O Norte.

 

Por estranho que possa parecer, concordo com boa parte da opinião de Alberto Gonçalves (disponível na edição em papel) na Sábado de hoje, “O Norte Imaginário”. Mais, é um texto de leitura obrigatória para todos aqueles, como eu, que defendem a Regionalização. Porquê?

 

Simples, as críticas duras que aponta aos defensores da Regionalização, pelo menos a boa parte deles, é justa. O autor da prosa começou por expor o centralismo de forma correcta. Destaco: “O centralismo, velho de séculos e nas recentes décadas insultuoso, nota-se”.

 

Contudo, Alberto Gonçalves sublinha um ponto fundamental: “Graças à apropriação de uma desmesurada parcela das maiores fontes nacionais de riqueza, leia-se os impostos e os fundos europeus, Lisboa tornou-se comparativamente próspera face ao Porto e crescentemente indiferente face às lamúrias do Porto. O engraçado, para quem se diverte com o infortúnio alheio, é a ocorrência de um processo simultâneo e similar entre o Porto e o Norte de facto”. Esta afirmação final é, por muito que custe, profundamente verdadeira e explica o motivo pelo qual boa parte dos responsáveis políticos nacionais nascidos nesse “Norte de facto” a que se refere, chegados a Lisboa e alçados ao poder são os mais centralistas dos centralistas.

 

A mudança só serve se for para melhor. Para quem, como eu, acredita que a Regionalização é um caminho de mudança, mais, é “o caminho” e sendo eu nado e criado no Porto, não posso deixar de defender que a Regionalização, no que toca ao Norte, só pode ser realizada se, e só se, o Porto não representar para a Região o que Lisboa representa para o país. Trocando por miúdos: o Porto não pode nem deve ser a capital da Região.

Alguns amigos discordam e comparam logo com Barcelona e a Catalunha. Um deles vai mais longe, “Norte não é região, Norte existe em qualquer país e nenhum se apelida de tal e nenhum evita que a sua principal cidade seja a capital regional”. Até pode ser verdade. Porém, e volto a citar o artigo da Sábado, “O importante é não esquecer que, afinal, somos todos portugueses. E que o mal é esse”. O Porto, até pelas suas características e pela sua história, sendo a capital da Região seria, não tenho dúvida alguma, uma espécie de segunda Lisboa a secar tudo à volta. Já agora, e uma vez mais olhando para a história, o Norte nunca teve uma capital, permitam-me a expressão, certa. Num determinado sentido temos Braga, numa determinada lógica temos Guimarães e num outro contexto temos Porto. Hoje, se queremos uma Região verdadeiramente descentralizada e tendo presente que terá sempre de existir uma capital administrativa, só a consigo ver em Vila Real. Olhem para a Galiza: o motor é a Corunha, o coração é Vigo e a capital é Santiago.

 

Mas, referem outros, o Porto é já uma marca perfeitamente reconhecida internacionalmente, está minimamente consolidada. Por isso mesmo. O Porto não precisa de ser capital para se afirmar regionalmente, nacionalmente ou internacionalmente. A Região precisa, o Minho precisa, o Douro e Trás-os-Montes precisam. Tal só acontecerá se o Porto tiver a inteligência de não querer ser uma espécie de ralo – como se tornou Lisboa.

 

Da mesma forma, não será por mero acaso que o Porto Canal, uma televisão nascida no Porto, se preocupa em “regionalizar-se” investindo na abertura de centros operacionais em Braga, no Alto-Minho, no Douro ou em Aveiro. Os novos proprietários cedo perceberam (e bem) que só operando nos diversos polos da Região poderá o canal ter sucesso. Limitando-se ao Porto, falha. E que dizer a este reposicionamento do Jornal de Notícias (a partir do dia 19 de Fevereiro)? Hoje mesmo, o maior diário do Norte apresentou a sua nova estratégia. Qual? Assumir-se como um jornal do Norte e não apenas como um diário do Porto – a nova assinatura diz tudo: “Jornal de Notícias – A Pronúncia do Norte”. É aqui, a Norte, que o JN se pode e deve afirmar. Para o fazer com sucesso terá de estar próximo da população, terá de noticiar o que se passa em Braga, Guimarães, Viana do Castelo, Vila Real, Chaves, Lamego e Bragança, sem esquecer Coimbra, Aveiro e Viseu. O Grande Porto é importante? Claro. Mas não só. E cito estes dois exemplos como poderia citar outros. Estes são os que conheço melhor e são os que primeiro despertaram para esta realidade – as crises são vantajosas nestas coisas.

 

Depois, muito à portuguesa, o autor do artigo da Sábado fulaniza. Não vou por aí. Aliás, não é nada de novo. Aqueles que criticam a regionalização aproveitam sempre a “fulanização” como estratégia. Assim evitam que a discussão se faça onde deve ser feita, no campo das ideias. Sobretudo, evitam ter de explicar algo muito simples: o motivo pelo qual Portugal é, hoje, o único país onde não se realizou um processo de regionalização administrativa – o outro era a Grécia, o FMI tratou do assunto. Pelo menos tentou.

 

Termino com uma palavra a alguns “comentadores de caixa” habituais sempre que escrevo sobre o tema. Dois deles, pelo menos, referem sempre esta questão do Porto centralizador. Espero que com este post percebam que, comigo, não vale a pena essa crítica. É que eu reconheço-a. Com a autoridade, salvo seja, de ser um portuense “retinto”.

Comments

  1. sim os do Marão e os de Aveiro têm montes de coisas em comum

    Bragança centraliza os gastos em detrimento da província bragantina

    o queijo limiano concentra recursos em detrimento de …

    e aveiro e estarreja nã pegam nem de retrós

    sã regiões homogéneas esse norte prenhe de caciques…region nord já

  2. regionalização não é dar feudos aos condes-barões e baronias em concelhias várias

    atão já tamos regionalizados há muite

  3. Tito Lívio Santos Mota says:

    Estou aqui ao longe a imaginar o Norte dirigido por “altas patentes” como o Rui Rio a fazerem a mesma política regional que a Madeira.
    valia-nos muito o “Alcufurado” como diria o Almada Negreiros.

  4. marai celeste ramos says:

    Pois houve tempo de caciques religiosos – depois os caciques políticos já que na “província” predomina desde 1974, um partido – depois sabe-se que dominou e domina o betão e betuminoso e rotundas que vamos ve para que servem, em detrimento do combóio onde deve ser presevado e mesmo que sejam em certas circunstâncias de decisão central, não se entende o interêsse local que o permitiu – que contrapartidas – Agora que tantos andam tão aflitos em não importar mais bens, o que fez o poder autártico para conservar 36% de terra agricultável que destruíu construindo casario para alojar desalojados da barracass e o que fez o Norte para descentralizar, saúde e ensino e indústrias e serviços, e aderiu à PAC e à desindustrialização ?? e aderiu ao fecho compulsivo de centros de saúde e ensino médio sem dar um ai, sem se oporem excepto a polução como se não tivessem. de facto, opositores de nenhum partido -tudo dando à entrada, que parece irreversível ,de mais pobreza (já havia na década de 80 o aparecimento de algo extraordinário que denominaram “novos pobres do desenvolvimento”) sendo que se tantos se queixam da iliteracia de tantos empresários – os que sempre produziram e contreibuiram para aumentar riqueza global – que protecção dão a quem trabalha e produz, excepto as sindicais, bem ou mal – não será que, pior ainda, a iliteracia reside nas embros (excessivos) de mebros dos corpos municipais que só imitam o governo central no despesismo particular e público e para aprsentar trabalho fazem rotundas e retalham os territórios e drenam os grandes ou pequenos orçamentos para DESTRUIR ??
    Quando não houver iliteracia (mesmo universitária) da parte dos autarcas, que sim, que se regionalize e o Porto já deu provas suficientes, até na cultura pois não se esquece Serralves e muitos “serralves” existem desactivados em todo o país e que só em 2011, percebendo isso, foram renascendo – não – dividir os espojos pelos caciques políticos não, pois nada demonstram (excepto ou dois concelhos entre eles Óbidos) que não estão à altura do pais e das suas gentes – desde 1975 – passaram 27 anos – são mesmo lentos – demasiado lentos – tão lentos que se distrairam de exercer as comptências – competentes – para que foram eleitos – não são sequer competentes – são “trabalhadores” da política – precisam de “sindicato” ou já terão, além do seu cordão umbilical ao partido que tem maior decisão em Lisboa – anda-se a brincar muito e àsemelhança do que foi dito ontem pela deputada Maria de Belém, o acesso da mulher ao poder foi longo e difícil e até ultrajante, não se querendo quotas mesmo depois de provas de tanta mulher, foi necessári lei para que ao menos a lei obrigasse a contemplar 2/3 de mulheres com possibilidade de acesso aos lugares de topo – então semelantemante direi que os autarcas demonstrem primeiro a siua capacidade de fazer desenvolver a sua região e depois reivindiquem a regionalização
    Antes não – é só a brincar e se não tivesse sido, não se estaria como se está porque ao que se chegou, não é só resultado nem apenas de um só homem nem de um só partido – é de muitos – direi de todos

  5. Deixemo-nos de histórias. A regionalização não se faz porque o caciquismo local perde poder e o centralismo desaparece.
    Com a regionalização desapareceriam os mega-ministérios, a corte extensa de compadrios que mora na capital e recebe ajudas por isso, a necessidade de deslocações gastronómico-turísticas por esse Portugal profundo pagas com o dinheiro dos contribuintes, repovoar-se-ia o país.
    Por isso é que a regionalização não é encetada, pois com a distribuição harmoniosa da população apareceriam os jornais regionais, as associações, o concerto de posições que é sempre mais fácil entre oficiais do mesmo mester.
    Talvez até um dia pudéssemos ter gente a fixar-se em zonas que hoje são abandonadas e se vão degradando empobrecendo este país cada vez mais preso à região totalitária de Lisboa e Vale do Tejo que tudo suga como eucalipto em má hora plantado no reinado manuelino.

    • Tito Lívio Santos Mota says:

      o seu comentário faz-me lembrar um célebre diálogo entre Bernard Shaw e Isadora Duncan.

      Isadora Duncan : Mestre, já imaginou se tivéssemos um filho juntos? Teria a minha beleza e a sua inteligência…
      Bernard Shaw : Pois, mas imagine que fosse o contrário…

      Pelo que tenho visto em países regionalizados, tem sido mais o contrário do sonho da bela Isadora.

      Tito Livio

  6. kalidas says:

    Mas em tempo de crise ninguém reivindica, ninguém regionaliza, ninguém se lança à Plataforma Continental, ZEE ou Mar Territorial.É território nacional.
    .
    Atenção, aos números! São 1.720.560 Km quadrados, um milhão setecentos e vinte mil e quinhentos e sessenta quilómetros quadrados, ou seja 19 vezes a área terrestre nacional, que é de 92.000 quilómetros quadrados.
    .
    Dá Deus nozes a quem não tem dentes.
    .

  7. Alvaro Oliveira says:

    Sim, eu sou um dos “tais” regionalistas, mas é a primeira vez que comento aqui..! 😉
    Sou “tripeiro de gema” por nascimento e coração, “alto-minhoto galego” por opção… e… sou REGIONALISTA CONVICTO.
    Mas quando se “falou disso a sério” , no referendo de 1998, votei NÃO, só porque NENHUM dos intervenientes directos no processo foi CAPAZ de me explicar o que iria fazer com o meu voto… E, sem apresentarem qualquer alternativa, Marcelo e Portas lá levaram a deles avante…
    Mas creio ser capaz de imaginar como seria AGORA a luta de galos dos “demagogos de serviço”…!

  8. Meio Vazio says:

    “Por estranho que possa parecer”? Mas, Sr. Sá, o homem é apenas o melhor e mais lúcido escriba da imprensa portuguesa. Faz mais pela higiene deste país numa semana que a ASAE durante um ano.

  9. Caro Meio Vazio: o estranho é um regionalista como eu concordar com esse artigo. apenas e só. Nos restantes, leio-os sempre e de forma religiosa. Do melhor que se escreve na nossa imprensa.

  10. Meio Vazio says:

    Permita, então, que humildemente me retracte (com “c” se faz favor).
    Cumprimentos.

  11. hugo says:

    Com os politicos que temos ia dar tacho, mas ao menos podia ser que alguma região se safasse e metesse alguém com dois dedos de testa a mandar

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