Vocês não adoram quando o capitalismo selvagem e o autoritarismo assassino dão as mãos e saltitam juntos, pelo prado fora, por entre flores e borboletas? Não sei quanto a vós, mas eu fico sempre de coração cheio, quase a transbordar. O Salgado a servir de muleta para a Odebrecht subornar um ministro do Maduro é um romance à moda antiga, apesar do potencial para se transformar num threesome. E não façam de conta que não sabem o que é um threesome, ok?
Madeira, a ilha dos gerentes
Ontem à noite, a ilha da Madeira teve honras especiais no programa Heute Show, um imperdível programa satírico de elevado nível, da ZDF, o segundo canal de televisão pública alemã.
A Madeira veio à baila a propósito da “lei da transparência”, aprovada esta semana no Bundestag e destinada a “pôr fim à evasão fiscal”. Os proprietários de “empresas caixa-de-correio” em paraísos fiscais ficam agora obrigados à declaração das mesmas para a criação de um registo electrónico central. Registo central que, em vez de ser público, será apenas acessível a autoridades fiscais, bancos, jornalistas especializados na matéria, em casos específicos a organizações não governamentais e quando existir “interesse fundamentado”. [Read more…]
Os próximos Panama Papers estão aí e passam por Portugal
E, como não poderia deixar de ser, o Expresso já está em cima do acontecimento. Desconheço se Os truques já puseram algum contador a rolar (este já rola há quase 300 dias), mas, aparentemente, foram os primeiros a fazer soar o alarme cá no rectângulo. Lá fora o assunto já é tema desde Terça-feira. Pelo menos em Espanha, França e Alemanha.
Long story short: uma investigação internacional, que envolveu vários jornais e cadeias televisivas, descobriu aquilo que Portugal já sabia há anos. Que a Zona Franca da Madeira (ZFM) é um paraíso fiscal onde têm lugar situações pouco recomendáveis para pessoas sérias, dignas e dadas à transparência. A investigação fala de um esquema de evasão fiscal que se prolongou durante 19 anos, com milhares de empresas, muitas delas meras fachadas dedicadas à livre circulação de dinheiro vindo sabe-se lá de onde, a pagar impostos microscópicos. [Read more…]
Jacinto Leite Capelo (G)Rego
O indivíduo na foto chama-se Gikas Hardouvelis e, até à subida do Syriza ao poder, exercia funções de ministro das Finanças do anterior governo conservador liderado por Antonis Samaras, esse governo que tantas saudades deixou ao nosso bloco central, a tantos dos nossos liberais e a milhares mercenários financeiros por esse mundo fora.
Ora o indivíduo Hardouvelis está agora sob investigação por ter retirado do país cerca de 450 mil euros do entre Maio e Junho de 2012, altura em que exercia funções de conselheiro do primeiro-ministro, sem que o valor constasse na sua declaração de bens, algo a que estava obrigado por lei em função do cargo ocupado. Para levar a cabo a transferência destes 450 mil euros, Hardouvelis recorreu ao método Jacinto Leite Capelo Rego, efectuando um total de 56 transferências entre 5 de Maio de 2012 e 14 de Junho de 2012, cujos valores oscilaram entre os 7.700$ e os 9.800$, sempre abaixo dos 10 mil dólares, valor a partir do qual os mecanismos de alerta do Banco Central Grego faziam disparar os alarmes.
O Guerreiro e o “tio” Alexandre Soares dos Santos
O director do ‘Jornal de Negócios’, neste artigo, transformando em discurso colectivo aquilo que é opinião do próprio, escreveu:
Estamos saturados de manhosos, desconfiados de moralistas, estamos sem ídolos, sem heróis, estamos encandeados pelos faróis dos que saltam para o lado do bem para escapar à turba contra o mal.
Lido num ápice, sem cuidar de saber quem são os manhosos, desconfiados moralistas e dos ineptos de que Guerreiro fala, até seríamos levados ao automatimso de subscrever a mais comum das ideias expostas. Com atenção, verificamos, porém, que a guerra dele é contra Ana Gomes, António Capucho e outros que criticaram a transferência da sede da ‘holding’ Sociedade Francisco Manuel dos Santos (SFMS) para a Holanda, por interesses de ordem fiscal. E na elegia da patriótica e solidária atitude do “tio” Alexandre, o pedadógico Guerreiro argumenta:
Uma empresa tem lucro e paga IRC; depois distribui lucro pelos accionistas, que pagam IRC (se forem empresas) ou IRS (se forem particulares). Neste caso, a Jerónimo continua a pagar o mesmo IRC em Portugal (e na Polónia); o seu accionista de controlo, a “holding” da família Soares dos Santos, transferiu-se para a Holanda. Por ter mais de 10% da Jerónimo, essa “holding” não pagava cá imposto sobre os dividendos e continuará a não pagar lá. Já quando essa “holding” paga aos membros da família, cada um pagaria 25% de IRS cá – e pagará 25% lá. Com uma diferença: 10% são para a Holanda, 15% para Portugal.
Empresas sociopatas
Esta história da engenharia financeira usada como forma de fugir aos impostos afigura-se-me como qualquer coisa fundamentalmente injusta. Afinal, se os lucros são obtidos num determinado local, sob um conjunto de regras de negócio previamente estabelecidas, usufruindo dos recursos humanos e materiais desse local, apenas seria justo que esses impostos fossem pagos no sitio onde os lucros são gerados.
Outras contas da Madeira
Ouvi ontem na TSF o autor do livro Suite 605, João Pedro Martins, explicar muito bem explicadinho que o paraíso fiscal madeirense entra no PIB jardinista embora lá não deixe impostos, como é bom de ver. Desta forma a situação económica da Madeira é inflacionada, explicando-se assim porque é oficialmente a 2ª região mais rica de Portugal. Consequência: uma região com 30% da população a viver abaixo do limiar de pobreza ficou excluída dos fundos europeus, perdendo milhões todos os anos.
Tem toda a lógica: não paga a Europa, pagamos nós. Siga o bailinho.
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