Não é propriamente novidade. Há muito era conhecida a falta de solidariedade de Merkel com os parceiros do euro, endividados. É mais um exercício do macabro nacionalismo alemão. Desta vez, de carácter económico-financeiro. No caso de Portugal e da Grécia, começou com a negociata de submarinos e outros equipamentos de guerra; agora é a fase de submissão ao capricho da rejeição alemã de duas medidas cruciais para as finanças do grupo de países em dificuldade:
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Recusar a emissão de obrigações de dívida pública pelo BCE, proposta pelo presidente do Eurogrupo, o luxemburguês Jean-Claude Juncker;
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Declinar o aumento do fundo de resgate para proteção do euro, ao contrário do aconselhado documentalmente pelo presidente do FMI, o francês Strauss-Khan.
Estes atos inflexíveis de Merkel e seu governo estão a compelir a queda de Portugal nas teias do FMI, entrando, desse modo, em prolongada recessão económica. Como, de resto, outros países impossibilitados de se furtar à nefasta intervenção daquela instituição – apenas o decrépito Medina, Mário Crespo e uns tantos companheiros de aventuras escatológicas creem no contrário.
O Jornal de Negócios, ao referir-se à reunião dos Ministros das Finanças da zona euro, destacava as vantagens e desvantagens de um mercado integrado da dívida europeu. A nosso ver, as vantagens superam largamente as desvantagens enunciadas e algumas destas foram empoladas.
Nicolau Santos, por sua vez, em artigo no suplemento de economia do último “Expresso” também defendia a compra de dívida dos países em dificuldades pelo BCE, com o seguinte texto:
“É este o único caminho que evita longuíssimos anos de dor aos países que já pediram ajuda ao FMI e ao FEE e aos que virão ainda a pedir…”
Com efeito, é esta a alternativa que a suserana Merkel nos oferece; alternativa a que, de resto, se junta a irresponsabilidade, a incapacidade e a corrupção facilitada pelos partidos do agora em voga ‘arco do poder’ que, governando o País desde 1986, o prostraram brutal e prolongadamente. A menos que este capítulo da ‘zona euro’ fique amortalhado e, com gente que ainda não vislumbro, da noite se faça dia. Sobretudo, a bem dos que nasceram há 30/35 anos e daí até hoje, amanhã e sempre.
O BCE está a comprar dívida directamente, coisa que não me parece que seja correcto (da mesma forma que não deveria emprestar dinheiro a bancos insolventes a 1% ).
Eu penso que o correcto não é adiar o problema.
Vamos imaginar que a Sra. Merkel dava o seu aval e que resgatávamos todos os podres dos sistemas financeiros (porque é isso que está em causa, não são os países). O resultado final seria a distribuição do fardo do pagamento da dívida por todos os cidadãos, incluindo os alemães, ou mesmo especialmente pelos alemães. Convenhamos que isto é impossível de explicar ao alemão comum, afinal não são apenas os pelintras dos PIIGS que compraram mercedes, a Alemanha vende para pelintras em todo o mundo. Além disto o sistema financeiro está de tal forma alavancado que não acredito que seja possível imprimir dinheiro suficientemente depressa para abafar o problema. Quando os inevitáveis efeitos inflacionistas vierem à tona, então vamos ter a festa final – já estamos a ter, vejam os preços das commodities.
Lembrar também que se a Europa emitisse dívida soberana isso não seria feito sem condições. Muito provavelmente não seria muito diferente das condições impostas pelo FMI com o ingrediente adicional da perda definitiva de soberania que dai iria resultar (ao menos com o FMI a perda de soberania é de carácter mais temporário).
Por outro lado também não é correcto os PIIGS (e os países de leste) estarem a arcar com todas as consequências.
Eu creio que os países não deveriam estar a pagar as dividas do sector financeiro. Se o sistema financeiro tem de colapsar (e na minha opinião é uma questão de tempo, mesmo com FMI), então que colapse. Os países deveriam ter criado bancos destinados a financiar a economia real, com directivas precisas e rígidas. Estou convencido que a transferência de riqueza que já foi feita das pessoas comuns para o sistema financeiro seria mais do que suficiente para capitalizar uma operação como a que descrevi e suficiente para manter a economia funcional. Infelizmente parece que já é tarde demais para fazer isso.
Não é tarde demais para tomar as seguintes medidas:
Prender a generalidade dos banqueiros/políticos maiores responsáveis pela situação actual;Deixar os bancos negociarem a própria dívida;
Diminuir drasticamente o tamanho do estado – eliminar 100% dos boys, PPP, etc, etc, ad nauseum – creio que conseguiríamos ter um superavit já em 2011!
Se for necessário cessar pagamentos, então paramos de pagar.
Vamos ver o que os irlandeses vão fazer. Estão neste momento a discutir o orçamento e vão votar daqui a pouco…
Caro Helder Guerreiro,
A ‘Zona Euro’ foi criada sob euforia induzida, mas com imperdoáveis lapsos de coesão fiscal económica e social, acabou por causar os resultados que sabemos (infelizmente).
É na concepção de ter sido apenas uma zona monetária, sem preocupações de natureza de consistência económica, social e fiscal, que os países mais frágeis da referida zona se encontram em dificuldades por motivos diversos: uns por falta de liquidez da banca (Irlanda), outros por falta de capacidade de criação de riqueza (Portugal), outros por ‘bolhas’ (Espanha) e finalmente ainda outros por falta de rigor e seriedade na gestão das contas públicas (Grècia). Fiquemos por aqui e deixemos os paradoxos da Bélgica e até de Itália.
O estímulo ao consumo, privado e público, foi induzido por políticas de expansão do crédito bancário que, logicamente, permitiu à banca alavancar-se para posições de sobredomínio em relação ao sector económico. Uma vez registado o fenómeno de insolvência de bancos americanos, sobretudo os dedicados a produtos de investimento – os tais classificados de tóxicos – alguns bancos europeus (Islândia e Irlanda são os casos mais evidentes) envolveram-se na embrulhada das ‘subprimes’, ‘hegde funds’, ‘short sellings’, futuros, derivados e por aí fora.
Este é o diagnóstico de economistas de reconhecida competência, como Stilglitz e Krugman. Todavia, não estamos na fase do diagnóstico. Esta está terminada. Há, pois, que procurar soluções para o problema e é aqui que me identifico com as propostas de Jena-Claude Juncker e me distancio de Merkel, preocupada, ela sim, com os interesses da sua Alemanha, e mais ainda com a sua reeleição.
Quanto ao FMI e às políticas que patrocina, é melhor nem sequer falar do assunto. Tanta coisa haveria a dizer. Desde o exemplo mais recente da Argentina ao agrado com que acolheu as medidas do líder romeno Ceausescu que, eliminando até à exaustão condições básicas de sobrevivência do seu povo, privilegiou as opções do FMI, por quem foi elogiado.
Helder, tudo isto é mais complexo do que simples trocas de ideias num blogue, mas, com ou sem Merkel, desejo ardentemente o desfecho decisivo da política do ‘euro’. Não discuto, pois, protagonistas, mas políticas. Sejam estas definidas e aplicadas por quem quer que seja. E neste momento, para Portugal, há duas alternativas de solução sobre a mesa: ou é o financiamento via BCE ou é a intervenção do FMI. Creio que a primeira, numa acepção de interesse colectivo nacional, é a mais apropriada. Mas se for a segunda, veremos. Ou, talvez, a ‘RUA’ também tenha algo a dizer, alto e bom som. Tudo contra a soberania perdida, os ‘boys’, as PPP’s e toda a espúria acção política que é vasta e nefasta quanto aos efeitos – ou há dúvidas?
Obrigado pelo comentário, até porque defendo o diálogo, como forma de convivência democrática.
Concordo a 100% com o diagnóstico.
Quanto às soluções:
Eu julgo firmemente que estas duas “soluções” vão ser igualmente perniciosas nas mesmíssimas coisas. Não penso que sermos resgatados pelo BCE vá resultar em medidas diferentes daquelas que o FMI irá impor como condição para a sua intervenção. Idem para o acesso a um hipotético orçamento alimentado com dívida europeia. Termos uma Europa solidária e que actue com coesão, só mesmo em sonho. Não existe.
Eu julgo que é possível pensar numa terceira via. É assim tão dramático cessarmos pagamentos? Teríamos as mesmas dificuldades financeiras, o sofrimento seria o mesmo, mas seriamos donos do nosso nariz.
Caro Helder Guerreiro,
Das duas alternativas que citei e que são as que se colocam no horizonte, a do BCE, pelo nível mais baixo das taxas de juros e pelas imposições políticas, parece-me a menos desfavorável – as receitas do FMI são sempre muito mais draconianas.
A terceira via – cessar os pagamentos – levaria a uma complexa situação, dado que o nosso sistema financeiro, carente de financiamento externo, ficaria impedido de suportar o funcionamento do sistema económico – famílias e empresas. O incumprimento da dívida portuguesa, isoladamente, seria a meu ver catastrófico. E só me parece possível admiti-lo como acção colectiva, de vários países, que assim poderiam ameaçar a própria existência do euro como moeda comum.