Clube dos Poetas Imortais: Manuel María (1929-2004)

 

Se há poeta que se justifique figurar neste clube, é o galego Manuel María. Tenho evitado, no que se refere aos portugueses e aos brasileiros, incluir gente muito famosa, muito estudada por críticos literários e objecto de teses académicas. Gente que será imortal sem a minha modesta ajuda. Porém, africanos lusófonos e, sobretudo, galegos (porque há quem hesite em os considerar lusófonos), mesmo famosos nos seus países, são pouco ou nada conhecidos entre nós. Manuel María é uma das vozes mais emblemáticas do ressurgimento do galego como língua literária. Grande poeta, escreveu obras como «Mar maior» (1963), «Os sonhos na gaiola» (1968), «Remol» (1970), «Cantos rodados para alheados e colonizados» (1973), «O livro das badaladas» (1977), «O caminho é uma nostalgia» (1985), «As lúcidas luas do Outono» (1988), «Os longes do solpor» (1993) e tantos outros – cerca de três dezenas de obras.

 

 

 .

Manuel María, nasceu em Outeiro de Rei, em 6 de Outubro de 1929 e faleceu na Corunha, em 8 de Setembro de 2004. Filho de camponeses, exaltou na sua obra o labor dos trabalhadores do campo, dos labregos. Foi um homem que não fugiu ao compromisso político, mas sem esquecer a dimensão humana no seu todo, incluindo o amor e a fraterna amizade. Da obra «99 Poemas de Manuel María» (Razão Actual, Porto, 1972), seleccionei «O labrego». De notar que a palavra «labrego», que para os portugueses pode ter uma conotação levemente pejorativa, para os galegos é o vocábulo usado para «camponês»:

            O Labrego

            Un labrego tan só é unha cousa

            que case non repousa.

           

            Da sementeira a seitura,

            pasando pela cava,

            a súa vida é moi dura

            e moi escrava.

 

            Sempre trafegando,

            arando,

            sachando,

            malhando,

            gadanhando,

            percurando o gando.

 

            Sempre a olhar pró ceo

            com medo e com receo.

            Sempre a sementar ilusión

            ponhendo na semente o corazón

            pra colheitar probeza e mais tristura.

 

            Dilhe ao labrego da beleza

            da campía,

            da súa fermosura

            e poesia.

 

            Dírache que sí,

que a beleza pra tí.

 

Pró labrego é o trabalho

o andar tocado do caralho,

o pan mouro i o toucinho.

 

(Múdanse de calzado ou de traxe

cando van de viaxe,

de feira ou de romaxe

 

e xantan, eses días, pulpo e vinho);

 

os eidos ciscados, minifundiados

que quér decir atomizados);

o matarse sachar de sol a sol

pra lograr seis patacas

com furacas,

catro grãos de centeo i unha col;

o dobregarse sobor dos sucos

pra pagar gabelas e trabucos;

o vivir entre esterco i animales

en chouzas case inhabitabeles.

 

I aguantar, aguanta e aguantar,

Agardando morrer pra descansar.

 

 

 

Discover more from Aventar

Subscribe now to keep reading and get access to the full archive.

Continue reading