Ilhas de bruma

 

(adão cruz)

ILHAS DE BRUMA

Malas no cais
bom tempo no canal
o Pico envolto
num xaile de nuvens brancas.
O baleeiro espreita o boi do mar
a saudar a terra negra.
Vinhedos de currais
e o mar a beijar
as rugas da lava.
O sol esgueira-se
por chaminés e crateras de vulcões
a descansar em lagoas
de verde e azul.
Hortênsias abraçadas
às rocas de velha
e o mar
enlaçando os montes
em namoro eterno.
Impérios de crenças
erguidos ao mistério
Espírito Santo do medo
que passou
ou há-de vir.
Festas do bravo e da chamarrita.
Sabores a queijo
de vacas mansas
sopa de alcatra
massa sovada
e o arroz doce apetecido.
Vinho verdelho ou de cheiro
angélica e licor de amora
de terras do dragoeiro.
Furnas e fumarolas
borbulham para o ar
raiva da terra
por não ser mar.
Malas no cais
embarque e desembarque
num vaivém de espuma
nostalgia das ilhas de bruma.

EVA CRUZ
Viagem aos Açores – Agosto 2005

"Dá-me o telemóvel já" em HD

Recebi com agrado a notícia de que haverá videovigilância em mais de mil escolas do país. Dizem que não serão instaladas dentro das salas de aula mas, ainda assim, tenho esperança de ver casos estilo ‘dá-me o telemóvel já’ com muito melhor qualidade de imagem.

Aquelas que disponibilizaram, na altura, eram uma miséria.

A face oculta da justiça

A escolha do título ‘face oculta’ é, de facto, um rasgo de rara sagacidade; diria mesmo um pensamento inspirado por iluminação divina. Com dois nomes apenas, aplicados ao complexo processo das sucatas, gravou-se de forma sintética e inextinguível a classificação genérica de tudo o que é trabalho de investigação do Ministério Público, quando há a presunção de envolvimento de políticos e gente ‘VIP’ do país. O autor do título mereceria um ‘Óscar’.  

Com efeito, nos casos em que pontificam suas excelências, a justiça portuguesa tem sempre uma face oculta. Por mais que o PGR e outros responsáveis do MP se desdobrem em declarações e entrevistas, o cerne e desfecho do processo terminam inevitavelmente na ocultação da única face que os cidadãos têm direito de conhecer, a verdade.

Hoje, segundo o anunciado por ‘PUBLICO’ e TVI, foram constituídos mais três arguidos, todos ligados à REN. Com este episódio, juntam-se no processo mais de 20 arguidos. Do grupo, lembre-se, fazem parte os políticos Armando Vara e José Penedos, o filho deste último e o sucateiro, Manuel Godinho. Este foi o único detido preventivamente.

O amontoar de arguidos e da complexidade processual, além das controvérsias no seio do MP, a que se juntam mediáticos sindicalistas, descamba na consabida morosidade e ineficácia das investigações. E no fim sucederá o trivial: a montanha parirá um rato – os gatos, ou melhor os tigres, esses ficarão protegidos e tratados com pitança de luxo, porque há que preservá-los do risco de extinção da espécie. Curiosamente, acho que deveria ser exterminada, mas, se calhar, é uma ideia politicamente incorrecta.

Umas últimas perguntas: que é feito do processo do BPN, de Oliveira e Costa, de Dias Loureiro e dos restantes envolvidos? E do caso BPP e de João Rendeiro e outros? Mesmo com a utilização de cerca 6.000 M de euros de dinheiros públicos, ouço uma voz remota mas firme a sentenciar: “Caluda!”.   

gracinha

minha maria da graça

As Três Graças, de Carle Van Loo (1763)

….para Graça Pimentel Lemos…

Todos sabemos que existe, na mitologia grega, três deusas chamadas Graças.

As Graças (Cárites na Mitologia Grega) são as deusas da dança, dos modos e da graça do amor, são seguidoras de Vênus e dançarinas do Olimpo.

Apesar de pouco relevantes na mitologia greco-romana, a partir do Renascimento as Graças se tornaram símbolo da idílica harmonia do mundo clássico.

Graças, nome latino das Cárites gregas, eram as deusas da fertilidade, do encantamento, da beleza e da amizade. Ao que parece seu culto se iniciou na Beócia, onde eram consideradas deusas da vegetação. O nome de cada uma delas varia nas diferentes lendas. Na Ilíada de Homero aparece uma só Cárite, esposa do deus Hefesto.

Este meu saber sobre os mitos gregos, adquirido aos sete anos de idade, estava baseado nos originais em língua inglesa, nos escritos de Homero, citado antes, e em Flávio Josefo.

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José Sócrates, Vital Moreira, os Abrantes e os benefícios fiscais

Li a última crónica de Vital Moreira – oh meu Deus, esse professor doutor de Coimbra! – e não posso dizer que tenha ficado espantado. Como sempre, a defesa da política socialista de ataque à classe média, desta vez partindo dos cortes dos benefícios fiscais no Orçamento de Estado para 2011.
Mas eis que me lembrei de um célebre debate entre José Sócrates e Francisco Louçã na campanha para as últimas Legislativas. Vejamos o que pensava então o primeiro-ministro sobre o assunto:

Claro que o primeiro-ministro tem todo o direito de mudar de ideias. Vital Moreira também tem. E os Abrantes (versão 2009 e 2010) também têm. Mas por favor não nos façam de parvos.

Então é assim:

José Socrates em 2009: «Estas pessoas que fazem as suas deduções fiscais na Educação, na Saúde e nos PPR não são ricas, é a classe média. Isto conduziria a um aumento fiscal brutal para a classe média, mais de mil milhões de euros.»

Vital Moreira em 2010: «As deduções fiscais no imposto sobre o rendimento redundam quase sempre num privilégio dos titulares de mais altos rendimentos, que são quem mais pode aproveitar delas. Isso é assim especialmente quando as deduções não têm “tecto”, sendo uma percentagem das despesas efectuadas, como sucede com os encargos com saúde. Mas ainda é assim quando existe um limite, como é o caso dos encargos com educação e com os relacionadas com imóveis».

Os Abrantes em 2010: «Como as necessidades de saúde não são directamente proporcionais à riqueza, (são até os mais pobres que têm mais necessidade) este sistema produz um duplo efeito regressivo: beneficia desproporcionadamente os mais ricos, e custando dinheiro ao Estado (dinheiro público que se não cobrou) acaba por ser pago pelos restantes impostos que recaem sobre toda a população, sobretudo os indirectos, como o IVA.»