Olhe, não lhe digo mais nada, lá no prédio somos cinco senhoras mais essa… não lhe vou dizer que é uma porca, mas é uma desavergonhada, prontos. No outro dia, estávamos à conversa e vai ela e vira-se para nós e diz que os orgasmos ou lá o que é que ela tinha lá com o homem dela eram quase todos bons e alguns muito bons e até excelentes. E nós virámo-nos para ela e dissemos-lhe assim: “ó coisinha, isso não pode ser, não podem ser quase todos bons, têm de ser muitos regulares e alguns insuficientes”. E então ela vai e diz: “olha, mulher, se não estás satisfeita, faz como eu fiz, fala com o teu homem e arranjem maneira, que eu também levei uns tempos até conseguir pô-lo a funcionar como deve de ser”. Olhe, fiquei de uma maneira! Para já, o meu homem até é muito meu amigo e passam-se dias que não levanta a mão para mim. Imagine se ia agora dizer-lhe que tinha de fazer assim e assado só para ver se eu tinha um orgasmo ou lá o que é. Ele já anda tão cansado lá com trabalho e ainda vinha para casa fazer esforços, coitado. E depois dissemos-lhe assim: “tens de parar com isso, então algumas nem homem têm e tu tens homem e, ainda por cima, andas contente?” E dissemos-lhe mais: “fazes o favor de acabar com isso e se a gente sonha que continuas a ter orgasmos quase sempre bons, a gente chateia-se”. E ela a dar-lhe que também podíamos ter, era uma questão de conversar. Bem, a Adozinda do quarto esquerdo atirou-se ao ar e disse assim: “eu não consigo ter um galo de Barcelos, quanto mais um orgasmo, acabas é com essa porcaria ou então o meu homem vai ter uma conversa com o teu”. A maluca pôs-se para ali aos gritos a dizer que éramos umas invejosas e que em vez de querermos ter uma vida melhor só dizíamos mal de quem estava bem. E no fim disto tudo, ela é que é doida e eu é que venho presa só porque ia atrás do homem dela com uma faca e ele nuzinho. Se ele não se fecha no quarto e não chama os senhores guardas, a descaradona nem insuficientes tinha, acredite que não!
Citações: Ide ler o Miguel no jornal O Jogo, ide:
Hoje, o Miguel Carvalho publicou mais um artigo de opinião no jornal O Jogo. É de leitura obrigatória.
Adoro o cheiro a napalm logo pela manhã
“E eu que pensava que a riqueza reside na nossa enorme diversidade. E eu que pensava que todos contam e são iguais. Sou uma utópica, que, provavelmente, nada sabe sobre o que é ser lusitana” – Hermana Cruz, jornalista.
Melhor que ninguém, uma jornalista do Porto sabe bem o que custa esta espécie de insularidade para todos os profissionais, dos mais diversos ramos, em que se vive fora da “capital do império”. Seja no Porto, em Braga, Vila Real, Coimbra, Aveiro ou Viseu. Sem esquecer Faro, Évora ou Beja, só para citar alguns exemplos. Ontem, tomou como exemplo o Porto, o FC Porto. Volto a citar Hermana Cruz: “Nacionalismo assim, carregado de preconceito regionalista e clubístico, mostra-me o que é ser portuguesa”. Mas o futebol é apenas a ponta do icebergue de um país que, hoje, não passa de um arremedo. E o FC Porto é apenas uma vírgula em toda esta história.
Vamos ao exemplo de ontem em que o FC Porto levou de vencida a Juventus de Cristiano Ronaldo. Por partes.
Pessoas que dizem que os outros têm mas é inveja
A crítica é algo tão desagradável que chega a ser desagradável até para o crítico. O criticado nunca gosta – é como perder um jogo: pode-se disfarçar, pode haver contenção, uma piada descontraída, mas é sempre mau.
São várias as reacções do criticado. Se for educado, será contido, declara que aceita, mentindo em grande parte, mas pensando sempre que a crítica é o fumo que prova a existência de um fogo.
Há, contudo, muitos mais espécimes. Há o criticado que afirma aceitar a crítica, mas. E a seguir ao mas, vêm desculpas não necessariamente esfarrapadas, porque também há desculpas bem vestidas, perfumadas.
Dentro do criticado nitidamente desagradado, há uma grande variedade de raças. Uma delas é o que critica a crítica, reclamando que seja construtiva. Ora, a verdade é que a crítica só é bem feita se for destrutiva – porque a crítica serve para destruir, cabendo ao criticado reconstruir a partir das ruínas.
O meu preferido, entre os desagradados, é o criticado que acusa os críticos de serem unicamente motivados pela inveja. Neste caso, o crítico só critica porque, no fundo, quer ser como o criticado.
Um dos mais conhecidos exemplares desta variedade é José Rodrigues dos Santos (JRS), acolitado por muitos dos seus fiéis. Diante das críticas de que é alvo nas várias actividades que pratica, JRS limita-se a acusar os outros de [Read more…]
Porque nunca me conseguirão calar
“Porque os outros se mascaram mas tu não
Porque os outros usam a virtude
Para comprar o que não tem perdão
Porque os outros têm medo mas tu não
Porque os outros são os túmulos caiados
Onde germina calada a podridão.
Porque os outros se calam mas tu não.
Porque os outros se compram e se vendem
E os seus gestos dão sempre dividendo.
Porque os outros são hábeis mas tu não.
Porque os outros vão à sombra dos abrigos
E tu vais de mãos dadas com os perigos.
Porque os outros calculam mas tu não.”
Sophia de Mello Breyner Andresen
Coisa feia, a inveja.
Este era o slogan publicitário do Peugeot 307. Devem estar lembrados…
Às vezes sentimo-nos ameaçados pela inveja dos outros tal como o carrinho de pano cosido à mão e cravado de alfinetes do cartaz da marca francesa.
Alberoni, o conhecido sociólogo italiano, escreve também sobre este tema. Recorro a ele para perceber melhor isto da inveja que «é um sentimento universal»:
As mulheres invejam-se entre si e os homens a mesma coisa. A inveja surge quando nos apercebemos que somos ultrapassados por alguém que estava ao nosso mesmo nível. (…) surge quando não conseguimos competir com ele. Nesse momento temos à nossa frente dois caminhos. Ou aceitamos o seu sucesso (…) ou então começamos a desejar o seu fracasso. Na inveja, renunciamos a agir, renunciamos até à meta. O invejoso, perante as dificuldades da competição, procura destruir o seu ideal. (in O Optimismo, Bertrand, 1995, p. 111-112)
Alberoni aconselha a agir, a fazer melhor, a procurar novos caminhos e a admirar quem foi melhor.
Os que não chegaram a nascer
Este é o nome do terceiro capítulo do romance Quem Ama não Dorme de Robert Schneider (1961), escrito em 1992.
Uma obra inesquecível. Trata-se da história de um músico genial do século XIX, nascido numa aldeia miserável algures na Áustria, onde a mesquinhez e outros defeitos de mentalidade (ignorância, inveja, indiferença) “não permitiram reconhecer o seu enorme talento”.
Deixo um excerto que me parece traduzir algo muito real ainda no século XXI e em Portugal:
(…) que magníficos seres, filósofos, pensadores, poetas, escultores e músicos terá o mundo perdido, apenas por não lhes ter sido proporcionado ensejo para aprender o seu genuíno ofício? (…) Chorámos então por estes desconhecidos, estes homens nascidos, que, em vida, não chegaram, porém, a nascer. Johannes Elias Adler foi um deles.”
Eu sei… O título deste post pode ser lido com outro sentido… claro.
Choramos também por esses desconhecidos seres que não se deixou, sequer, nascer. Onde poderiam chegar?
E são cada vez mais…
O triunvirato da manipulação
Existem três elementos básicos para manipular as massas.
O primeiro é o medo, recorrendo-se à tragédia eminente e à exploração da tragédia alheia. A primeira, explorando a ideia que o pior está para chegar castra os ímpetos da demanda. A segunda, faz com que os povos se conformem mais com o que têm que é melhor do que outros estão a passar. Combinadas, travam a reivindicação e estimulam a submissão.
Todavia, o medo nas sociedades democratas não chega, devido a empecilhos como a liberdade de acesso à informação, de expressão, entre outros. Vantagem das ditaduras.
Face às limitações da democracia aos intentos manipuladores, tem de se acrescentar mais dois instrumentos que se interligam com a génese humana: a vaidade e a inveja.
A vaidade, leva as massas a querem exibir. A inveja, a desejar o que os outros exibem. Mais ainda, a vaidade leva a que se queira ter para se mostrar que se tem. A inveja leva a que se queira ter o que os outros têm, independentemente de se poder ter ou não. Bem afinada, a inveja atinge o auge quando se deseja que os outros deixem de ter aquilo que se lhes cobiça.
Esta combinação da vaidade com a inveja, construiu um modelo de sociedade assente na ideia de que se vale não pelo que se é mas pelo que se tem.
Esta combinação do medo, com a vaidade e a inveja, articula-se e sintetiza-se por via da propaganda, que mais não é do que a técnica de convencer a vítima de que aquilo que a prejudica é bom para ela.
Este triunvirato do medo, vaidade e inveja, articulado através da propaganda, criou das mais pérfidas sociedades que acabam por se revelarem absolutamente contrárias ao que uma sociedade livre, democrata e plural deveria representar. E aqui é que está o requinte do triunvirato: tudo isto se alcança através da própria democracia.
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