Nullius in verba

[Diogo Hoffbauer]

Quando o tema é a COVID, há uma pergunta inevitável. O tom e o propósito variam, mas a pergunta é fatal. Ora surge condescendente e grosseira, ora desesperada e confusa e – menos frequente – pode assumir contornos genuínos de curiosidade.

“Mas então o mundo está enganado?”

Depende do que entendes por mundo. Se te referes ao povo, à plebe, às massas, sim, a maioria estará enganada – ainda que não todos – porque longe das lentes necrófagas da comunicação social, entre censuras organizadas e ataques incessantes de milícias de idiotas úteis amedrontados, ainda há quem esteja a lutar muito para que o pesadelo não se materialize. Se por mundo entendes governos, aristocracias, corporações e elites financeiras, não estás minimamente enganado. Pelo contrário: tudo corre de acordo com o mais meticuloso dos planos. 

 Para os mais distraídos, a elite política e financeira mundial reúne-se todos os anos para discutir como é que nós, populaça, havemos de viver a nossa vida. Essas reuniões chamam-se Fóruns Davos e são organizadas pelo World Economic Forum. Essa fidalguia velhaca anunciou que tem um plano para acabar com o capitalismo como o conhecemos. Baptizaram este processo com o pomposo nome de Great Reset. O seu lema é “In 2030, you’ll own nothing. And you’ll be happy”. É verídico: eles dizem-nos que não teremos nada. O sonho molhado dos comunistas e restantes veneradores da miséria. O propósito, claro está, não é acabar com a propriedade privada. Eles, claro, continuarão a ter o que quiserem. O lema não é “We’ll own nothing”, porque eles – naturalmente – não se incluem. E orgulham-se disso. Até puseram um macho beta a sorrir para percebermos o quão felizes seremos…sem nada.

Sei o que dizem do Great Reset, e sei porque o dizem. Uma teoria da conspiração, disseminada por negacionistas de extrema-direita, que difundem desinformação por esses redes afora, e que representam a maior ameaça que as democracias ocidentais alguma vez tiveram de enfrentar. Já ouvimos esta cantilena até à extenuação. Ninguém se dá ao trabalho de definir nenhum dos conceitos utilizados nesta análise. Já nem sabem do que falam. Como o jogo de telefone estragado, as pessoas que o repetem agora nem sabem o que dizem, vomitam as palavras, desconhecem a literatura, ignoram a realidade. Quem nada percebe do assunto, assume que o especialista na televisão fala a verdade: a Internet está cheia de notícias falsas espalhadas por um lado do espectro político – e só por esse lado – um lado fascista, monstruoso, cruel, sádico, repulsivo, e se acreditares nalguma dessas histórias é porque pertences a esse lado do espectro. As pessoas comem isto; e, mesmo as que reconhecem o truque, não se aventuram, com medo de serem rotulados, e optam pelo recato. Honestamente, se mais alguém me vier pregar acerca das fake news da extrema-direita, enquanto consome acriticamente a média mainstream, nem sequer vou prestar atenção ao que me disserem. Não é por arrogância: estamos, simplesmente, a falar de alguém que, simplesmente, não sabe quando lhe estão a mentir – como tal, pouco teremos a aprender com as suas considerações epistemológicas sobre a verdade.  [Read more…]

Davos – bailando com os vampiros

Lá começou hoje pela 50-ésima vez o Fórum Económico Mundial em Davos – o “Baile dos Vampiros” como o sociólogo suíço Jean Ziegler o denomina – onde os CEOs das multinacionais e gigantes “abutres”, como a operadora de activos e gestão de riscos Blackrock, se encontram com os políticos dos governos pressurosos em abrirem as portas a negócios chorudos. Isabel dos Santos, afinal, não vai lá estar, mas não faltará gente que conhece bem e aplica, sempre que possível, idênticos estratagemas.

Há quem defenda que, especialmente numa época em que o multilateralismo está periclitante, o Fórum é importante para juntar actores que não têm outra ocasião de trocar ideias; acrescenta-se ainda, que o Fórum se abriu à sociedade civil, pertencendo, este ano, um terço dos 3.000 participantes a organizações como a Oxfam e Greenpeace. O lema deste ano: Responsabilidade e Sustentabilidade. [Read more…]

Taxes, taxes, taxes

A hipocrisia de Davos e a importância de taxar as grandes fortunas

E agora vou ali arder no fogo do Inferno liberal e já venho.

Tchim-tchim ao ISDS

Esta semana, as multinacionais que se prezam tiraram um tempinho para ir jantar e conversar com uns quantos líderes mundiais – e outros que não são, mas estão desejosos por “aproveitar todas as oportunidades” para venderem o que têm (adivinhem quem) – ao Fórum Económico Mundial em Davos. Entre elas, a Chevron, que processou o Equador para evitar responsabilizar-se pela grave contaminação que provocou na Amazônia e que mantém a recusa de indemnizar as vítimas. A Cargill, que processou o México depois de o governo ter implementado um imposto sobre o açúcar, para fazer frente ao problema da obesidade no país. A Dow Chemical, que processou o Canadá por proibir pesticidas nocivos – e dezenas de outras.

Hoje, activistas da campanha “Direitos para as Pessoas, Regras para as Multinacionais” estiveram à porta da festa em Davos. Foram em fato de lobo e denunciaram o facto de mais de 40 multinacionais participantes do Fórum Económico Mundial terem usado o ISDS (mecanismo de resolução de litígios Investidor-Estado) para processar governos e extorquir elevadíssimas quantias aos contribuintes. Algumas dessas mesmas multinacionais violaram os direitos humanos; mas as pessoas e o planeta não têm “dentes” para se defenderem.

A campanha europeia exige que a UE e os Estados-Membros implementem um sistema global duro, capaz de punir as multinacionais pelos seus crimes, e o fim do ISDS, a justiça exclusiva para multinacionais processarem estados. Pode ver como foi aqui.

 

Por uma Justiça igual para todos

Começa hoje o Fórum Económico Mundial, realizado anualmente em Davos, nas montanhas suíças.

Neste “baile”, os gigantes económicos mundiais, a elite da globalização, dão-se ao trabalho de fingir que têm nobres preocupações. O presidente executivo e fundador do fórum, Klaus Schwab, afirma assim que: Há pelo menos duas décadas que o Fórum de Davos alerta para que “o excesso de globalização” levaria a uma “situação de desequilíbrio e desigualdade” a qual “não era sustentável sem responsabilidade social.

Obrigadinha pelo aviso, dá imenso efeito olhar ao que se diz e não ao que se faz.

Para o agravamento das desigualdades e dos danos ambientais, esta globalização promovida a todo o gás pela União Europeia tem dado um contributo inestimável.

Lá fora, cercados de polícia, estarão em Davos activistas que protestam contra esta viagem global descarrilada.

E não só em Davos. De Davos a Den Haag e de Berlim a Bucareste muitos milhares de cidadãos europeus exigem o fim do sistema de justiça paralelo e secreto, o ISDS, que tão bem serve a actual forma da globalização, para atacar legislação que protege as pessoas e o planeta.

A petição que hoje é lançada apela também ao estabelecimento de um Tratado Vinculativo das Nações Unidas sobre multinacionais e direitos humanos, que permita responsabilizar as empresas pelos abusos e danos que provoquem em qualquer parte do mundo e acabar com a sua impunidade.

Assine e divulgue hoje mesmo, aqui ou aqui.

Fórum Económico Mundial – O Baile dos Vampiros

Foto: AFP

Terminou anteontem um dos rituais mais escancaradamente denunciadores desta “ordem mundial canibalista” – como classifica os nossos tempos o sociólogo Jean Ziegler, que também é o autor da acertadíssima denominação “Baile dos Vampiros” aplicada ao Fórum Económico Mundial, realizado anualmente em Davos, nas montanhas suíças.

Neste baile, os gigantes económicos mundiais, a elite da globalização, dá-se ao trabalho de fingir que tem nobres preocupações para além das evidentes e comezinhas de manter os dentes afiados para garantir os lucros próprios e continuar a sugar e a crescer. O manto desta suposta nobreza oferece aos seus lacaios políticos um pretexto para lhes irem comer à mão desavergonhadamente e venderem por bagatelas cada vez mais ínfimas o sangue dos países e povos que fingem servir, enquanto os colossais dráculas lhes ditam – e eles apontam no caderno – os trabalhinhos de casa para a disciplina de desregulação. [Read more…]

É mesmo para acabar.

“Com a retirada de Obama e a entrada em cena do Luís XIV da Quinta Avenida, o mundo entra noutra fase. Podemos chamar-lhe incerteza mas incerteza é o que menos existe” – Clara Ferreira Alves, Expresso, 21 de Janeiro de 2017.

Quando acabei de ler o artigo desta semana de Clara Ferreira Alves na revista do Expresso fiquei a pensar que nunca como nos últimos tempos concordei tanto com aquilo que ela escreve. Sempre gostei de ler os seus artigos e ainda mais quando discordo das suas opiniões. Mas este seu texto, com o título “É para Acabar”, é do melhor que tenho lido nos últimos anos. Está ali tudo, devidamente retratado e colocado no seu real contexto:

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A maior prova, se tal seria necessário, foram os resultados das eleições nos Estados Unidos. A imprensa a fazer campanha contra Trump e o resultado foi ao contrário. O mesmo se diga no que toca ao Brexit. Retomando o texto de Clara Ferreira Alves:

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Estou plenamente convencido que assim será. Um a um, eleição a eleição os “Trump” mais ou menos letrados por esse mundo fora, a começar pelas próximas eleições em França, vão vencer com o voto popular. Porque o povo está farto. Completamente farto e prefere o “quanto pior, melhor”. As elites merecem que assim seja, para desgraça de todos. Voltando ao artigo de Clara Ferreira Alves:

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Subscrevo tudo isto que a Clara Ferreira Alves escreveu. Para mal dos nossos pecados, estou convencido que assim será. É mesmo para acabar…

O estado de graça possível

Trump continua a falar e escrever como um troll alcoolizado. As consequências só não foram ainda trágicas porque os líderes e governos visados o vêem como um inimputável. É o estado de graça possível. Do governo alemão veio uma bofetada em modo de aviso, de Putin um cordial cachação, da China e do seu presidente veio – com aquela paciência de um povo que conta a sua história em milénios…- um elegantíssimo e rendilhado discurso que disse tudo o que havia a dizer nunca mencionando o nome do grunho, para espanto do público do Fórum de Davos.
And the beat goes on...

Trabalho de campo

No esplêndido Steigenberger Grandhotel Belvédère – centro espiritual do Fórum Económico Mundial (FEM) desde que, em 1971, Klaus Schwab decidiu criar este encontro em Davos, a mais alta cidade da Europa – alojam-se, a cada ano, alguns dos mais eminentes participantes do FEM.

Este ano, discutem aquelas que são as grandes preocupações da alta finança e das elites políticas: as alterações climáticas e o aumento da desigualdade de rendimentos e de património. [Read more…]

DESIGUALDADE AO MÁXIMO

davosFoto: AFP

A partir de hoje e nos próximos dois dias há 6.000 polícias e soldados posicionados para proteger as cerca de 3.000 eminências da esfera da economia, política e ciências que participam no Fórum Económico Mundial em Davos, com o fim de discutirem e supostamente encontrarem respostas para as grandes questões da actualidade mundial. Na verdade, as respostas que às eminências interessa encontrar é como produzirem melhor mais capital para os membros do clube dos ricos. Se assim não fosse, debruçar-se-iam sobre o resultado do estudo que a ONG britânica Oxfam divulgou há dois dias: 1% da população mundial possui mais do que os restantes 99% e apenas 62 pessoas possuem tanto capital quanto a metade mais pobre da população mundial. O estudo visa alertar os participantes do FEM para a necessidade de pôr fim “à era dos paraísos fiscais que alimentam as desigualdades mundiais e impedem centenas de milhões de pessoas de sair da pobreza”. [Read more…]

Davos serve-se fria e o Magreb a ferver

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Davos, estância de neve suíça, é outra vez cenário do Fórum Económico Mundial. O acesso de contestatários às proximidades do local é interdito. Um militar de arma alçada é a força dissuasora. Há que proteger banqueiros, empresários e políticos. O ambiente de serena reflexão é imprescindível. Permite a crueldade da continuidade e, de resto, Davos serve-se fria.

Os homens das finanças e dos negócios, em Davos, não dispensam a  participação de políticos. Além de outros, compareceram Merkel, a proprietária do euro, Sarkozy, o presidente mais cabotino da história republicana francesa, e Cameron, um PM britânico gentil e sorridente, ainda que longínquo da capacidade de Blair, no número de sorrisos por segundo. De realçar que Merkel, Sarkozy e Cameron comungam de ideais do neoliberalismo e do nefasto modelo de globalização que arrasa a vida a milhões de seres humanos.  Porém, existe outro fenómeno comum entre eles,  o desemprego; Alemanha, França e Grã-Bretanha orbitam à volta de idêntico número de desempregados:  4.000.000 em cada país. Ainda agora, Sarkozy viu agravar-se a taxa do desemprego. É a Europa no fulgor da desgraça. [Read more…]