O dilema de António Costa

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De politicamente acabado há uma semana, António Costa é agora quem baralha e dá. Cavaco bem pode correr a indigitar o afilhado mas sem o PS, a coligação PàF fica refém de um Parlamento hostil, restando-lhe ser cozinhada em lume brando até ao dia do seu “PEC IV”. Não deixa de ser absolutamente delicioso ver Passos Coelho na posição que já foi de Sócrates, ele que não perdia uma oportunidade de trazer o preso domiciliário para a campanha. Karma.

Ainda assim, António Costa e o PS encontram-se perante um dilema. Qualquer escolha acarretará riscos e um deles é efeito PASOK. No xadrez do Largo do Rato, afiam-se facas e as peças começam a movimentar-se. Sérgio Sousa Pinto demitiu-se, em protesto, da comissão política. Vera Jardim não vê diálogo possível à esquerda. Álvaro Beleza acha “muito estranho que o PS passe de inimigo para aliado do PCP e BE”. Há seguristas – sim, eles existem – a pressionar uma negociação com o PàF com vista a viabilizar o OE16 e até Carlos Silva, líder da UGT, afirma não acreditar que as forças à esquerda do PS garantam a estabilidade necessária. À revelia dos órgãos sociais da central sindical. Direita, volver.

Se Costa ceder a quem garantia, em campanha, inviabilizar qualquer proposta de Orçamento de Estado, verá a sua posição enfraquecida e será castigado pela ala esquerda do partido e por todos aqueles que votaram no PS à procura de uma alternativa de esquerda à austeridade radical. A consequência poderá ser um resultado ainda pior nas próximas Legislativas. Por outro lado, a cedência poderá ser maquilhada de demonstração de humildade e da vontade de colocar o suposto interesse nacional à frente dos interesses do partido, abrindo caminho para uma maioria absoluta, seja ela em 2017 ou 2019. Bastará a Costa esperar e conseguir manter-se na liderança do partido.

Porém, se conseguir a proeza de criar uma plataforma de entendimento com a CDU e o BE, Costa até poderá perder o eleitorado ao centro, se é que ele ainda existe, e abrir caminho para a recuperação das forças à direita, cuja poderosa máquina de propaganda saberá usar o sucedido para transformar o PàF na vítima da suposta radicalização da esquerda que atropelou o justo vencedor. Contudo, tal ousadia poderá reconciliar o PS com o eleitorado de esquerda que verá nesse entendimento um regresso às origens e à essência socialista que hoje parece existir apenas no papel. Fechado numa gaveta. Até porque, se o entendimento falhar e o PS acabar encostado ao PàF, o risco de pasokização dispara e o Bloco poderá ocupar o espaço à esquerda que o PS, cada vez menos, ainda ocupa. O tal filme que já vimos na Grécia.

Costa tem a faca e o queijo na mão. Por agora. Reforçado pela possibilidade de alianças com CDU e BE, o PS poderá subjugar a direita à sua vontade ou fazer história e dar ao país uma alternativa nunca dantes navegada. O primeiro caminho, mais fácil, conduzir-nos-á, muito provavelmente, a mais do mesmo. E o resultado da alternância em que temos vivido nos últimos 40 anos está à vista de todos. O segundo poderá permitir a Portugal ultrapassar o eterno e artificial trauma da impossibilidade de entendimentos à esquerda e fazer emergir um novo paradigma, uma nova forma de governar. Será que Costa tem estofo?

Foto: Natacha Cardoso@DN

Comments


  1. A inteligente estratégia de Costa faz colocar a direita de joelhos e mão estendida. Ao mesmo tempo obriga a esquerda à sua esquerda a moderar-se. Costa pode fazer história.

  2. joao lopes says:

    ao lêr o artigo do jose manuel fernandes no mirone a ofender gratuitamente o Costa ,fico com a ideia que a direita esta refem de canalhas,é dirigida por canalhas e o Costa pode aproveitar esta oportunidade para tornar Portugal…mais respiravel.


  3. Para se safar vale tudo.


  4. Trazer a esquerda a assumir responsabilidades governativas é um passo no sentido certo.
    Fazer um governo, em que os lírismos não tomem conta e que seja tido em conta, os mercados , a UE e os compromissos, não deixando a economia derrrapar é um desafio politico forte. Deus queira que os intervenientes , estejam a altura e não ponham a cegueira partidária acima dos interesses gerais do estado.

    • Nightwish says:

      Tendo em conta o que a economia derrapou todos os anos desde o Euro, incluindo nos últimos 5 líricos anos, não espere por mais do mesmo.

  5. José almeida says:

    Tal como vem sendo hábito nos últimos 40 anos, o PS sempre dominou o política nacional. No governo ou em aliança, ou por via do Presidente da República, sempre conduziu o pais. Quando via os comentadores pôs-eleitorais a vaticinar o beco sem saída do Costa, eis que surge a liderar a política nacional…. Uma vez mais o PS comanda. Poderá não durar mais de 2 anos, mas um governo de esquerda é a única saída que o PS tem. Vamos ver em que condições, mas à esquerda não é preciso muito para o PC e o Bloco viabilizar um governo à esquerda, basta que se minimize a pobreza o sentido de falência individual para que a recuperação seja um bem de todos e não de privilegiados. Não gostaria de ouvir durante um governo de esquerda que aumentaram os milionários em Portugal. O Passos quando questionado sobre o fenômeno o ano passado, encolheu os ombros e disse… ” que podemos fazer?”. Pelo menos que estes enxovalhos de um chefe de governo acabem. Um governo de esquerda abrangente nunca encolherá os ombros nestas situações. Subscrevo e desejo o fim deste governo, o resto pior não será!

    Bonito vai ser assistir no PS à separação dos melões das melancias….. espero que o parlamento não se parta.