Lettres de Paris #33

‘Antes eram os lugares e a Elisabete, agora é a Elisabete em Paris’

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escreveu-me hoje num email uma pessoa de quem muito gosto e, creio, faz o favor de gostar de mim também. A pessoa (que lerá este postal, também, mais tarde ou mais cedo, por isso peço-lhe já desculpa) acrescentou que talvez fosse inevitável. Confesso que fiquei a pensar naquilo o resto da tarde, depois de ler o email. Ia a pensar naquilo quando saí por uma hora do Ladyss, eram quatro da tarde, para ir ter com a Fabienne à livraria Compagnie, na Rue des Écoles. Achei graça a Fabienne ter sugerido aquela que, até ver, é a minha livraria favorita de Paris. Creio ter já falado nela nestas cartas. Na montra tem livros do Gonçalo M. Tavares, do Valter Hugo Mãe. Também já vi lá coisas do Saramago e do Fernando Pessoa. Estranhamente não vi ainda nenhum livro do António Lobo Antunes. Vi ontem ou antes de ontem, na montra já decorada para o natal um livro chamado Contos Portugueses, mas em francês. Não é por isso que a Compagnie é a minha livraria preferida, bem entendido, mas ajuda um bocadinho, confesso.
 

Estava ainda a pensar na frase que me escreveram, quando eu e a Fabienne saímos da Compagnie para o frio da rua, indecisas onde ir lanchar. De repente a Fabienne lembra-se de uma pastelaria por onde, às vezes, passo, numa das minhas variações do caminho de todos os dias. Uma pastelaria digna de filme, diga-se de passagem, com uma montra minúscula onde estão expostas, no entanto, todas as maravilhas da pastelaria francesa. Patisserie Viennoise de seu nome, na Rue de l’École de Médecine. Bebi um café e comi uma fatia daquilo a que eu chamaria bolo inglês, mas que deve aqui ter outra designação. A Fabienne comeu um bolo que lhe fazia lembrar a infância, disse ela. E ficámos sentadas numa mesa pequenina, ao fundo da estreita pastelaria, a conversar por cima do barulho que os outros clientes faziam. Gosto da Fabienne, está estabelecido, embora a conheça mal. Ficou combinado outro lanche para janeiro.
 
Esqueci-me por momentos da frase, enquanto lanchava e conversava com a minha colega. É muito loira e viva e fala um português correctissimo, embora com sotaque, o que só lhe acrescenta graça. Já o meu francês falado tem avançado pouco. Compreendo tudo o que oiço, tudo o que leio. Sou capaz de escrever alguma coisa, desde que não muito exigente. Mas falar é outra questão. Falo imensamente devagar em francês. Chego a aborrecer-me a mim mesma, com a minha lentidão. Não sei se chego a janeiro mais desenvolta na conversação, assim o espero. Claro que falar em português com a Fabienne não me ajuda muito. Quando regressei ao Ladyss, desabafei com a Aline que estava casualmente por lá que o meu francês não avança… ela simpaticamente respondeu que o meu francês era muitíssimo melhor que o seu português. Rimos-nos as duas, dado que o português dela é inexistente. Os colegas são simpáticos, já o disse de outras vezes. Nada arrogantes, nada desdenhosos, nada sobranceiros, como me avisaram que, eventualmente seriam. Talvez eu viesse preparada para isso e ache agora tudo bastante agradável. A Fabienne diz que sou eu. Não o disse hoje, disse-o outro dia quando almoçámos juntas no Fourmi Ailée. Que não é Paris que é simpático para mim, que sou eu que sou simpática para Paris. Bom, eu acho que é uma simpatia mútua e não se fala mais nisso.
 
E se calhar será por isso que não escrevo sobre Paris e eu, mas sobre mim em Paris. Pelo modo como me adaptei razoavelmente bem a tudo, como me incorporei nesta cidade, como tenho feito aqui a minha vida de todos os dias, trabalho, compras, jantar, cinema, museu, passeio… assumindo que sim, que por enquanto é esta a minha vida de todos os dias e não aquela para onde regressarei daqui a alguns (bastantes) dias. E, portanto, será inevitável, como estava escrito no email, que estas cartas sejam mais sobre mim em Paris. Sobre mim, a mesma de sempre, vivendo a vida de sempre, num cenário muito diferente do habitual. Um cenário que não me tem colocado qualquer obstáculo ou dificuldade. Um cenário que, está bem, não é apenas um décor

Comments

  1. Nascimento says:

    Harry Callahan. A sua musa? Eleonor. QUE REQUINTE.
    Que fotógrafo.As fotografias dele a ELEONOR e sua filha, são um hino á Arte Fotográfica. É SÓ “ESPIOLHAR” ESTE AUTOR.
    Só até 01 de Janeiro… Maison Européenne de la Photographie !
    Tem uma foto, simples mas tão Potente, com tanta Força: Eleonor dentro de água de perfil”,3/4 talvez. MAS,SEM UMA GOTINHA DE AGUA NA FACE, NOS CABELOS, E O REFLEXO??? MEU “DEUS”… ai, Espanha photo Madrid 2000 E QUE DIZER DE PAULO NOZOLINO? SARAEVO….

  2. tenho de ir à Maison Européenne de la Photographie, tenho 🙂

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