Todos nascemos parolos

Pieter Bruegel

«Todos nós nascemos parolos. Todos nós, sem excepção. E só por um esforço continuado de aprendizagem, durante toda a vida, aprendemos a sê-lo um pouco menos. Mas todos nós nascemos parolos.»

Esta foi talvez a frase mais memorável que escutei em cinco anos de aulas na Universidade Técnica de Lisboa, era eu estudante em Agronomia. Do lado de lá da janela o Sol iluminava a seara da Tapada da Ajuda, onde os tordos se banqueteavam, acolitados pelas perdizes. Belos tempos, esses.

“Todos nós nascemos parolos”, repeti para mim mesmo. O professor que disse esta verdade nascera assim, e também nós outros seus alunos. O monarca e o presidente, o duque e o gestor, o cardeal e o cientista, o milionário e o indigente, acrescentei em surdina. Parolos, todos, desde a nascença em berço fidalgo, num alpendre miserável, ou numa casa remediada.

Havia justiça neste sarcasmo à condição humana, pareceu-me. Desde o mais altivo aristocrata ao mais boçal delinquente, do mais abjecto filisteu ao mais profundo erudito, todos nascemos iguais em parolice. E somente pelo uso que fazemos das oportunidades que nos foram dadas, ou sonegadas, conseguimos superar (muito a custo, e sempre precariamente!) a nossa natureza inata.

Mas todos nós nascemos parolos.

[na figura: “Retrato de Anciã”, Pieter Bruegel o velho, 1535]

Eis que o PSD encontrou a sua causa fracturante em tempo de eleições

desconfianca

Enquanto se fala dessa base de dados de pedófilos não se fala do estado do país. É a causa fracturante laranjinha, devidamente musculada comme il faut a uma direita que se preze, na mesma linha usada por Sócrates para ocupar o vazio da política, esse mesmo que resultaria de não se querer falar do que se fez e do que se vai fazer. Junta-se ao tema presidenciais. Haja chouriços para encher, que isso de Direito é coisa de piegas.

Que giro!

Apresento-vos o primeiro emigrante português residente longe da pátria. É dos lados de Ourém e disse-me pelo telefone que estava com pena de ter perdido o filme, da responsabilidade de Al Gore, ex-vice presidente dos Estados Unidos, sobre as malfeitorias que vários países, incluindo o seu, fazem à Natureza. Informo que o filme está no cineminha do meu bairro e que eu, por falta de tempo, também ainda o não vi. Acertámos ir os dois nesse mesmo fim de tarde. E fomos. As falas do Al Gore eram claras. O filme, em si, era barulhento a valer:desabamentos, ventanias, estrondos, sirenes. Nós, de olhos colados no ecran. E as sirenes que não se calavam. Até que a imagem desapareceu, as luzes se acenderam, e se ouviu uma voz calma e bem timbrada a pedir-nos que, sem pânico, mas rapidamente, saíssemos porque havia um incêndio no prédio. Íamos a meio da escada rolante quando pelo altifalante fomos avisados que devíamos ir à bilheteira receber outro bilhete, para o caso de querermos ver os quinze minutos de filme que que nos faltavam, ou para receber o dinheiro do bilhete se não estivessemos interessados. O de Ourém disparou a pergunta: “precisa de ver mais filme para saber quem são os gajos que andam a lixar o mundo?”. Reconheci que não, não precisava. Chegados ao átrio, o rapaz foi direito à bilheteira e veio de lá com o dinheiro.
Tínhamos ido ao cinema de borla. Este é o português desenrascado.

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