No Terreiro do Paço e em Dallas

Há quase cinquenta anos, um misterioso tiroteio em Dallas, tornou possível testemunhar quase em directo, o assassínio de um Chefe de Estado. Na ocasião, John Kennedy – uma das mais colossais fraudes mediáticas do passado século – foi abatido aos olhos de uma população chocada e incrédula. As imagens do acontecimento, são igualmente o testemunho da normal aflição de Jackie Bouvier Kennedy que desvairada, rasteja pela parte traseira da limusina presidencial. O pânico daquela mulher, a cabeça estilhaçada do presidente e a tragédia interiorizada por um povo inteiro, remete-nos para aquele outro dia, pouco mais de meio século antes, quando o landau preto, transportava a família real portuguesa. Os mesmos sons de tiroteio, as correrias apavoradas dos atónitos espectadores da matança, a coragem abnegada de cocheiros, polícias e de alguns populares. Mas neste caso, o que a memória colectiva registará para sempre, foi a atitude de uma mulher que erguendo-se na carruagem, teve o braço firme que faltou ao governo, à policia e à população que escapou amedrontada. Dª Amélia não fugiu nem procurou proteger-se. Mais do que a própria vida, defendeu os seus e com a esta demonstração pública de abnegada coragem, honrou o trono e a sua pátria de eleição.

Duas mulheres de ascendência francesa. Duas opostas atitudes e uma certa maneira de exercício do dever. De uma, a senhora dos salões mundanos, registará a história o delírio da obsessão pela imagem que o dinheiro compra, o fait-divers e a futilidade glamourosa de uma capa de revista. Da outra, a heroína do Terreiro do Paço, ficará para sempre, o testemunho de que provou estar preparada para o perfeito desempenho da esmagadora tarefa representativa que a vida lhe reservara. Em suma, duas formas de ver a França. A de ontem e a dos nossos dias.

Há quem não esqueça. Hoje, 1º de Fevereiro, a teimosia persiste na Igreja da Encarnação – Chiado, Lisboa -, onde pelas 19.00h se realizará o 103º sufrágio por D. Carlos e D. Luís Filipe. Num século XX que em Portugal teve início naquela tarde fria de inverno, aquele foi o marco histórico que vincou o destino de várias gerações: liquidação do património da praxis constitucional, a normalização do livre arbítrio, da violência extrema e da repressão. Sobretudo, há a lastimar a opressão das mentes e o atraso social que implicou.