Diz o senhor Mário Crespo que foi Bob Woodward que o disse. Percebo e concordo perfeitamente. Muito se fala duma campanha negra criada por alguém, com a ajuda de jornalistas, que tentam criar falsas notícias motivadas por interesses ocultos, para prejudicar eu sei quem, em telejornais travestidos. Como se eu não soubesse que o jornalismo já não existe. Como se eu não soubesse que os jornalistas têm de responder perante responsáveis editoriais que respondem perante administrações que respondem perante os seus donos, os patrocinadores. Obrigado pela dica, senhor Mário, mas eu já sabia disso. “Há demasiada publicidade em Portugal”, diz ele. Pois é. Eu percebo!
Por curiosidade, decidi ver com mais atenção um espaço de publicidade. Espaço publicitário no intervalo do Jornal da Noite da TVI:
– Banco Totta: um belo musical cantante e dançante ao som de “I need a zero!”. Brilhante. E estes gajos continuam a dar-nos música. Vê-se logo que são estes banqueiros com anúncio bacocos que mandam nisto. Próximo.
– Sociedade Ponto Verde: Umas latinhas a falarem com outras, que querem ser novas coisas depois de recicladas. A normal hipocrisia do “novos negócios verdes”. Tudo pelo ambiente, digo eu. Matéria-prima à borla, é o que eles pensam. Mas pelo menos dão cabo do imenso lixo que faço. Próximo.
– Bellady Wella: um colorante para cabelo que promete 6 semanas de brilho intenso. Juro que não entendo esta “trip” com os cabelos soltos e sedosos e 86% de recomendações de pessoas especializadas em cabelos, e fibra de carbono e pérolas de juguarassi e mais não sei o quê, só para lavar e pintar a porcaria do cabelo. Não entendo. Eu pensava que o que contava era a parte de dentro da cabeça. Pelos vistos não. Próximo.
– Mazda 6: mais um carro amigo do ambiente só porque tem 185cv e é a diesel! Toda a gente sabe que “a diesel” é muito mais amigo do ambiente. Aliás, neste momento, nada ajuda mais o ambiente e o mundo em geral do que comprar um carro! É o que vem em todos os anúncios. E ainda se gabam: “não é para todos!”. Para mim não é de certeza.
– Seguro Directo: um polícia manda encostar um condutor e em vez de pedir os documentos, quer multar o condutor porque ele tem o seguro caro. Bem, se calhar é o que vai mesmo acontecer daqui a uns cinco anos, bastando ao polícia apontar um aparelhómetro qualquer ao chip da matrícula. Assim, até os polícias podem ter mais uma comissão de venda de seguros, a juntar à das multas. Eles merecem.
– Intermarché: os frescos do Intermarché são os melhores, os mais baratos e os preferidos dos portugueses. É o que diz o TNS World Panel. Porque raios, hoje em dia, todas as empresas são as preferidas dos portugueses? E porque é que há sempre um estudo qualquer para o provar? Existirá, de facto, alguma coisa que não se venda suportada por um estudo qualquer?
– Peugeot 207: “Quer ajudar o ambiente? Então troque de carro!”. Não, não é uma piada. É mesmo o anúncio do novo Peugeot. Ou estes gajos são mesmo idiotas ou então pensam que as outras pessoas o são. Eu quando quero ajudar o ambiente compro um LCD, palermas!
Para finalizar: Águas Luso Sem Sabor. Sem sabor? Não é suposto a água não ter sabor? Isso devia ser antigamente… porque esta nova água regula o trânsito intestinal! E se não regular, devolvem o dinheiro. Como é que alguém vai provar que a água não regulou o trânsito intestinal? Pior! E se alguém precisar de provar que de facto regula?
Conclusão: este pessoal das empresas, dos produtos e das publicidades está totalmente demente! É só publicidade? Não acho. Acho que este tipo de publicidade é a representação fiel de empresas alheadas da realidade, manipuladoras, enganadoras e totalmente psicóticas que não têm mais nenhum objectivo a não ser vender, vender e vender cada vez mais. Sempre mais, sem parar, dê por onde der.
O grave da situação é que estas mesmas empresas são uma pequena fatia dos verdadeiros donos de tudo. Informação e jornalistas incluídos. Até de mim! Isto reflecte-se em quê? Isto quer dizer que no Jornal da Noite, estas empresas ganharam o direito de interferir com o alinhamento editorial. Patrocinando o programa, fazem com que seja impossível ao editor deixar “passar” uma notícia menos abonatória envolvendo qualquer uma destas empresas. Aliás, a situação é ainda mais complexa porque sendo as televisões e outros órgãos de comunicação social partes de empresas de comunicações com participações de/noutras empresas, a informação e o alinhamento editorial estão já comprometidos desde a raiz. Exactamente como acontece no Governo. Igualzinho.
Por isso, percebo mesmo perfeitamente porque Mário Crespo diz: “Há demasiada publicidade em Portugal”.
Exercício de imaginação avançado: Se o PS e José Sócrates fizessem publicidade no intervalo do Jornal de Sexta da TVI, ou directamente no grupo Media Capital é garantido que as notícias que envolvem o PM desapareciam e com elas a campanha negra terminaria. Ou alguém duvida do contrário?
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