A faculdade de exigir comprovativos de fatos

King. Euen as the rockes please them that feare their wracke.
Withhold reuenge deare God, tis not my fault,
Nor wittinglie haue I infringde my vow.
— Shakespeare, Henry VI, Part 3 (Octavo 1, 1595)

***

Efectivamente, a faculdade existe e, pior, encontra-se consagrada no Diário da República.

Esta javardice continua e os responsáveis também continuam a fingir que nada disto está a acontecer. Em vez de perderem tempo com “a fita encarnada” de Santana Lopes, perguntem-lhe mas é o porquê do “agora facto é igual a fato (de roupa)“. E aí está o busílis da questão. A culpa, garanto-vos, não é minha. A culpa é dos defensores, promotores e amigos do Acordo Ortográfico de 1990. Exactamente.

***

Niemand ist vollkommen

„Sie sind ein Monster!“
„Und Sie sind Anwalt! Niemand ist vollkommen.“
Dracula

***

No tal artigo do “nobody is perfect”, Cavaco grafa 30 de Janeiro. Muito bem. 30 de Janeiro. Lindo menino. Mas Cavaco grafa perspetivas (muito bem, dirá um adepto português do #AO90, muito mal, dirá um homólogo brasileiro e muito mal, direi eu também, obviamente). Cavaco grafa diretamente (muito mal, direi eu, muito bem, dirão os nossos amigos de há pouco). Logo nos primeiros parágrafos do artigo de hoje, Cavaco explica-nos as virtudes do #AO90. Cavaco mandou. Santana cumpriu. Por isso, por haver tanta sabedoria e sensatez, tivemos há uns anos o “agora facto é igual a fato (de roupa)” de Santana. Quod erat demonstrandum. Agora, vou mas é trabalhar.

***

A nota ortográfica

Hugo Stiglitz. Und auf die Entfernung bin ich ein richtiger Fredrick Zoller.
IB

À la fin du XVIIIe siècle, la tolérance perd enfin sa signification restrictive et péjorative.
Denis Lacorne

Bernard Tapie. C’est où la nature?
Michel Polac. En Suisse…
ONPC

***

Hoje, não há *fatos no Diário da República, mas há *contatos. Sim, dois *contato no singular e muito perto um do outro. Tudo como dantes. Nada de novo a assinalar no sítio do costume.

Recentemente, recebi um testemunho, em forma de livro, que me trouxe reminiscências de uma prática há muito em voga entre gente forçada, por isto, por aquilo ou por aqueloutro, a adoptar o AO90. Essa prática (conheço exemplos concretos, mas ficam para próximas oportunidades) consiste em grafar alternativas, para que, de facto, o dito cujo não seja utilizado: por exemplo, metas em vez de *objetivos, excelente em vez de *espetacular, maravilhoso em vez de *ótimo, dar o dito por não dito em vez de *retratar-se, justamente em vez de *exatamente, etc.

Todavia, o exemplo desta “Nota Ortográfica” é diferente e, acrescente-se, interessantíssimo.

Os meus agradecimentos à Professora A.

Desejo-vos um óptimo resto de semana.

***

Mencionar um fato: this never happened to Pablo Picasso

I loved all sorts of English language experimentation.
John Cale

In fact, comparing previous research on UG principles in L2 phonology vs. L2 syntax, and pointing out the relatively little work in this area by L2 phonologists, Young-Scholten (1995, 1996) argued that there is, nevertheless, reason to believe that interlanguage phonologies do not violate the principles of UG, because they often correspond to natural languages (a point first made by Eckman, 1981), and because learners can often reset phonological parameters, instead of being stuck with the L1 values.
Öner Özçelik & Sprouse (2016)

***

Há quem tente adoptar o AO90 e escreva fatos e contatos, em vez de factos e contactos. Nunca grafei nem fatos em vez de factos, nem contatos em vez de contactos. Ao não adoptar o AO90, estou automaticamente protegido da base IV e de interpretações abusivas (eufemismo para ‘erradas’) dela feitas, como o famoso “agora facto é igual a fato (de roupa)“. Neste contexto, jamais me ocorreria, por exemplo, mencionar um fato.

Mencionar um fato, em vez de facto? Homessa! Como cantam os Modern Lovers (e o Cale e o Bowie e o White), this never happened to Pablo Picasso.

Continuação de uma óptima semana.

***




Breve exercício com negativa e declarativa

This is not America. This is America. (Flag. Jasper Johns|MoMA)

A dimensão do contato

This is not a playable instrument.
Flea

***

Efectivamente, o Acordo Ortográfico de 1990 não funciona. Se ainda houver dúvidas, o Diário da República esclarece-as. Para uma visão pormenorizada do assunto, podeis recorrer à etiqueta sítio do costume.

Com votos de um óptimo fim-de-semana, eis o pano de fundo musical dos últimos dias, distinguindo-se um toque de deliciosa assimilação progressiva no primeiro verso:

Boletim meteorológico

Cette arrogance est absolument insupportable. Mais pour qui vous prenez-vous? Mais pour qui vous prenez-vous, Emmanuel Todd? Vous ne passez plus les portes!
Alain Finkielkraut

I think that’s the way things work. You have some… It’s not that you… I mean, belief formation is often contingent on the outcomes that you want. You want a certain outcome and you construct a system of beliefs which makes that exactly right and just.
Noam Chomsky

***

Efectivamente.

Efectivamente, estava eu a escrever, 2019 continua com dias de céu geralmente limpo (Magnolia foi há 20 anos). Há vento. Vento que vem, desde 2012, do outro lado do Atlântico, como se vê pelo contato, mas em geral fraco, devido a ‘respetivo’ em vez de ‘respectivo’.

Há possibilidade de formação de neblinas em forma de contatos todas as semanas.

O arrefecimento, apesar de lhe chamarem noturno, é nocturno (para si, minha senhora). Quanto ao mar, há ondas, muitas ondas, só ondas (my wave), só ondas (waves roll in my thoughts) e há espuma (Fort ans Meer! ans Meer! es schäume die Welle), muita, muita espuma. A temperatura da água do mar, como os pareceres, não interessa rigorosamente nada.

***

A valorização dos fatos: enquanto houver Egipto, há efectivamente esperança

We’ve got five years, what a surprise.
David Bowie

If you wanna get to heaven, gotta D-I-E
you gotta put on your coat and T-I-E
Curtis Buck/Waylon Jennings

Σωκράτης … τῆς Αἰγύπτου…
— Platão, “Fedro

***

Passado um lustro (e muitos meses), com algumas saudáveis e louváveis recaídas (como diria Hollande, há sempre «des rechutes possibles»), eis que surge ortografia no jornal da silenciosa resistência, da grafia rasca, da grafia inadmissível.

Exactamente, há redação e seleção. Todavia, enquanto houver Egipto, há efectivamente esperança.

Os meus agradecimentos àquele excelente leitor.

Quanto ao sítio do costume, como é habitual, nada de interessante a declarar.

Outra vez.

***

Eis a situação

When the fire broke out on the Rio Grande
Put my foot to the board and she ate up the sand
With a horse on the side dragged tailing behind
Fire that aims to please

When the fire broke out on the Rio Grande
Left nothing standing but the smell of the land
And hubcaps that burnt through the skin of your hand
But nothing left at all but the sound of a rock ‘n’ roll band

David Bowie

***

Efectivamente.

***

Así que pasen cinco años

PADRE: Cinco años, día por día. ¡Ay, Dios mío!
— Federico Garcia Lorca, Así que pasen cinco años

Dans le modèle de Klein, l’état spatial est l’opération linguistique de base dans la représentation de l’espace.
—  Arnaud Arslangul (2007)

Fast alle Schnecken, nur etwa drei Gattungen ausgenommen, haben ihre Drehung, wenn man von oben herab, d. i. von der Spitze zur Mündung gehet, von der Linken gegen die Rechte.
— Kant, Von dem ersten Grunde des Unterschiedes der Gegenden im Raum

***

Quando, há cinco anos, isto começou a acontecer de forma sistemática

dre212012

dei início à recolha de material para um documento, apresentado, um ano mais tarde, na Assembleia da República. A única resposta pública que então obtive foi do ILTEC:

Tal não invalida, é claro, que sejam legítimas as preocupações que o autor expressa no seu trabalho. É importante que os órgãos oficiais, sobretudo num período de transição como este, se esforcem por dar o exemplo e evitem erros.

De facto, cinco anos depois de os fatos e afins terem começado a ocupar quer o lugar dos factos e afins, quer o quotidiano dos leitores do Diário da República, eis o resultado das acções silenciosas que terão sido conduzidas pelos responsáveis políticos para combater o flagelo ortográfico em curso, baseadas evidentemente em estudos secretíssimos e, sem qualquer sombra de dúvida, aturados, demorados e muito rigorosos:

dre212017

Efectivamente, 2 de Janeiro de 2012 e 2 de Janeiro de 2017.

Contudo, hoje é dia 6. O que terá acontecido hoje, dia 6 de Janeiro de 2017? [Read more…]

Contra o Orçamento do Estado para 2017

gaudencio

© Rui Gaudêncio (http://bit.ly/2dhUUdi)

Well I keep seeing this stuff and it just comes a-rolling in
And you know it blows right through me like a ball and chain

— Robert Allen Zimmerman, “Brownsville Girl

***

Eis um Governo que sorri e encolhe os ombros, enquanto “aguarda serenamente“, mas depois é apanhado a entregar documentos de duvidosa qualidade técnica. Aliás, na senda daquilo que aconteceu com o OE2012, o OE2013, o OE2014, o OE2015 e o OE2016.

Antes de passarmos ao Relatório do Orçamento do Estado de 2017, debrucemo-nos muito rapidamente sobre exemplos da Proposta de Lei: [Read more…]

Um Papa único. Uma Imagem única.

FB_IMG_1452988999969

Enorme…


Descobri Bowie ainda na adolescência, durante a fase Berlim. Nunca mais deixei de ouvir o camaleão. Deixo aqui a minha homenagem a alguém que nunca cedeu a tendências. Como fã apenas lhe posso dizer obrigado. R.I.P.

Is that a fact?

…that is a fact.

David Bowie, Heroes

These days many Americans live in an alternative political reality, in which the simplest factual assertions are met with anger and derision.

Paul Krugman

***

Efectivamente, desde Janeiro de 2012, muitos portugueses vivem numa realidade ortográfica alternativa.

DRE 1312016

***

Now the dress is hung, the ticket pawned
The Factor Max that proved the fact
Is melted down

— David Bowie, The Bewlay Brothers

MEC e David Bowie. Um génio a escrever sobre outro génio

http://www.publico.pt/culturaipsilon/noticia/pela-primeira-vez-nas-nossas-vidas-sabemos-o-que-david-bowie-vai-fazer-1719876

Ashes to ashes…

Morreu David Bowie. Dancemos!


David Robert Jones (08-01-1947 – 10-01-2016).

David Bowie


This is Ground Control to Major Bowie
You’ve really made the grade
1947 –  2016

Savile Row

saville row

© Yu Fujiwara (http://bit.ly/1Hv1jQy)

She’s hangin’ on his arms
like a cheap suit
— David Bowie

***

Hoje, o director do Correio da Manhã escreveu o seguinte:

Vai uma enorme polémica e uma ainda maior onda de indignação nas redes sociais por o CM ter dito que uma cega é cega e que um cigano é cigano.

Lembro-me bem da polémica e da indignação que não houve, quando o director do Correio da Manhã garantiu que

A nova ortografia só se estenderá a todos os textos do jornal, respectiva primeira página e manchete, caro Leitor, quando já ninguém estranhar a palavra “facto” escrita sem cê.

Efectivamente, quer há cerca de um mês, quando voltei a passar por Savile Row – desta vez, a caminho da rua do Ziggy–, quer hoje, ao ler uma entrevista relativamente recente,

fato

lembrei-me dessa indignação e dessa polémica que não houve. Não houve polémica? Não houve indignação? Claro que não. Não houve nem polémica, nem indignação. Contudo, há fatos.

Há vida em Marte?

Segundo a NASA, apesar da ausência de metano, é provável, David, é provável. Contudo, uma coisa é certa: não há dinheiro em Marte. Não, não há.