Arroz de PIB romeno

Dizem os oráculos – e eu não me atrevo a duvidar – que Portugal será ultrapassado pela Roménia em PIB per capita, lá para 2024. E que isso é a prova provada de que a Roménia é “melhor” que Portugal. Culpa do “socialismo”, claro está. Para quem governou pouco mais de um ano, Vasco Gonçalves mete Passos Coelho num bolso, no campeonato da culpa eterna.

Azar dos romenos, ainda não é possível fazer arroz de PIB. Mais ainda do per capita, uma medida enganadora que, não raras vezes, esconde um gigantesco fosso de desigualdade entre uma minoria super-rica e uma povo miserável. Felizmente temos a matemática, que trata de juntar tudo e dividir pelas capitas todas, aumentando o rendimento de cada um. O que seria estupendo, se correspondesse à realidade.

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A Roménia aqui tão perto: Rosia Montana no Alentejo?

Há mais de 20 anos que o povo da pequena aldeia de Rosia Montana, na Roménia, luta contra a instalação de uma mina de ouro que iria destruir a sua aldeia, expulsando os seus habitantes e arrasando as suas casas. Essa luta corajosa passou também pela Justiça, conseguindo que um tribunal romeno tenha dado razão à população e ordenado a interrupção do projecto de exploração mineira.

Mas isso não fez desistir o maior financiador do projecto, a empresa canadense Gabriel Resources, de o levar adiante, accionando a justiça paralela exclusiva para multinacionais estrangeiras, o famigerado ISDS (Investor-State Dispute Settlement). A sua exigência: cobrar à Roménia 5,7 mil milhões de dólares como compensação por perda de lucros reais e futuros. Uma quantia tão elevada como o gasto do Governo romeno com a Educação.

Pode este caso parecer longínquo, sem relevância para Portugal. Mas não é. Ora vejamos: [Read more…]

Corruptos no poder rendem-se

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Foto: DPA

Por força dos protestos de centenas de milhares de manifestantes nas ruas, dia após dia, o primeiro-ministro romeno, Sorin Grindeanu anunciou hoje que o Governo vai revogar o decreto pró-corrupção que tinha aprovado no início da semana. “Ouvimos a voz da rua” declarou Grindeanu, “Não queremos dividir a Roménia”.

“The people don´t know their true power” – lembra-nos o cartaz de uma manifestante.

Corruptos no poder

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Foto: Reuters

É o quarto dia consecutivo em que dezenas de milhares de romenos protestam contra a tentativa do governo social-democrata de, com a absurda justificação de que as prisões estão superlotadas, legalizar a corrupção e amnistiar políticos e outros corruptos já condenados ou sob acusação – como o presidente do partido social-democrata, Liviu Dragnea, acusado de abuso de poder e condenado por fraude eleitoral.

Bravo! Bravíssimo! Gente na rua, ao frio, em 50 cidades, a exigir justiça. Um sopro de alento, nestes dias tão favoráveis ao autoritarismo e à corrupção.

Infiltrados, invasões e propaganda

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No inicio deste mês, o irresponsável e patético mordomo-fantoche Barroso fez correr um boato que dava conta de uma conversa telefónica tida com Vladimir Putin, na qual o presidente russo teria referido, em tom de ameaça, que poderia tomar Kiev em duas semanas. O boato do cherne deu imediatamente origem a manifestações de reprovação por parte dos moralistas ocidentais que também gostam de invadir estados soberanos e os seus soldadinhos de chumbo na comunicação social fizeram o resto do trabalho. De um momento para o outro, Putin preparava-se para tomar Kiev em duas semanas. Era dado adquirido.

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Nova Geografia da Europa

romenia-europaPara o jornal i, a Roménia não é na Europa nem os romenos são europeus.
Por exclusão de partes, ou são asiáticos ou africanos. Ou americanos?

 

Postcards from Romania (13)

Elisabete Figueiredo

O comboio para Sighisoara

Nunca vi um comboio tão velho, tão ferrugento, tão sujo. Sento-me e imediatamente a minha pele se entranha no cheiro a ferrugem. Ao meu lado uma família. À minha frente senta-se uma senhora. Ponho a mala na grade. Que grade, senhores! Juro que nunca vi nada assim. Entrei noutro filme do equivalente romeno do Kusturica e desta vez, desta vez, é a sério. Mil olhos. Quem dera, para guardar tudo. Para ver tudo, para experimentar tudo aquilo.

Peço à senhora da frente se me olha pelo saco em cima do banco. Vou à plataforma fumar um cigarro. Diz que sim, com a cabeça. A viagem, diz-se, demora 3 horas. É proibido fumar no comboio. Depressa me darei conta que, também isto, não faz qualquer sentido.

Ao fumar penso que raio, por que raio não vou no rápido uma hora mais tarde. Digo de mim para mim por que raio não hei-de ir neste. Sabe-se lá se voltarei a andar num comboio assim, Foram precisos 45 anos para andar num comboio assim. Reentro. Abro a janela. Sento-me.

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Postcards from Romania (12)

Elisabete Figueiredo

Ainda em Brasov, a caminho de Sighisoara, este postal é para o José Guimarães

Faz-me falta o meu amigo, quando me sento nas esplanadas a ver passar as pessoas. As romenas são giras, Zé. Mas teríamos material de análise para os próximos 25 anos, te asseguro.

Teria mil postais hoje. Mil. Tal como tenho, às vezes, mil olhos, sendo certo que nunca serão suficientes.

Do centro vou para a estação dos caminhos-de-ferro. Compro o bilhete para o próximo comboio, bem vejo que é regional, mas ainda assim compro o bilhete. Espero meia hora na estação. Está cheia de ciganos (politicamente correto seria dizer ‘roma people’). Homens, mulheres, crianças. Os putos, especialmente os rapazes, assumem um ar muito másculo, nas suas camisolinhas de alças. Alguns escarram para o chão. Outros carregam sacos e saquinhos, empurram carrinhos. Como os pais.

Os ciganos representam cerca de 2% da população romena. A algazarra de sacos é imensa. Compreende-se, muitos, quase todos, serão nómadas ou perto disso, andam com a casa atrás. Nada a dizer. Se eu tivesse que carregar a minha casa às costas para trás e para diante, o que faria? De repente, ao pensar nisto lembro-me do Moonlight Kingdom, do Wes Anderson, que vi em Lisboa, agora. A rapariga quando foge de casa leva uma mala. Como é uma miúda bem arranjada, de sombra colorida nos olhos, espera-se que a mala contenha roupa. Um dia ela abre-a. A mala está cheia de livros. Para mim, é a cena mais bonita do filme. [Read more…]

Postcards from Romania (8)

Elisabete Figueiredo

Brasov, subindo o monte Tampa

Tenho vertigens. Muitas. Ao ponto de as cidades e os campos se porem a rodar quando me atrevo, o que é quase sempre, a subir muito alto. Uma vez subi num teleférico de esqui mais de 2000 metros. Foi em Salzburgo e posso jurar que as montanhas estavam vivas e rodopiavam… sim, uma alusão fácil ao filme ‘Música no Coração’. Whatever.

Apesar das vertigens, resolvo subir o monte Tampa de teleférico. 1000 metros ‘apenas’. O teleférico é pequeno, não caberão mais de 10 pessoas. Vamos 10 exatamente.  Começa a subir e é quase a pique que a traquitana vai.

Penso na balança que vi no dia anterior no castelo de Bran. Uma balança para pesar almas. Parece que as almas dos aprendizes de satanás, podia ler-se, são mais leves que as das outras pessoas. É curioso. Se alguma vez tivesse pensado nisto, diria que era justamente o contrário. E começo a desejar que sejamos todos aprendizes de satanás, dentro do teleférico, just in case.

Lá em cima, a vista compensa os maus pensamentos. Evito chegar-me à beira dos varandins. Gosto de sítios altos porque tudo, cá de cima, parece um mapa. Quer dizer, acho eu que é por isto. Que outra razão poderia haver para me sujeitar a tal suplício?

O teleférico conduz-nos a um bosque, caminho uns bons 20 minutos até chegar às traseiras das letras gigantes:

B R A S O V

que se veem de toda a cidade.

(Brasov, 9 de Agosto de 2012)

Postcards from Romania (1)

Elisabete Figueiredo

  A importância de falar italiano menos mal

Depois de muitas horas cheguei ao meu destino. Brasov à noite parece bonito. Ainda bem que falo italiano menos mal.

La revedere.

(Bucareste, 7 de Agosto de 2012)

1989: os romenos tomam o seu destino nas mãos

Faz hoje 20 anos que o povo romeno invadia as ruas de Timisoara. O fim do déspota Ceausescu estava próximo. Ceausescu, o amigo de alguns aparentemente insuspeitos políticos portugueses como Mário Soares, ia ter um merecido Natal.