Ainda não me manifestei sobre a presença do Papa em Portugal. Começo pela declaração de interesses habitual: balanço entre o ateísmo e o agnosticismo.
Posto isto, nada tenho contra a presença do Papa em Portugal. Contra a promiscuidade entre estado laico e igreja católica, sim, tenho, mas não é isso que motiva este texto.
Naturalmente que eu não esperava que o Papa viesse a Portugal defender o casamento dos padres, a união civil dos homossexuais, o aborto, a ordenação de mulheres. Penso que os católicos devem resolver os seus problemas internamente e posicionarem-se da forma que melhor entenderem face ao mundo actual e à sua fé ancestral que muitos acreditam eterna.
Também não esperava que prescindisse de uma teatralidade em que a igreja católica se especializou, de um mega-espectáculo cénico de afirmação de poder, de pompa e de soberba quase obsceno, nem de uma marcação absolutamente ensaiada no espaço físico e mediático.
Acontece que notei, pelas suas palavras, que este Papa tem um discurso radicalmente – aqui a palavra usa-se atendendo às inúmeras condicionantes existentes – diferente do do seu antecessor.
Este Papa diz coisas, “vê-se” que pensa coisas. Tem um discurso político – no sentido alargado do termo – mais estruturado e mais disposto à acção, mais apelando à transformação do mundo e à reflexão activa sobre os valores da igreja nos dias que correm. No mero plano da realidade objectiva – não me debruço sobre as interpretações religiosas – a igreja católica balança entre uma construção “filosófica” imutável e a necessidade de mudar e de acompanhar os tempos cativando fiéis sem perder identidade. Um exercício difícil, como se pressente. A igreja é simultaneamente beneficiária e refém da sua história, para o bem e para o mal, não pode transfigurar-se “democraticamente” renegando posições que ao longo de séculos afirmou perenes, sob pena de negar a sua matriz. Um Papa tem de escolher entre ser pouco mais do que um símbolo de um longo passado ou um funâmbulo, um equilibrista no arame que persegue o futuro sendo sempre obrigado a colocar os pés numa linha muito estreita.
Este Papa parece-me agora um funâmbulo que levou muito tempo a aquecer os músculos antes de entrar em cena.
Eu continuo a não esperar que venha a Portugal defender coisas muito diferentes do que a igreja católica tem defendido nos últimos séculos. Gostaria que defendesse o uso do preservativo – algo que pode fazer a diferença entre a vida e morte e que, por isso, suplanta questões do foro interno da igreja – gostaria que fosse mais interventivo nas matérias sociais e de exploração do homem pelo seu “irmão”, etc,, etc., mas penso que os católicos seguem, ou não, aquilo com que concordam ou discordam e estão no seu direito de aceitar ou recusar esta igreja.
Quanto a mim, vou estar atento a este Papa equilibrista. O desafio é difícil. Veremos se faz a travessia ou se acaba estatelado na pista.
Muito equilibrado, Pedro! Na realidade a grande questão quanto a mim é a Igreja, teimosamente, não se adaptar a este facto singelo:o Inferno é cá em baixo, é terreno, é aqui que tem que ajudar as pessoas, sem perder a sua identidade, mas trocar a inflexibilidade pela bondade é o grande desafio.
Quando da sua visita aos EUA Bxvi recebeu um presente original: um skate em tons de roxo com a cruz e o selo da Santa Sé e com a inscrição “Cristo Nossa Esperança” (a ideia partiu do Padre de NY Peter Pomposello que pratica skate).
Com skatemóvel é meio caminho andado para o equilíbrio
O inferno é mesmo aqui em baixo e … não é por causa das altas temperaturas