continuação daqui
«O primeiro golpe contra o primeiro governo de Soares vem, contudo, de onde Soares menos o espera. Vem de Belém e reveste a forma de um discurso». A três meses do seu primeiro aniversário, já o I Governo estava condenado. Ramalho Eanes, querendo evitar associar-se à impopularidade do governo que empossara, faria um curioso discurso na Assembleia da República demarcando-se por completo de Mário Soares. Este, atordoado mas convencido da sua intocabilidade, responderia de cócoras que «é certo — como notou o Presidente da República no seu discurso na Assembleia — que muitos dos ideais que floriram com a revolução de Abril e muitas promessas então feitas ao Povo, com certa dose de ingenuidade e muita demagogia, não puderam ser realizadas».
Mas quando os enfants-gatés são contrariados geralmente têm birras. A do primeiro-ministro foi a de responder ao Presidente da República com uma ameaça, tentando obter um acordo parlamentar com o PSD e Sá Carneiro. Soares sabia que Sá Carneiro não tinha confiança em Eanes tentando mesmo, em 1976, juntar forças com o PS para evitar a sua eleição. Assim, acena a Sá Carneiro com um acordo pontual e a promessa dos melhores esforços em relação às anteriores reivindicações, prometendo-lhe a entrada de PSD’s, camuflados de «independentes», no Governo. O primeiro-ministro estava convencido de que Sá Carneiro não era homem para durar muito à frente do seu partido e estaria, por isso mesmo, preparado para abdicar dos princípios de coerência que, desde os seus tempos de deputado pela ANP, demonstrara em relação às questões de Estado. O bluff de Soares não resultaria, contudo, e Sá Carneiro responderia que «ou o acordo é global ou não há acordo nenhum».
O primeiro-ministro, não sendo um adepto do xadrez, não compreenderia que estava em situação de «cheque-mate» e declararia existirem «razões de optimismo neste terceiro aniversário do 25 de Abril», estando mesmo convencido do analfabetismo político do Presidente da República, «no qual o Governo tem encontrado sempre um grande apoio e um grande estímulo». Com um tal raciocínio estava determinado a governar enquanto «não surgir na Assembleia [o que se afigura bem difícil] uma alternativa parlamentarmente exequível para o actual Governo».
Na madrugada de 7 para 8 de Dezembro cairia o I Governo.
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