Dial C for Cristina

Um caso de James Marlowe, Chico Nelo para os inimigos.

O telefone tocou. Suspirei. Um caso, finalmente, o primeiro desde Fátima. Uma voz rouca, sensual, lenta perguntou-me se já tinha almoçado. Respondi, irritado:

– Mãe, já lhe disse que não me ligasse para o emprego!

A voz rouca, sensual insistia na necessidade de que me alimentasse convenientemente, acrescentando que eu não tinha propriamente emprego. Despedi-me o menos educadamente possível, tendo chegado a deitar a língua de fora ao bucal, de modo a que não se ouvisse.

Alguém mais atento poderia notar a inverosimilhança da ausência de um telemóvel, como se fosse possível um detective anacrónico usar objectos crónicos.

O telefone voltou a tocar:

– Mãe, outra vez?!

Claro que não era a minha mãe e não vale a pena insistirem no telemóvel que me permitiria saber quem me estava a ligar.

Do outro lado, estava uma voz tão inconfundível como a da minha mãe, ainda que menos sensual: era aquele que, doravante, por razões de segurança, passaremos a designar pelo nome de código “Presidente da República”.

– Estou a ligar-lhe confidencialmente para lhe pedir que, de modo discreto, me arranje o número de telefone do novo programa da senhora Cristina Ferreira, aquela da SIC. É para um amigo. [Read more…]

República das bananas…

Parolice, nacional-parvoíce, populismo, é difícil baixar mais o nível…

O Presidente da República é um parolo

O presidente da República de Portugal é um parolo.
Como titular do cargo, telefonar em directo para o novo programa de Cristina Ferreira para lhe dar os parabéns pela mudança de canal ultrapassa todos os limites.
Vamos assistir, nos próximos meses, a uma guerra sem quartel pelas audiências da manhã. Na TVI, Goucha entrevistou há uns dias um cadastrado que deseja o regresso de Salazar e hoje um cantor com cancro. Na SIC, logo no dia de estreia, Cristina Ferreira entrevista um cadastrado a jogar cartas e recebe a chamada do presidente da República.
Tudo bem. Vê quem quer e quem gosta do nojo. O chefe máximo do Estado português até pode ver e pode gostar, mas não tem o direito de vincular o seu cargo a um programa de televisão só porque gosta da apresentadora.

Ao ter atitudes parolas, próprias de um país de terceiro mundo, não pode vir depois queixar-se das consequências.

Presidente de todos os portugueses? Não, o meu presidente não estacionaria em lugar de deficientes nem telefonaria em directo para um programa sensacionalista.

Afinal, dá, a sensação de que ter votado em Marcelo Rebelo de Sousa ou no Tino de Rans vai dar exactamente ao mesmo. 

E não é verdade. Porque o Tino de Rans é simples mas não é parolo.

Por falar em Marcelo Rebelo de Sousa,

depois de interromper, acabar e recomeçar, que tal, finalmente e como prometido, (re)abrir?

Chinelos

À hora a que chegam os primeiros funcionários das lojas, e a rua desperta com o cacarejar metálico das grades corridas com a resignação brusca das segundas-feiras, o homem ainda dorme um sono profundo. A sua cama é ampla, ocupa quase metade de um passeio largo, e, pese a precariedade da instalação, está bem cuidada. Cartões grossos no fundo, dois cobertores finos por cima, um cobertor mais grosso e um edredão amarelo no topo.

O homem dorme, o rosto voltado para a rua, para quem passa. A seu lado, há um balde com duas garrafas de água e uns chinelos de quarto, muito finos, quase de papel, daqueles que os hospitais e hotéis por vezes oferecem. Os chinelos são de um branco impecável. E é a presença dos chinelos ao lado da cama, no chão, tal como a cama, que nos fazem sentir embaraçados por estar ali, como se tivéssemos entrado inadvertidamente em casa do vizinho – uma porta mal fechada, pensávamos estar no segundo e afinal estávamos no terceiro andar, uma distracção, enfim, e agora estamos aqui, frente à cama deste desconhecido que dorme de gorro na cabeça, alheio à nossa invasão. [Read more…]

De Bolsonaro a Xi Jinping

Tenho quase a certeza de que os que se indignam com a ida de Marcelo Rebelo de Sousa à tomada de posse de Bolsonaro e com o convite para ele visitar Portugal, serão os mesmos que encheram as ruas de indignação quando o ditador Xi Jinping cá esteve! De certezinha quase absolutinha…