Abomino o PAN

 

[Jorge Cruz]

Abomino o PAN e o seu dirigente, o não sei quantos que nem me quero lembrar do nome do artista. O fulano é, apenas por caprichos pessoais, contra praticas que eu aprecio e que acho fundamentais para o quotidiano dos homens com sítio, como sejam os toiros de morte, a caça, a pesca, o arroz de lampreia e outros prazeres da comida, tudo peças fundamentais ligadas à vida dos seres do mundo rural, desde há milhares de anos. E eu, sinto-me pertencendo a esse mundo e a essa cultura da terra e à sua rudeza simples e bela. A caça e a pesca são talvez as primeiras actividades que o ser humano praticou, e são hoje eventualmente a última ligação que temos à nossa génese ancestral de seres nómadas. Os toiros bravos foram talvez dos primeiro actos de diversão e desafio colocados ao homem errante. Caçar qualquer das outras espécies existentes teve dificuldades que foram ultrapassadas com mestria. Conseguir chegar próximo de um Uro ou Auroque (Bos Primigenius) era outra conversa, porque eram naturalmente agressivos e tinham um elevado sentido de marcação do seu território. Ao sentir o seu espaço invadido, o animal ataca para matar. Apesar de herbívoro é o único animal que tem este instinto de atacar em vez de fugir, mesmo que seja castigado. Este comportamento agressivo e nobre é um desafio à inteligência do ser humano. O Auroque acompanhou o homem no seu percurso desde Africa até à Europa. Terá tido origem na Mesopotâmia e acompanhou e evolução do homem de nómada a sedentário e ter-se-á extinguido no século XVII, no bosque Jaktorowka (Polónia) onde se diz que foi caçado o último exemplar. Folgar com um exemplar destes, até o conseguir cansar e finalmente abater, requeria mais que inteligência. Requeria arte e saber, factores que vieram a dar origem à tauromaquia como a conhecemos hoje em dia. Antes de extinto, o auroque deu origem aos encastes dos actuais touros bravos, originários de Espanha, França e Portugal (Castas Navarra, Morucha Castelhana, Jijona, Cabrera, Vazqueña, Vistahermosa, Camarguesa e Portuguesa). 

Todas estas peças de cultura são praticas saudáveis, quer física quer mentalmente, e são depositárias de estética e de ética. Hoje em dia têm importância acrescida em novos contextos, desde o social ao económico, e no caso da caça, ao equilíbrio ecológico e ao controle das espécies cinegéticas, garante da saúde destas espécies, quase todas em vias de extinção, pela influência nefasta das práticas do homem da cidade. 

Pois este artista não “concorda” com a  vida dos homens do campo, porque é um ignorante da realidade que por cá se vive, tal como não percebe nem sabe o que é um campo em poisio, ou em relvas, ou dobrado, ou um alqueve, não os distinguindo de uma pastagem, ou de um matagal. Uma coisa, que está na sua liberdade individual, é ele, por desconhecimento, não gostar de algumas praticas correntes da vida no campo, por razões apenas estéticas ou sensoriais. Outra coisa é ele pretender, por se considerar um ser superior e missionário da sua cultura urbana, impor a sua disparatada ideia de idiota citadino, por ignorância do que é a vida no campo, porque nunca teve um galinheiro, um enxurdeiro ou uma coelheira no quintal. Por essa razão, não pode arrogar-se a impor os seus conceitos, por lei, achando ainda por cima que está a fazer um favor aos trogloditas dos atrasados dos camponeses. Foi isto que fizeram os civilizados povoadores da América, ao querer “educar” os Índios, acabando com a sua imensa cultura, os seus campos de caça, a sua vida e organização tribal, por acharem que não eram suficientemente sociáveis. Os resultados ainda hoje são visíveis.  

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Ser humano???

Nem sequer vou falar da iniquidade de alguém poder encontrar alguma razão ou algum vestígio de dignidade em “espectáculos” cuja essência é o puro “bullying” sobre um animal.

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Touradas: Carlos César já fez a sua prova de vida

Se aumentassem o IVA para 23% a todos os familiares de Carlos César que ocupam cargos de nomeação no Estado, aí sim, estaria resolvido o problema do défice, quiçá da dívida pública.
Não sendo o caso, esta medida exótica do PS de atacar o Governo com a descida do IVA das touradas não passa de folclore político. Não vai acontecer porque António Costa não vão deixar – seria a concretização de um ataque inusitado à ministra acabada de nomear. Dentro do próprio grupo parlamentar, duvido que a maioria concorde com este non-sense. Gostava de ovir a opinião da histórica Rosa Albernaz.
Não percebo Carlos César. Se queria com isto fazer uma prova de vida, está feita. Agora, já que está numa de olhar para os IVAS, pode preocupar-se a sério com as incongruências do Orçamento que afectam os mais pobres e actuar em conformidade?

Tauromaquia e Civilização

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Cartoon@No Limiar das Palavras

A propósito das declarações da nova ministra da Cultura, que muito incomodaram o barão socialista Manuel Alegre, um aficionado dos “eventos” dedicados à tortura animal que dão pelo nome de “tourada”, o poeta afirmou que, por vezes, sente a sua liberdade pessoal ameaçada. Imagino que, caso um qualquer governo decidisse decretar a abolição da sangria tauromáquica, Alegre cuidaria estar perante a ressurreição do nazismo.

Se vamos por este caminho, qualquer dia ainda nos aparece por aí uma seita pagã a exigir o regresso do sacrifício de cordeiros em nome de uma qualquer divindade. Porquê não? Quem somos nós para condicionar a sua liberdade de sacrificar um animal para honrar as suas tradições? Ou então a malta da magia negra, a exigir o sacrifício de galinhas pretas em praça pública. Ou ainda, quem sabe, um qualquer grupo católico extremista a exigir o regresso da Inquisição. Que direito temos nós de impedir um fiel devoto de punir um herege no pelourinho? [Read more…]

Viva a ministra da Cultura e morte às touradas

Para começar, o argumento de que os comedores de carne não podem criticar as touradas não pega. É totalmente diferente matar animais para a alimentação ou matar para o divertimento do ser humano.
Dizer que ninguém é obrigado a ver – «quem não gosta, não veja!» – também é descabido. Posso não ver, mas vai acontecer na mesma. É isso que está em causa – o que está a acontecer e não se eu gosto ou não, se vejo ou não.
É, pois, uma questão de civilização, como muito bem diz a ministra da Cultura. E como as touradas não são cultura nem são nada, não deviam ser taxadas a 13% mas sim à taxa máxima do IVA.
De resto, nem sequer sou a favor da proibição. As touradas vão morrer a médio prazo, sim, mas de forma natural. Sem ataques, sem proibições. Apenas porque os valores civilizacionais vão falar cada vez mais alto. [Read more…]

Não há Tourada na CDU?

O PCP juntamente com os restantes partidos com assento na Comissão de Finanças votou contra a proposta do Bloco pelo fim da isenção do IVA para as touradas.
O que fazem os Verdes na CDU? Se não reagem a um assunto deste calibre para que servem? Assumem a condição de muleta?

Isto agora é que vai ser uma tourada

Um dos meus amigos no tempo de liceu era toureiro amador. Ensinou-me a gostar dos toiros. Curiosamente, quando comecei a namorar com a minha mulher, influenciado pela família, aprendi a gostar do toureio a cavalo. Sempre que posso vou ver uma tourada. Por conveniência vou ao Campo Pequeno [Lisboa]. Não tanto quanto desejaria. (…)

Foi militante da JSD e continua ligado aos ideais do partido tal como foi concebido por Francisco Sá Carneiro. (…)

A crise está a afectar uma pequena parte da população portuguesa muito rica que investiu mal e que agora está a sofrer pesadas menos valias. É consequência de ser empresário. E está a afectar também uma parte significativa da população que está a cair no desemprego. Esses sofrem mais. Quem tem a sorte de manter o emprego tem já a gasolina mais barata e a possibilidade de se ver reduzida a mensalidade do empréstimo à habitação.

Alberto da Ponte, novo homem forte da RTP, em entrevista a O Mirante

What You see Might Not Be Real


Chen Wenling, What You see Might Not Be Real,  2009 [Read more…]

A primeira cidade portuguesa contra as touradas, teve uma tourada nas festas da cidade

UMA TOURADA EM VIANA
O PODER POLÍTICO DA CIDADE PERDEU
O autarca José Maria Costa é um homem indignado. O tribunal Administrativo de Braga autorizou uma tourada que ele tinha proibido.
Coitado do senhor autarca que assim se vê desautorizado.
Os votos que elegeram o sr. Costa, nada parecem ter tido a ver com o assunto que agora se debate à saciedade por tudo quanto é jornal, televisão ou rádio.
A Prótoiros reclama vitória dizendo “Hoje caiu a Catalunha Portuguesa”.
O certo é que a praça de toiros provisoriamente montada encheu, apesar de todas as “lutas” e as “manif’s” contra a tourada.
Será que é chegada a altura de a Praça de Toiros de Viana do Castelo ser devolvida aos aficionados das touradas? Por aquilo que se viu, a tourada não é sulista nem elitista nem de um grupelho de más pessoas, é Nacional e abrangente, seja lá isso o que possa querer dizer.
Os números não mentem, 2300 bilhetes vendidos, 100 manifestantes em duas manifestações diferentes, contra a tourada.
Os termos usados pelos aficionados foram os bilhetes que compraram, enchendo os lugares disponíveis. Os usados pelos manifestantes foram as palavras de ordem, assassinos bandidos e palhaços, acompanhados de insultos, gritos, ameaças, pontapés e murros.
Os actos ficam para quem os pratica.
Em Viana, e não só, sempre houve corridas de touros. No Norte há quem goste, apesar de hoje ser considerado, em certos meios, uma desgraça, esse gosto.
Será que esta gentinha não tem mais nada que fazer que andar a chatear os outros? Não têm vida?

Pornografia (2)

Sim, a pornografia é uma indecência.

Pornografia (1)

Sim, a pornografia é uma indecência.

Adenda:A imagem de Padilla a levantar-se com a mão a tapar o rosto completamente ensanguentado causou grande impressão entre todos os que assistiam e aos profissionais que participavam no espectáculo.”

Touradas

A análise e os conhecimentos que tenho sobre a independência da Catalunha, País Basco etc. permitem -me, quando muito, uma opinião, e não uma certeza sobre qual dos lados tem razão, e sobre o caminho a seguir. Isso, na realidade, é para quem lá vive, para quem sente de perto os problemas e para quem sabe verdadeiramente o que quer, e mesmo esses…muitas vezes contradizem-se. A quem está de fora, é difícil uma tomada de posição acertada. Mas todos temos direito à nossa forma de ver as coisas.
Quanto á opinião da Carla e do A. Pedro Correia de que a abolição das touradas na Catalunha não passa de uma manobra política para pôr de fora o último grande símbolo do Estado espanhol, não estou de acordo. Não quer dizer que não venha a jeito, mas tal maneira de interpretar só se torna redutora, ao fim e ao cabo,  de uma luta e de um movimento de resistência tenaz, que está acima de mera finalidade política, contra o sofrimento inútil e bárbaro de um ser vivo, para deleite de uma assistência sadomasoquista. É um movimento com 25000 assinaturas, emque se empenham directamente 180000 cidadãos, e em que Parlamento catalão decidiu, por 68 votos a favor, 55 contra e 9 abstenções, que as corridas estão fora da lei na região. Ou melhor, estarão a partir de 1º de janeiro de 2012. Abandonadas até por aficionados da velha guarda, as touradas sobrevivem à custa de subsídios do governo, o que não seria mau se as touradas fossem, como entende a nossa pianista da cultura, um caminho cultural.
A criminalização da tourada não foi, portanto, ao contrário do que muitos espalham, um golpe parlamentar, uma jogada política eleitoreira, uma manobra nacionalista visando distinguir a Catalunha do resto da Espanha, mas a última faena de uma dura luta popular, democrática, histórica, seguindo os trâmites exigidos pela ordem jurídica, após amplo debate canalizado institucionalmente desde novembro de 2008, à luz de depoimentos de cidadãos os mais diversos, etólogos, filósofos, toureiros e defensores dos direitos dos animais.

Touradas e Catalunha

Apesar deste meu poste, cujo conteúdo mantenho inteiramente, não quero passar por aquilo que não sou: um paladino quixotesco da actividade taurina. No entanto, esta reflexão da Carla Romualdo e a ligação que ela faz entre o meu texto e a recente proibição das touradas na Catalunha, trazem-me de novo à vaca fria ( já que regressar ao touro quente poderia ferir susceptibilidades).

A recente proibição das touradas na Catalunha, disfarçada, como e bem diz a Carla, de “preocupação com os direitos do animal”, mas que  “não deve ser mais do que as ganas de pôr fora do território catalão o último grande símbolo do Estado espanhol” faz-me notar uma terrível, e para mim insanável, contradição: alguns dos argumentos que aplicam ao fim das touradas deveriam ser dirigidos à vontade independentista.

Entre outras razões, afirmam os proibicionistas ser anacrónico, nos tempos que correm, a manutenção das faenas. Ora, é precisamente isso que eu acho da independência da Catalunha – totalmente anacrónica nos tempos que correm. Não ponho, sequer, em causa que  existem razões históricas para que esse sonho se manifeste e tivesse toda a razão de ser até há três ou quatro décadas. Concordo com a vontade autonómica, a revitalização da língua, a valorização de usos e costumes (de que, curiosamente, a tourada faz parte). Mas a independência da Catalunha, no actual quadro europeu e no futuro desenho federalista da europa, faz tanto sentido como a independência das Berlengas ainda que se lhes acrescentasse a Madeira, Porto Santo e as Selvagens. Ou seja, não faz sentido nenhum.

Tendo a Catalunha autonomia crescente e estando os estados europeus em fase de progressiva diluição de poderes, a criação de um estado  independente na Catalunha não passaria de um ridículo espectáculo em que o touro catalão seria morto em plena arena ao fim uma vida brevíssima, que não justificaria, nem de longe, nem de perto, o bilhete que os aficionados pagariam pelo ingresso (não se cria um país para durar vinte ou trinta anos). [Read more…]

Sou contra a proibição das touradas

Sei que me estou a pôr a jeito e que vão chover epítetos que só constam de alguns dicionários, mas não me importo: sou uma besta, um primitivo, um primata. Além disso estou-me borrifando para uma certa ideia de Harmonia Universal Inter-Espécies, tipo coitadinho do tourinho, que mal é te fez o mosquitinho?

Lembro-me vagamente de ter entrado numa praça de touros (improvisada) na minha mais tenra infância angolana. Depois disso, nem praças de touros, nem garraiadas estudantis, nem largadas de touros. Provavelmente até nem gosto de touradas, coisa que está por provar pelo atrás exposto. Mas também não juro que não vá a uma se me apetecer, nem garanto que não goste, pelo menos de pormenores. Por ignorância e preconceito também destestava futebol. Era parvo, claro, mas estava convencido do contrário. Dupla parvoíce, portanto. Agora, que não cedo tão facilmente a preconceitos nem modismos, não me ponho parvamente a detestar touradas, tento perceber a minha estupidez antes de exercer o meu direito natural a ela e, por outro lado, há direitos que livremente dispenso. Também dispenso o Grande Livro do Pensamento Único, é um direito de que tomo conta e não prescindo.

Os direitos dos animais? Preocupam-me. Aliás, até percebo que um vegetariano radical odeie touradas. Aprecio a coerência, respeito-a. Agora um gajo que dia-sim-dia-não compra carne industrial no hiper-mercado preocupar-se com o sofrimento do touro? Um tipo que se esteja a marimbar na extinção da salamandra portuguesa vir acusar-me de barbárie? Um activista que desconheça a existência de grous em Portugal vir falar-me de incultura? Um fazedor de opiniões que não distinga uma cegonha preta de um perú e este de uma abetarda vir pregar-me o catequismo do amor pelos animaizinhos coitadinhos?

Sabem em que condições [Read more…]

Viva a Catalunha

Manet, O Toureiro Morto

A Catalunha continua em grande. Depois de ter vencido o Campeonato do Mundo de Futebol, ainda que sob a imprópria bandeira do estado monárquico espanhol, acaba de proibir a barbárie taurina, juntando-se assim às Canárias na interdição desse espectáculo degradante de glorificação da morte.

Respiram de alívio os pobres toureiros, que já não levarão cornadas nas arenas catalãs.

Picasso, A Morte do Toureiro

Espero que Portugal, historicamente já andamos atrás da Catalunha pelo menos desde 1640, siga o exemplo.

Entretanto uma boa notícia para o Bloco de Esquerda: é só mais este mandato e perde a Câmara de Salvaterra de Magos, um alívio, portanto.

A Porno Tv

Neste ano centenário da República laica, ando a tentar perceber o que me envergonha mais.

– Financiar a visita de um líder religioso ou financiar touradas onde, sem bolinha e sem vaselina, são espetados guilhos em animais.

RTP, a Porno TV?

Dois tipos de mentalidade em confronto – ainda a propósito das touradas (Memória descritiva)

No Parlamento da Catalunha prossegue a discussão sobre a abolição das corridas de touros no território da comunidade catalã. Ontem as alegações e a intervenção de peritos nas diversas áreas envolvidas, foram quase todas no sentido da defesa da continuidade das touradas. Na sessão da manhã, depuseram, entre outros, Hervé Schiavetti, «maire» de Arles e presidente da União das Cidades Taurinas de França, e o filósofo Francis Wolff, professor da Sorbonne, e autor de uma “Filosofía de las corridas de toros”. Na sua intervenção, declarou que a corrida «já não é a festa nacional de Espanha, pois agora é património mundial».

De uma forma geral, as alegações basearam-se nas banalidades do costume, salientando-se no entanto, na intervenção de Schiavetti a chamada de atenção para a vertente económica do assunto: «Não se trata apenas de um elemento cultural, mas também de uma questão económica; hoje em dia criar touros e aquilo que a criação comporta, constitui um forma imprescindível da gestão do território». O que põe o dedo na ferida.

E lembrou que só em França a exploração que inclui a criação do touro, implica a manutenção de mais de 300 000 hectares de reservas húmidas. Um ganadeiro catalão voltou a chamar a atenção que se os deputados catalães aprovarem a lei, serão responsáveis pela extinção desta espécie animal. Vale tudo, não só os deslocados apelos aos princípios conservacionistas como até disparatadas comparações políticas, como a de um indivíduo de Tarragona, ligado ao negócio das touradas, que comparou a eventual abolição das touradas com a censura franquista. [Read more…]

A «tradição» das touradas (Memória descritiva)

No 2º volume dos « Cadernos de Lanzarote», José Saramago reproduz um artigo que publicou na revista Cambio 16. Transcrevo dois trechos:

«O touro entra na praça. Entra sempre, creio. Este veio em alegre correria, como se, vendo aberta uma porta para a luz, para o sol, acreditasse que o devolviam à liberdade. Animal tonto, ingénuo, ignorante também, inocência irremediável, não sabe que não sairá vivo deste anel infernal que aplaudirá, gritará, assobiará durante duas horas, sem descanso. O touro atravessa a correr a praça, olha os “tendidos” sem perceber o que acontece ali, volta para trás, interroga os ares, enfim arranca na direcção de um vulto que lhe acena com um capote, em dois segundos acha-se do outro lado, era uma ilusão, julgava investir contra algo sólido que merecia a sua força, e não era mais do que uma nuvem. Em verdade, que mundo vê o touro?» (…)

«O touro vai morrer. Dele se espera que tenha força suficiente, brandura, suavidade, para merecer o título de nobre. Que invista com lealdade, que obedeça ao jogo do matador, que renuncie à brutalidade, que saia da vida tão puro como nela entrou, tão puro como viveu, casto de espírito como o está de corpo, pois virgem irá morrer. Terei medo pelo toureiro quando ele se expuser sem defesa diante das armas da besta. Só mais tarde perceberei que o touro, a partir de um certo momento, embora continue vivo, já não existe, entrou num sonho que é só seu, entre a vida e a morte».

Quando José Saramago leu o texto a sua mulher, Pilar, disse – «Não podes compreender…” Tinha razão» diz o escritor»Não compreendo, não posso». É sempre o que os defensores das touradas, quando vêem que os seus «argumentos» não são aceites, dizem. Quem acha que as touradas são um espectáculo degradante e advoga a sua proibição imediata «não compreende». Porque, dão a entender, para compreender uma coisa tão poética, tão tradicional, é preciso ter uma sensibilidade especial. [Read more…]

Touradas

Recentemente a Câmara Municipal de Viana do Castelo decidiu proibir a realização de touradas na cidade. Não me interessa  tanto a medida em si, que terá certamente muitos defensores e outros tantos detractores, mas sim uma pergunta em concreto que a decisão suscitou a um jornalista. Neste caso, foi um pivot da SIC Notícias, cujo nome infelizmente não recordo. Perguntava este ao presidente Defensor Moura se estava certo de que a medida correspondia à vontade da maioria da população. Visivelmente pouco habituado, como de resto a maioria dos autarcas, a ser confrontado com esta questão, o presidente esquivou-se e foi necessário repetir a pergunta. E então respondeu que não precisava de saber isso, só precisava de saber que Portugal havia subscrito uma declaração de defesa dos direitos dos animais.

No que me diz respeito, gostaria que se acabasse de vez com as touradas, não tanto por proibição mas porque fosse crescendo uma sensibilidade que visse com repulsa os maus tratos infligidos aos animais. Mas pergunto-me porque razão tão poucas vezes se pergunta a um autarca se está certo de que qualquer uma das medidas que pretende implementar corresponde à vontade da maioria dos seus munícipes.

Responder-me-ao que não precisa de estar, foi eleito pela maioria para decidir e a contínua consulta aos cidadão atrasaria a tomada de decisões e tornaria a governação impossível. Mas não posso deixar de pensar que, pelo menos ao nível do poder autárquico, poderia e deveria ser de outro modo.

Queria a maioria dos portuenses que o teatro Rivoli fosse entregue às soporíferas encenações do sr. La Féria? Queria a maioria dos portuenses que a Avenida dos Aliados fosse despojada sem piedade de qualquer vestígio de árvores de sombra, flores, relva, bancos de jardim, para que em seu lugar se estendesse o cimento e se colocassem umas pobres árvores depenadas, que mais pareciam sobreviventes de um holocausto?

E, da mesma forma, podemos perguntar se era a vontade da maioria dos portuenses que se teve em conta quando se pensou entregar a privados a gestão do mercado do Bolhão, do pavilhão Rosa Mota, da praça de Lisboa, do mercado Ferreira Borges?…

Desculpar-me-ao se me centro exclusivamente na cidade do Porto, mas creio que não deverá ser difícil enumerar, em muitas outras cidades deste país, situações semelhantes. Afinal, com maior ou menor mestria, vamos todos sendo toureados.