No dia em que Chico Buarque, um dos meus compositores favoritos, recebeu o Prémio Camões, soube que o primeiro-ministro do meu país, numa cerimónia oficial, confessou ao chefe de Estado do Brasil que nós, portugueses, temos pena de não falarmos com sotaque brasileiro. Pelo que ouço dizer, há brasileiros que defendem que o português correcto é aquele que é falado em Portugal, o que quer dizer que há muita gente a dizer disparates dos dois lados do mar. Pelo pouco que sei, o Brasil tem sotaques que nunca mais acabam, mas António Costa deve estar a pensar naquele que é usado nas telenovelas.
Entendamo-nos: eu e o meu país somos circunstâncias que acontecemos um ao outro, para sorte e azar de ambos. Não me acho nada de especial por eu ser eu e por eu ser português. Isto de ter uma nacionalidade é um casamento de conveniência que pode parecer de amor, mas é só um acaso, como é o caso do amor, a não ser para quem acredite no destino ou num deus que tenha tudo planeado, incluindo o momento em que havemos de tropeçar nos braços que queremos abraçar.
O Brasil, falado, cantado e escrito faz parte da minha vida. Tenho horas de músicas, dias de filmes, semanas de telenovelas, meses de livros, anos disto e daquilo. Nos últimos anos, tenho tido dezenas de alunos brasileiros, calorosos, engraçados, simpáticos, com direito a debates vivos sobre o ouro que roubámos ou não, com divertidos confrontos sobre pronúncia e escrita. Há muitos anos que não é possível ser-se português sem se ser brasileiro. E americano. E inglês. E francês. E italiano. E espanhol. [Read more…]
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