Os orçamentos da regressão económica e social

Desde ontem a imprensa vem repetindo a notícia do encontro do Governo e do PSD, amanhã à tarde, com vista à negociação do acordo para viabilizar, no parlamento, o OGE para 2011. A delegação governamental é chefiada pelo Ministro do Estado e das Finanças, Teixeira dos Santos; a comitiva do PSD é dirigida por Eduardo Catroga, um auto-classificado de independente, que exerceu cargo idêntico ao do seu interlocutor principal nos tempos de Cavaco Silva, de quem é considerado politicamente muito próximo.

Qual será, afinal, o desfecho mais ou menos imediato do referido encontro? Em nosso entender, a aprovação, pura e simples, do OGE. E o acordo terá probabilidade de ser atingido já amanhã. Poderá acontecer que as procurações que habilitam os dois principais negociadores exijam, no derradeiro momento, o veredicto supremo dos líderes; mas, a ser assim, não é obstáculo de maior e facilmente será ultrapassado, em breves conversas por telemóvel.

Com cedências mútuas em matéria de receitas e despesas, creio que PS e PSD superarão tentações de tácticas dos interesses político-partidárias. Estão compelidos a obedecer às pressões internacionais, sobretudo da UE e do BCE, que podemos resumir em notícias do Financial Times reproduzidas pelo “i”, as quais focam ainda a probabilidade de Portugal, este ano, atingir um défice superior aos 7,3% do PIB previstos pelo governo.

Tudo isto traduz que Portugal, como outros países, há muito perderam o poder de decisão soberana em matéria de ‘contas públicas’ e de outras áreas. Nas políticas macroeconómicas em voga, é ponto assente que na Europa de hoje, e em particular nas economias mais frágeis da ‘zona euro’, há inteira submissão aos propósitos de Berlim e Paris, aos quais o próprio Trichet levanta reservas e que são denunciados, de forma objectiva e eloquente, por Ana Paula Fitas.     

É clamado até à exaustão, nomeadamente por economistas de prestígio, o funesto papel da banca e do sector financeiro na eclosão da crise com que Europa e EUA se debatem. Todavia, não deixa de ser curioso que essa mesma banca e os investidores – os poderosos manipuladores dos tais mercados – acabem por beneficiar com juros elevados cobrados a países em dificuldades. Contam com a conivência políticas de países do G-8, como o Reino Unido, por exemplo, que injectou avultadas somas de dinheiros públicos para salvar alguns bancos.

A revista britânica ‘The Economist’, em relação a Portugal, afirmava há dias que as medidas de austeridade conduzirão a uma recessão que, apenas, o nosso governo não quer ver. O risco de recessão entre nós é, efectivamente, elevado, mas a mesma “The Economist” menoriza os efeitos recessivos esperados no Reino Unido, em função das duras políticas da coligação conservadora-liberal no poder.. Para atingir uma redução do défice de 11% do PIB, o governo de David Cameron, entre outras deliberações, resolveu reduzir 500.000 de postos de trabalho na função pública, dos quais 350.000 são ocupados por mulheres.

Com estes princípios e estilos de governação, em Portugal, na Grécia, em Espanha, no Reino Unido e noutras paragens, hoje em dia orçamentar é provocar a regressão económica e social de países e cidadãos – não façam ondas porque os mercados podem ouvir e zangam-se.

Comments

  1. Ana Paula Fitas says:

    Obrigado pela referência, Carlos.
    É sempre uma honra ter um link feito por alguém que se respeita designadamente pela coragem lúcida e desassombrada com que se vai desmistificando a dinâmica política dos dias…
    Um grande abraço amigo.

  2. Ana Paula Fitas says:

    … e, claro!, Carlos!, fiz link 🙂
    Abraço.

  3. Carlos Fonseca says:

    Obrigado, Ana Paula.
    O abraço amigo habitual.

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