminho, sem que a sociedade civil, mais uma vez, preste a devida atenção.

 

O artigo da Sábado, onde revela que Sócrates tentou, com um telefonema de alguem que lhe é próximo, impedir a saída do artigo sobre o Freeport, é assustador. Está lá assumido pelo director do SOL, com todas as letras e com nome.

 

A verdade, por mais que os seus apaniguados digam o contrário,é que o primeiro ministro tem no seu ADN, o gene do "xico-esperto" como lhe chamou Marcelo Rebelo de Sousa. Tudo se consegue com dinheiro, tudo se compra, o poder, mesmo o obtido por meios democráticos, justifica os meios. Exercer um poder democrático exige contenção, respeito por quem não pensa do mesmo modo e  a integridade para obedecer às leis  e à Constituição.

 

Junta-se a isto, o facto, hoje indesmentível, que o país caíu numa situação alarmante de onde não sairá com estas políticas, cujos resultados o PS não quer ver. O PS está desde 1996 no poder, (com um hiato de 2,5 anos, tambem desgraçado), pelo que não pode alijar as responsabilidades inerentes a esse exercício.

 

O país entrou num período longo de empobrecimento, pela mão dos socialistas e do seu olhar centralizador, não substituiu o tecido empresarial com novas tecnologias, inovação e produção de bens e serviços transaccionáveis.

 

Os números das contas públicas, na hora da verdade, revelam-se tal qual as instituições da UE vêm apontando há muito tempo, contra os números falsos do governo. Está aí o Orçamento rectificativo a que Teixeira dos Santos chama "distribuitivo" e que pede mais 4.9 mil milhões de euros, o déficit está nuns impensáveis 8%. A dívida pública é um peso que o país não suportaria se não estivesse integrado na UE! Somos, novamente, o "pobrezinho" que vive das esmolas dos amigos!

 

E não sei se já repararam, mas a operação " aumento de impostos" já começou, ainda com tímidas manifestações mas já públicas, bem à maneira socrática de ir lançando a ideia para o curral se acostumar.

 

Bem dizia Vitorino. Habituem-se! Ou Jorge Coelho, quem se mete com o PS, leva!

 

Está visto que sim!

Dom Quixote e os nossos descendentes

Os que tiverem a paciência de ler este texto, podem perguntar-se qual a relação entre Dom Quixote e a nossa descendência. Eu próprio, coloquei-me a questão antes de iniciar a escrita. Estou certo, que esse querer saber relacional, fez-me saltar sobre esta máquina, que não apenas escreve, como também me faz pensar enquanto desenho as palavras. A imagem (nº 1) do artista Paul Gustave Doré (Estrasburgo, 6 de Janeiro de 1832Paris, 23 de Janeiro de 1883), leva-me a pensar que Dom Quixote foi o cavaleiro que se bateu pelas damas, mandando à sua frente Sancho Panza incumbido de limpar o caminho de obstruções que não lhe permitissem lutar pela sua amada. Amada que nunca vimos nas ilustrações, Dulcineia del Toboso estava na mente do Senhor, mas Doré estava obrigado a desenhar a dama (imagem nº 2) que enlouquecia de amores o seu cavaleiro.

 

Imagem n.º 1   Imagem n.º 2

 

 Não com estas formas, mas são as mulheres que amamos loucamente, profundamente, até o extremo de abater um pelotão completo de malfeitores, para resguardar a sua beleza, calma, serenidade e, ainda mais, essa paixão de querer procriar com elas. 

Dom Quixote estava inflamado de paixão, nem conseguia adormecer ao pensar no corpo, ou terno e branco, que o ia receber. Sem saber, por causa da sua doença, que Dulcineia não queria estar com ele. A paixão levanta até os cabelos do corpo, faz pouco da nossa razão e empurra o nosso corpo em procura da estabilidade de entrar nela; é o que tenho definido com a frase, que passou a livro: Desejo-te, porque te amo. O nosso corpo tem uma lei que nos acalma: entrar entre essas brancas pernas, enquanto amamos e acariciamos o resto do corpo, convidamos, seduzimos, deixamo-nos seduzir e no grito de angústia final, a nossa semente faz outro ser que amamos serenamente, corpo que nasce do doce lamentar da mulher amada e que prolonga os nossos sentimentos ao longo dos anos.e… perde por olhar para trás.

       

Imagem n.º 3    Imagem n.º 4

 

Com essa doçura que faz de nós Cavaleiros das nossas Damas que nos amam, que nos amam e nos protegem, tal como nós a elas. Dom Quixote estava doente de amor, de paixão, do impossível. A sua Dulcineia era a sua imaginação, a sua semente sempre levantada, não conseguia descansar da paixão. Queria a sua mulher e queria-a como mãe dos seus filhos. Doré não conseguiu reproduzir uma Dulcineia para nos amar, mas sim uma Beatrice da Divina Comédia que faz esquecer todo e qualquer amor que não seja o de Orfeu pela sua Euridice, que a encontra no inferno…. e a perde por olhar para trás

      

Imagem n.º 5, como Alighieri a Beatrice, nunca perfeita; Imagem n.º 6, Dom Quixote a sua Dulcineia del Toboso, apenas bela na sua realidade perdida.

 

A máquina do tempo: Gualdino Gomes – uma operação de resgate (1)

 

Da esquerda para a direita, Abel Manta, Aquilino Ribeiro, Gualdino Gomes e Júlio Costa Pinto. Esta fotografia, tirada em 1938 á porta da Havaneza, no Chiado, é a única que se conhece de Gualdino Gomes.

 

Sócrates, o filósofo grego, viveu entre 470 e399 a.C. Diz-se que era filho de uma parteira e de um escultor e marcou para sempre a história da filosofia. Nada deixando escrito, apenas o conhecemos através das difamações de Aristófanes, da imagem redutora que dele traçou Xenofonte e dos elogios de Platão, os quais lhe conferem uma dimensão que doutra forma não teria.

 

Há vultos que assumem grande importância e influência enquanto estão vivos e, se ninguém os recordar, desaparecem ao morrer, pois nem todos têm a sorte de ter um Platão como amigo.  Há também o fenómeno inverso, como o de Fernando Pessoa, que, como grande figura literária, só começou a «viver» cerca de vinte anos após a sua morte.

Vou falar sobre um homem que não tem o nome em qualquer rua e não figura sequer nas enciclopédias.Vamos conversar sobre uma figura da cultura do ultimo quartel do século XIX e primeira metade do XX, que a maioria das pessoas desconhece completamante – Gualdino Gomes. Salvaguardando as devidas proporções. Nem Gualdino era Sócrates, nem eu sou Platão.

 

 

«Sou um leitor, não sou um escritor», dizia aos que o acusavam de não ter obra publicada. Porém, mais do que um leitor, Gualdino foi um censor ético e estético, um critico severo e atento, cujas diatribes eram temidas. Os seus conselhos foram acatados por escritores de sucessivas gerações. Vagas de literatos e de artistas que pelos seus olhos foram passando, aguardavam, apreeensivos, o juízo que, da sua cadeira de café, Gualdino iria emitir.

 

Durante sete décadas manteve convívio com os mais notáveis homens de letras e artistas. Foi amigo de Oliveira Martins, de D. João da Câmara, de Teixeira-Gomes, de Marcelino Mesquita, de Raul Proença, seu director na Biblioteca Nacional. E foi íntimo amigo (e inimigo de estimação) de Fialho de Almeida. Óscar Lopes, na História da Literatura Portuguesa, afirmou que Fialho foi um émulo de Gualdino no seu «pontificado de café». A relação entre Gualdino e Fialho nem sempre decorreu de forma pacífica.

 

«Algumas figuras, de certo modo numerosas, fizeram do café o único cenário conhecido ao longo de toda a sua vida: Gualdino Gomes, Stuart Carvalhais, António Soares, Alberto de Sousa…», afirmou Marina Tavares Dias em Lisboa Desaparecida. Raul Brandão nas Memórias foi mais cáustico para a fauna que escolhia os cafés como habitat: «É na Brasileira e no café Chiado que os pobres-diabos, como rãs num charco de café, se exaltam ou combinam as revoluções do dia seguinte. A um canto, o Gualdino de gabinardo e barba branca, prepara a última piada…» Na realidade, o nome de Gualdino Gomes é quase indissociável dos lugares que, durante mais de sete dezenas de anos, foii ocupando às mesas dos cafés da Baixa lisboeta. Como recorda José Gomes-Ferreira, há «alvos predilectos (…) das setas envenenadas de muitos arcos» que a fauna dos cafés desfere. Júlio Dantas é um deles (- Júlio Dantas é o discípulo do chinó do Garrett! dirá Gualdino Gomes «mestre dos mestres dos conversadores de café»).

 

Uma reportagem do Notícias Ilustrado de 1928 – «Lisboa e os seus cafés», proclamava, legendando uma foto da fachada do Martinho, situado no então Largo de Camões (hoje Praça D. João da Câmara) – «O Martinho que ainda se lembra de Fialho e de Gualdino». Alberto Allen Pereira de Sequeira Bramão, o político e jornalista, numa evocação organizada pelos Amigos de Lisboa em 26 de Dezembro de 1936, recordou a tertúlia do Martinho: «o que caracterizou esta casa era o grupo literário que todas as noites realizava as suas sessões de cavaqueira irreverente, em torno das chávenas de café e do pontífice que era o incomparável Fialho de Almeida. Desse grupo faziam parte Marcelino Mesquita, Manuel Silva Gaio, D. João da Câmara, Gualdino Gomes, Heliodoro Salgado, João e Levy Marques da Costa, João Chagas, o espirituoso Figueiredo (Pinturas), Eugénio de Castro, Abel Botelho […] Guerra Junqueiro e Rafael Bordalo Pinheiro também apareciam de longe a longe.»

 

O escritor Fernando Correia da Silva, no romance Querença, contou dois interessantes episódios ocorridos em 1947 ou 1948, pouco antes da morte de Gualdino. O Fernando era na altura um muito jovem estudante e fazia parte de um grupo que, no Café Chiado, onde Gualdino Gomes, já muito idoso, era figura destacada: «- O Gualdino é um sobrevievente solitário. É mantido por filhos ou netos de amigos seus já falecidos. Magro e comprido, barbicha branca, à duque de Guise. Roupinha no fio, mas sempre distinto e distante, aristocrata por defesa e temperamento. Diz ele para o criado de mesa que anda sempre a bufar: «Ó Pina, traga-me uma bica e um queque, mas que seja fresquinho.» «Ó Sr. Gualdino, os queques acabaram de chegar…» «Também eu acabei de chegar e já tenho 90 anos…» Segunda história: «Um dia, um preto… Esqueci-me do seu nome. É angolano e jornalista. Anda sempre a louvar o génio universalista dos portugueses, pois o Infante, assim e assado, o Vasco da Gama e Albuquerque… (…) Pois um dia o preto, no Café Chiado, decide humilhar o velho. Não suporta a sua ironia, isso é coisa do reviralho e merece correctivo. Intercepta o Gualdino, aponta-lhe a gola do sobretudo, grita, apregoa para que todos ouçam: «Ó Gualdino, você tem aqui um piolho…» O Gualdino mira o piolho, real ou fictício, para o caso tanto faz. Com um piparote do dedo médio logo o dispara sobre o preto: «Ah malandro, vais já desterrado para a costa de África!»

 

Gualdino foi assíduo frequentador dos galinheiros dos teatros de Lisboa. Os galinheiros eram os lugares mais baratos, com assentos incómodos, situados no topo das salas e, portanto, mais distantes do palco, com má visibilidade e deficiente acústica. Ao galinheiro deu-se também o nome de geral.  António de Sousa Bastos, marido de Palmira Bastos, escreveu: «Apesar de ter aparecido apenas uma única vez no teatro, como colaborador de Marcelino Mesquita na revista A Tourada, que se representou no Teatro Avenida, [Gualdino Gomes] é bastante conhecido no meio teatral por ser um dos mais salientes manifestantes contra grande número de originais que se representam no Teatro Normal [D. Maria II]. No café Martinho, à porta do Mónaco, no galinheiro do D. Maria, é sempre ele o chefe das verrinas.»

 

A propósito desta forma de exercer crítica teatral – através do aplauso vibrante e ruidoso, da pateada ou do hilariante chiste gritado em coro por espectadores da geral, voltemos a Raul Brandão e às suas Memórias: «Pertenceu à malta que ia com Fialho para o galinheiro dos teatros deitar as peças abaixo – pertenceu à malta esplêndida que se levantou como um só homem e gritou – Às armas! – quando, no palco, um actor vestido de porteiro anunciou aos outros a entrada do senhor general – metendo para sempre no fundo apeça, o autor e os comediantes.»

 

Da sua mesa de café, Gualdino assistiu à passagem de grandes e pequenos vultos, de diversas gerações e de distintas correntes literárias. À chegada de uns e à partida de outros, como numa estação de caminho-de-ferro. Viu desaparecer grandes
no
mes da literatura e da cultura:  Alexandre Herculano, Gonçalves Crespo, Cesário Verde, Oliveira Martins, Gomes Leal, João de Deus, Eça de Queirós, Tomás Ribeiro, António Nobre, Gervásio Lobato, D. João da Câmara, Fialho de Almeida, Bulhão Pato, Mário de Sá-Carneiro, Marcelino Mesquita, Gomes Leal, Maria Amália Vaz de Carvalho, Teófilo Braga, Augusto Gil, Wenceslau de Morais, Florbela Espanca, Raul Brandão, Henrique Lopes de Mendonça, Fernando Pessoa, Leonardo Coimbra… 

 

Na sua juventude, relacionou-se com alguns dos próceres da chamada Geração de 70. Viu depois chegar os realistas e os parnasianos, os neo-românticos e os simbolistas, a gente do Orpheu, os futuristas, os presencistas, os seareiros (foi um deles), os neo-realistas, os surrealistas… Durante a sua longa vida assistiu à abertura da Avenida da Liberdade, às grandes comemorações camonianas que constituram como que um ponto de partida, um importante marco, na luta pelo derrube da Monarquia, ao apaixonado e exaltado debate da Questão Coimbrã, ao evoluir das obras de Eça de Queirós, de Antero de Quental, de Sampaio Bruno, de Teófilo Braga, de Ramalho Ortigão, de Oliveira Martins, de Fialho de Almeida, à criação do famoso Grupo do Leão, imortalizado por Columbano, ao Regicídio, à proclamação da República, à eclosão da Grande Guerra, à Revolução de Outubro, ao sidonismo, ao advento do fascismo e do nazismo, ao 28 de Maio, à instauração do corporativismo salazarista, à Guerra Civil de Espanha, à Segunda Guerra Mundial…  A política não era território em que lhe interessasse internar-se. No entanto, não permaneceu alheio às vicissitudes que afectavam o povo. Não aprovava o regime autoritário que, desde 1926, vinha, com as mutações necessárias à sua sobrevivência, a dominar a vida social, política e cultural do País.

 

Falando da relação de Gualdino Gomes com Fialho de Almeida, disse Raul Brandão que, apesar da sua isenção crítica, «com apenas dois ou três folhetos [foram quatro, na realidade!] e um soneto no bolso» – pois esta é toda a sua bagagem literária –   sempre se mói com alguma inveja quando vê outros escreverem mais um folheto do que ele conseguira produzir. E acrescenta: «Passou a vida a inventar pormenores do Fialho, vingando-se, como ele próprio confessa, da maneira como o grande escritor tratou aquele soneto que começava assim: Nas soirées do Gervázio/De olho matreiro e gázio… – Por causa dele deixei de escrever! Escarneceu a minha obra!»

 

Sobre a biblioteca de Fialho, disse Gualdino: «Eu chamo a estes livros as onze mil virgens. São apenas quatro mil volumes, ou pouco mais, mas – vai surprendê-lo esta minúcia – estão aqui todos por abrir. Há aqui Balzac e Zola, Eça e Ibañez, os Goncourt e Ponson du Terrail. Fialho tinha muito Ponson na sua biblioteca. Esta literatura de costureiras e guarda-portões era para as grandes hora amarguradas.» Conta também que, pretensioso e janota, Fialho «ostentava uma grande corrente de ouro e uma esmeralda de brasileiro na gravata. Num dia de tourada, apareceu no Martinho, com uma camisa vermelha que teve de tirar pela troça que lhe fizeram: – Julgo que nunca, nem com a própria mulher, teve relações senão de amizade. Os seus quartos de dormir eram separados, um em cada extremidade da casa, e pela manhã, quando ela lhe batia à porta, ele dizia sempre: – Espere, menina, que eu ainda não estou vestido.»

 

Do lado de Fialho de Almeida as referências a Gualdino Gomes foram muito escassas. Em Os Gatos, referindo-se a um atentado falhado contra o imperador D. Pedro II do Brasil e dissertando sobre a imperiosa falta que ao currículo dos monarcas que se prezem faz um regicídio, mesmo que falhado, diz – «Oh meu senhor, habilite-se! Uma reles bomba que seja.» (estava-se em 1889, a 21 anos de distância de um regicídio bem sucedido…). Neste contexto, e propósito de uma alfinetada literária a D. Luís, dizendo que ele traduziu tão mal Shakespeare «que esfriou entre nós o fetichismo pelas obras-primas estrangeiras – subtil maneira esta de V.M. reconduzir o gosto à exclusiva adoração das nacionais!», continua assim a diatribe. «Era trabalho onde o meu rei despejaria a contento geral as asneiras que lhe tivessem sobrado dos seus outros trabalhos literários, e que podia sugerir talvez ao Sr. Gualdino Gomes, por via do rancor plumitivo, o tirázio que V. M. jamais pechinchará do Sr. Consiglieri Pedroso, mercê do jacobino.» Referia-se aqui Fialho ao professor universitário, ensaísta positivista e militante republicano, Zófimo Consigieri Pedroso, famoso pela acutilância dos seus folhetos doutrinários. Fialho de Almeida colocava Gualdino no topo da agressividade verbal, comparando as suas verrinosas piadas a um tirázio regicida.

 

(Continua)

 

Maria cheia de Graça ou Meu Bebé

 

Era um 25 de Novembro de um ano qualquer, mas poucos anos antes deste 25. Era de manhã. Deu imenso trabalho: a mãe já era crescida, antes haviam outras. Nasceu a rir, dizem por ai. À noite, nunca fazia barulho, apenas se tiver fome. Como acontece hoje em dia. A mais nova de quatro meninas, teve imensas mães para tratarem dela. Dizem que foi um acidente, mas nem por isso fatal. Era na aldeia, ao Norte de Portugal. O pai foi mudado, sociedade patriarcal, a família toda teve que ir trás o pai. Santo dia! Sair do Norte deste país onde o galo canta e bem, faz dos pintainhos limpar a terra até e passarem a ser raparigas ternurentas e trabalhadores.

 

 

 

 

 

 

 

 todas bonitas, serenas, gentis e colaboradoras umas com as outras. Todas estudaram e receberam o seu canudo das mãos de quem correspondia. Como a riqueza não era muita, trabalharam sem parar e apreenderam especialidades. E, entre trabalho e trabalho, iam nascendo crianças que concebiam com os seus homens. Homens compreensivos, mas manhosos. Maria Cheia de Graça não suportou e ficou só com a sua filha e a sua neta. E a tomar conta da descendência das mais velhas, mal podiam estar com ela, a descendência. Havia esse que mais amava e que, faz três semanas, a deixara para entrar na eternidade  e tomar conta dela desde esse sítio desconhecido para nós. Era um companheiro doce e querido tão inteligente, ou talvez ainda mais, que a tia. Entre eles não havia silêncio. Ele queria saber todo, ela que conhecia essa procura não conseguiu esperar e se especializou em saberes que o sobrinho adorava. Esse sobrinho especial, que desde o seu sítio por cima de nós, toma conta de todos, especialmente da mãe, da mãe da mãe e da tia mimada. Eram, ela, como ele, uma pura gargalhada que continua, em silêncio no dia de hoje, enquanto espera pela sua vez para vê-lo outra vez. Como ainda falta muito tempo, passou a esperar enquanto trata do seu cabelo, da família e dos seus seres queridos. Maria Cheia de Graça passou a ser uma Rapunzel. Homenagem que lhe rende quem apenas recebe favores dela, um Quixote a sua Dulcineia em dia de sol que comemora o seu aniversário à Bebé

Poemas do ser e não ser

Mãos de ausência

 

As mãos grudadas de ausência

fincam dedos na argila dos lençóis

e abrem sulcos no ventre da noite.

Mãos sem poder nem domínio

sem rigor nem justiça

mãos impermanentes

demasiado abertas

para os punhos fechados que encerram.

Mãos secas

pegadas à idade das pedras

a cabeça de ontem

nas grades ferrugentas de hoje.

Olhos molhados

um olhar mendigo a tempos de outro tempo.

Dentro da quinta em ruínas

no meio de silvados

urtigas e ervas daninhas

anos e lustros a caminho de séculos.

Os olhos de minha mãe

cheios de outroras e lágrimas

mostram-me todas as lágrimas do mundo

nas lágrimas de tudo o que se verte em lágrimas

por dentro e por fora do tempo.

Restos de um lago seco

entulhos e restos

esqueletos de cameleiras

escadas sem fins nem degraus

portas e janelas esventradas

de foras e sombras.

Mãe

que o sol se lembre de nascer

onde o carinho é poema

onde o amor e o mar se tocam

dentro de uma gota de orvalho.