Surgem, em muitos media – e aqui também -, numerosos textos, sérios e interpelantes uns, grosseiros e ressabiados outros (Sinel de Cordes, a malta não te evita por seres um ousado provocador, mas porque, as mais das vezes, não tens piada).
Por mim, não vejo o problema nem tenho reservas em estar com todos os que são “Charlie” e não lhes vou, sequer, perguntar se conheciam o Charlie que dizem ser. Entendo que, sejam quais forem as opiniões que tenham sobre a revista, as pessoas sentiram o perigo da situação e o tiro no peito da liberdade. E é este ponto, penso eu, que leva a esta quase unanimidade na condenação inequívoca do atentado e na onda de solidariedade que se levantou.
É que o direito à liberdade de expressão não é dos jornalistas: é de todos nós. E como tal foi sentido. Muitos dos que mostram a sua solidariedade seriam alvos do Charlie Hebdo ou não escondiam a sua hostilidade ao hebdomadário? É verdade. E daí? Porque lhes querem vedar o direito de manifestar a sua indignação cívica? O Charlie Hebdo era (é!) uma revista iconoclasta, desbragada, ofensiva. Ela desafiava os limites da liberdade. E é exactamente isso que despertou as consciências. E isso é bom. Muito bom. E não nos surpreendamos por este caso ter ganho esta importância avassaladora. Sabemos bem que muitas outras vítimas houve, em dias recentes, em atentados terroristas igualmente sangrentos e cruéis. Porém, não podemos separar estas ocorrências das significações que lhes estão associadas.
As vítimas têm a mesma dignidade humana, mas o significado dos atentados é, inevitavelmente, valorizado de modo diverso, conforme o seu sentido e os perigos e desafios que fazem adivinhar no nosso futuro. Por isso, recuso a pretensão de julgar os que se indignam e a indagar das suas razões. Somos livres. E também os que morreram são mortos da nossa liberdade.
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