Dantes já era mesmo a sério, mas agora é que vai ser mesmo mais a sério

Desde que criou a crise, o governo define a sua atitude mais ou menos assim: “nós sempre fomos muito rigorosos e justos e planeámos tudo muito cuidadosamente, mas agora é que vamos ser ainda mais rigorosos e justos e vamos planear tudo ainda mais muito cuidadosamente.”

Foi graças a uma capacidade de planeamento que atravessa todo o aparelho governativo que a Saúde conseguiu gastar 21 milhões em consultoria, em 2009, para exclusivo benefício de três empresas privadas de consultoria e gestão. Os estudos encomendados a estas três empresas, contratadas sem passar por concurso público, serviram apenas para o habitual: lucros privados e prejuízos públicos.

O que vale é que o governo é, agora, ainda mais rigoroso do que já era e, por isso, decidiu obrigar todos os milionários que ganhem mais de 485 € por mês a pagar taxas moderadoras. Esses mesmos milionários serão agora obrigados a pagar o transporte de ambulância, sempre que o seu caso não seja urgente. Tendo em conta o humanismo que grassa pela governação, prevê-se uma realidade cheia de humor negro: enquanto os doentes tiverem consciência e um dente para se arrastarem até ao hospital mais próximo, não haverá urgência.

Outro exemplo ilustrativo da capacidade de planeamento dos nossos meninos de oiro está na alteração das regras que definem o que se considera horário nocturno de trabalho, o que irá obrigar as escolas a redefinir os horários dos professores de um período para o outro. Como cereja em cima do tolo, ficámos a saber que as escolas vão ter mais despesas e vão receber menos dinheiro, o que é coisa preciosa e enternecedora e lógica.

Às vezes, imagino que os dias do chamado núcleo duro do governo são passados no meio de um monte de papel de costaneira ensebado, com um Teixeira dos Santos suado e sem gravata, com a camisa aberta, vai fazendo contas com o lápis que, ocasionalmente, guarda na orelha. Vendo que o défice teima em não diminuir, alguém se lembrará: “Então e se agora obrigássemos todos os que ganham mais do que o ordenado mínimo a pagar o oxigénio que está em território nacional?”. Teixeira dos Santos sorrirá, enternecido com tanta capacidade de planeamento, e, rasgando mais um bocado de papel, assinará mais um despacho.

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  1. […] é a minha vez de secundar  o que o António Fernando Nabais disse aqui, a propósito dos gastos de 21 milhões de euros pelo Ministério da Saúde, via SUCH-Serviço de […]

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  3. […] devido às políticas deste governo, que se limita a prosseguir o trabalho iniciado por José Sócrates e continuadas entusiasticamente por um Passos Coelho que se orgulhou de ir além da […]

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