A excelente forma de Ricardo Salgado

Sed cum legebat, oculi ducebantur per paginas et cor intellectum rimabatur, vox autem et lingua quiescebant.

Santo Agostinho (354430)

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Gostei imenso do discurso que Ricardo Salgado proferiu ontem na comissão parlamentar de inquérito ao caso BES. Por motivos profissionais, não pude assistir à audição. Contudo, o Público e o Expresso publicaram o excelente texto do ex-presidente do Banco Espírito Santo.

Vejamos alguns (sim, só alguns) dos melhores momentos:

Acção, Abril, accionistas, acções, actas, actividade, activos, actuação, actuações, afectava, afecto, correctas, Dezembro, directa, directamente, directo, efectivamente, efectuar, incorrecto, injectar, interacção, Janeiro, Julho, Junho, Maio, Março, Novembro, objectivo, objecto, Outubro, percepção, perspectiva, perspectivas, projecção, projecto, protecção, protectora, respectiva, respectivos, ruptura, Setembro.

Aliás, até proponho que Salgado seja distinguido com uma menção honrosa, devido à destreza com que adoptou grafias extremamente perigosas, como percepção, perspectiva, perspectivas, respectiva, respectivos e ruptura.

Muito bem, Ricardo Salgado. Óptimo. Excelente.

É evidente que estes “muito bem”, “menção honrosa”, “óptimo” e “excelente” devem ser lidos à luz da máxima atribuída por Daniel Dennett (p.21) a Gore Vidal: “It is not enough to succeed. Others must fail“.

“Others must fail”. Pois, claro. Sim, ‘others’. Efectivamente, os do costume.

Depois de apreciado o desempenho ortográfico de Salgado, debrucemo-nos sobre a habitual salgalhada do Diário da República:

dre 9122014Exactamente: ontem, no sítio do costume.

Actualização (11/12/2014): Sim, sim, reparei no *eminente. Contudo, atenhamo-nos ao AO90. 

Relvas vai estudar sem vírgula

vai_estudarBento XVI resignou e afastou-se de São Pedro. Relvas, resignado, resolveu afastar-se de São Bento. É compreensível: seria demasiado doloroso contemplar Passos perdido nos Passos Perdidos. Ainda por cima, como se não bastasse a dor de já não lhe chamarem ministro, não lhe sobra sequer a consolação de ser tratado por doutor, com as equivalências pela hora da morte. [Read more…]

Bento XVI: Um Papa não tão mau como se esperava

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No último dia do pontificado de Bento XVI, meia dúzia de linhas à laia de balanço.
Já passou o tempo em que eu me atirava forte e feio à Igreja Católica por tudo e por nada. Não mudei a minha opinião, mas como diria o outro, agora sou calmo em relação a tudo o que a envolve a instituição. No fundo, só é católico quem quer e ninguém é obrigado a seguir os seus ditames. Cada um é livre de aderir às seitas da sua preferência.
Quanto a Bento XVI, parece-me que não foi tão mau como se previa. Da mesma forma que João Paulo II não foi tão bom como se quer fazer crer. No que diz respeito a Ratzinger, destaco três pontos importantes:
– a crítica forte do neoliberalismo que governa hoje em dia toda a sociedade ocidental. «O objetivo exclusivo de lucro, quando mal produzido e sem ter como fim último o bem comum, arrisca-se a destruir riqueza e criar pobreza.»
– a condenação clara da pedofilia, silenciada e escondida no interior da Igreja, durante décadas, por João Paulo II e as autoridades máximas de Roma. «De novo, penso no imenso sofrimento provocado pelos abusos cometidos nas crianças, especialmente no seio da Igreja e pelos seus ministros.»
– a defesa da Água como bem público e a recusa clara da sua privatizaçãoem todo o mundo. «A água não é “um bem meramente mercantil mas público».
De resto, não se pode dizer que tenha sido um papa especialmente progressista. Mas o que se esperava de alguém que foi eleito aos 80 anos?

A abdicação de Bento XVI explicada

Bento XVI abdica

Bento XVI

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Afastei-me gradualmente da Igreja Católica e do próprio cristianismo no início do pontificado de João Paulo II, apesar de ser um confesso admirador do homem, afinal o nome Karol Wojtyla não pode ser dissociado do fim do império vermelho a Leste.

Além de ter perdido a fé, algumas tomadas de posição na Igreja Católica, com o dedo do então Cardeal responsável pela Congregação para a Doutrina da Fé, Joseph Ratzinger, figura que nunca me inspirou qualquer simpatia, contribuíram decisivamente para aumentar o fosso que me separa da ICAR. Curiosamente estive em Roma poucos dias após a sua eleição pelo colégio dos cardeais, pude então constatar que não era o único, mesmo entre fervorosos católicos, existia grande admiração pelo recém falecido Papa e grande cepticismo sobre Bento XVI.
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Não se pode servir a dois senhores

O Bispo do Funchal suspendeu um projeto de diálogo com ateus.
Este projeto, denominado Átrio dos Gentios, teve início em 15 Abril, mas ontem já não teve continuidade.
O desafio foi lançado pelo Papa Bento XVI e tem “congregado, em todo o mundo, nomes importantes da cultura, num espaço aberto ao diálogo inter-religioso e intercultural”.

Uma iniciativa interessante e enriquecedora para os católicos, esta de procurar conhecer a visão dos intelectuais ateus ou não-crentes sobre questões da fé. E a partir da qual todos saem a ganhar, num diálogo acompanhado de críticas construtivas!
Não sabemos ao certo se o Bispo, António Carrilho, terá decidido sobre pressão do poder regional, que não deve estar disposto a críticas duras por parte de padres como José Luís Rodrigues, que ontem estava destacado para uma celebração no âmbito da referida iniciativa. O mesmo sacerdote tem apelado ao governo regional que evite gastos supérfluos para ter mais dinheiro para o apoio social aos mais carenciados.

Foi uma coincidência? – Há quem não goste de ouvir a verdade.
Por que se suspendeu um projeto tão importante como este?
Sr. Bispo, não se pode servir a dois senhores. E o senhor sabe bem a qual deve servir.

Falta de olho

A visita do Papa Bento XVI a Espanha, ficou desde logo marcada pela conversa da despesa de 25 milhões de Euros.

Esquecem os preocupados da despesa que a visita papal trouxe a Espanha milhares de fiéis de todo o mundo que lá vão gastar dinheiro em restaurantes, museus e hotéis – como os chineses do Futre. Além da projecção mediática usufruída por Espanha que ainda ganhou em tomar de perto as palavras de um Papa universitário e com um pensamento sobre a actualidade digno de ser estudado.

Dos revoltados espanhóis sobre os custos da visita papal, gostaria de saber quantos já não se importam de comprar bilhetes de futebol e sustentar clubes com salários megalómanos para os tempos em que vivemos?

Nestas coisas é preciso ter um pouco mais de visão. Ou de olho, mas com cuidado não vá Mourinho meter o dedo…

João Paulo II, a beatificação de um ultramontano

A beatificação de João Paulo II terá lugar no Dia do Trabalhador,  coincidente, este ano, com o Dia da Divina Misericórdia, instituído pelo citado papa em 2000.

João Paulo II sucedeu, como se sabe, a João Paulo I, cuja  causas da morte, após 33 dias de papado, permanecem misteriosas. David Yallop, no livro “Em nome de Deus”, adianta algumas teses, admitindo  a hipótese de envenenamento. João Paulo I, Albino Luciani de nome de baptismo, era um homem progressista, comprometido com as novas concepções e as doutrinas sociais emanadas do Concílio Vaticano II, em 1962, por iniciativa de João XXIII. Conquanto sob forma mitigada, com Paulo VI houve alguma continuidade.

João Paulo I perseguia o objectivo da intervenção efectiva da ICAR no combate à pobreza, em sintonia com a Teologia da Libertação integrada na práxis católica reconhecida pelo concílio. Tinha igualmente o propósito de libertar o Vaticano das diabólicas  fraudes financeiras, patrocinadas pelo maquiavélico Marcinkus, por sua vez correlacionadas com a falência do Banco Ambrosiano, a morte do ex-admistrador desse banco, Calvi, e ainda a ligação à loja maçónica P2. [Read more…]

SUCESSOS DE LISBOA, E DE ROMA

Foi um sucesso a cimeira da Nato em Lisboa , sobretudo, porque conseguiu lograr uma desejável parceria com a Russia, encerrando assim definitivamente, a porta da guerra fria,que na verdade terminou com a implosão da União Soviética e a queda do muro de Berlim.A partir daí a globalização neoliberal que já vinha a caminho , acelarou-se, de forma celerada,como a estamos agora a conhecer,com um mundo unipolar.

Também foi um sucesso de Lisboa a melhor coordenação que, finalmente, parece ter sido conseguida entre a União Europeia e os EUA, com resultados imediatos visíveis, ao decidir se preparar, em pouco tempo, a saída, de forma faseada das tropas da Nato do Afeganistão, e um díalogo mais intenso entre estas duas regiões fulcrais para o mundo.
Sucesso também a nível internacional para o governo de Sócrates, por ter conseguido organizar com êxito, um evento global tão importante, que colocou Portugal por uns dias, nos os écrans de todo o mundo, promovendo a nossa imagem de forma positiva. Sócrates saiu -se bem e mostrou-se um líder com capacidades internacionais, malgrado o desastre social que se passa, agora, a nível interno em Portugal. [Read more…]

Se Deus existisse… (a propósito da visita do Papa)

Ontem já estava mal disposto. Não estranhei acordar de madrugada.
Por mais que tentasse, não me saíam da cabeça as restrições ao trânsito, a tolerância de ponto, os microfones forrados a ouro, os aviões que vão e que vêm e que irão tornar a ir e a vir.
E tudo isto, porque vem cá um personagem a quem deram o titulo de papa.
Para que não restem duvidas, sou ateu. Nem sequer considero o agnosticismo, porque só conheço uma pessoa que o professa e esse chama-se Manuel Alegre. De facto o único agnóstico político existente no Universo.
Só sabe que é de esquerda, nunca toma posições claras e definidas e embora a gente não negue a sua existência, sabemos perfeitamente que não existe.

Bom, agora o caso é mais complexo. Lembrámo-nos do objecto social desta Associação e fomos revê-lo. Lá está…..É nosso principal objecto promover o estudo dos fenómenos culturais, ideológicos, políticos e económicos do Mundo contemporâneo e em especial a sua incidência em Portugal……
Começava a ficar justificada a razão porque me sentia mal disposto.
É que nada justifica o “estardalhaço” desta visita. São mesmo suspeitas as razões que lhe estão subjacentes, assim como o facto de termos sido abençoados com uma estadia tão prolongada.
Não quero ferir sentimentos de ninguém, mas também reservo o direito de transmitir a minha opinião. E essa é a de que me parece que já era tempo de olharmos para o religioso sob outra perspectiva e num contexto moderno e adequado aos novos conhecimentos, de forma a todos termos direito ás nossas opções sem constrangimentos nem falsas promessas. [Read more…]

Desonestidade Intelectual

COMO SE FORA UM CONTO

A desonestidade grassa por aí. Faz parte da vida dos nossos dias. Olhando bem, a intelectual é talvez a que mais se nota.

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Nestes dias da visita do Papa a Portugal, muitos, demasiados, previram que os Portugueses iriam demonstrar uma indiferença e um afastamento enormes.

Previsões erradas e desprovidas de bases seguras, no entanto afirmadas e reafirmadas como verdades absolutas.

Às mesas dos cafés, nos locais de trabalho, nos blogues, nos jornais, nas televisões, em tudo quanto é sítio e lado, têm sido inúmeros os ditos jocosos, a chacota e os disparates, de muitos que se dizem agnósticos, ateus, laicos e sérios. A tentativa frustrada de desmotivação das pessoas, e a sobranceria e intolerância das suas opiniões só pode ser considerada patética. O ódio tem estado patente em muitas das palavras proferidas.

Esquecem, porque não sabem [Read more…]

Papa Ratzi

Lady Gaga empresta a voz e o talento ao hino oficioso de Papa Ratzi.Nunca a visita de um chefe de Estado me custou tanto dinheiro. Amen.

Vade retro!


E eu, via Aventar, não quero deixar de dar as boas-vindas a Sua Santidade.

Faltam 18 dias para a visita do Papa a Portugal


E eu, via Aventar, não posso deixar de me associar a este brilhante momento da história de Portugal.

Faltam 19 dias para a visita do Papa a Portugal

E eu associo-me, via Aventar, a este importante momento da história de Portugal.

Faltam 20 dias para a chegada do Papa a Portugal…

E eu associo-me, via Aventar, a este grande momento da história de Portugal.

Carta da Associação Ateísta Portuguesa

Exmo. Senhor

D. Jorge Ortiga

Presidente da Conferência Episcopal Portuguesa (CEP)

cep.sgeral@ecclesia.pt

Quinta do Cabeço, Porta D
1885-076 MOSCAVIDE

Excelência:

A Associação Ateísta Portuguesa (AAP) assiste na comunicação social à pressão que os bispos portugueses exercem sobre o Governo para que seja concedida tolerância de ponto nos dias previstos da visita de Bento XVI a Portugal, no próximo mês de Maio. [Read more…]

O Papa pedófilo


Dir-me-ão que não é a mesma coisa – ser pedófilo ou ser cúmplice de pedófilos. No fundo, vai dar ao mesmo. É tão ladrão o que rouba como o que fica à porta. É tão pedófilo o que viola crianças como o que sabe e fecha os olhos.
Nada de novo, afinal, na história da Igreja Católica. Se olharmos para trás, veremos o exemplo do Papa Júlio II, sodomita «coberto de úlceras vergonhosas» e com vários filhos ilegítimos; Paulo III, um dos mais promíscuos de toda a história do Vaticano e pai de 4 filhos ilegítimos; João X, amante de uma mulher e da sua filha, Marózia, que planeou a sua morte (ela própria amante também do Papa Sérgio III); João XII, que transformou a Basílica de S. João de Latrão num bordel e que se dedicou durante o seu pontificado à prostituição e ao incesto; Vítor III, violador e assassino; Bento IX, que patrocionou e participou em orgias; Alexandre VI, pai de Lucrécia Bórgia e outros 9 filhos ilegítimos e amante de Giulia Farnese, irmã do papa Paulo III; Paulo II, que morreu durante o acto sexual com um pajem de tenra idade; Júlio III, que foi amante e nomeou Cardeal Innocenzo Ciocchi del Monte, um rapaz de rua de 17 anos; Sisto IV, que trocava benefícios aos seus favoritos por prazeres sexuais; e muitos outros que seria fastidioso enumerar.
Dir-me-ão que saber de casos de pedofilia na Igreja e nada ter feito é muito diferente dos casos que citei como exemplos. Pois é. Atendendo a que estamos no séc. XXI, é muito mais grave.

Nota: Na Wikipedia, encontra-se uma referência a Bento XVI, que “deleitou-se em imoralidade” e que era “um demónio do inferno sob o disfarce de um padre”. Trata-se provavelmente de um lapso.

Vaticano cúmplice do nazismo e do fascismo


Por mais desculpas que venham pedir…

Bento XVI quer diálogo com os ateus!!!

Bento XVI quer diálogo com os ateus!!!

 Li o post do amigo João José Cardoso, intitulado a “arrogância dos ateus”, frase proferida por D. José Policarpo na mensagem natalícia. Apesar de o post de João José Cardoso ser curto, diz tudo, e, de facto, acaba como deve: “Não vou perder tempo com isso”. Seria a melhor solução.

E eu seguiria de bom grado o conselho do amigo João, marimbar-me-ia para estes disparates, se gostasse que me comessem as papas na cabeça, e se não tivesse recebido, logo a seguir, um texto enviado por um amigo do Canadá intitulado:”Papa deseja criar espaços de diálogo com agnósticos e ateus”.

 Bento XVI assegurou que a Igreja precisa criar espaços de diálogo e de encontro com agnósticos e ateus, que em algumas sociedades representam um grande número de pessoas. Acrescento eu que está mais ou menos calculado que mais de metade da humanidade é ateia. Mas porque quer BentoXVI criar estes espaços de diálogo, com os filhos do diabo?

“Quando falamos de uma nova evangelização”, diz ele, “talvez essas pessoas se assustem. Não querem enxergar-se convertidas em um objecto de missão, nem renunciar à sua liberdade de pensamento e de vontade. Mas a questão sobre Deus segue desafiando-os” (a mim não, e creio que nenhum ateu sente esse desafio), “ainda que não possam crer no carácter concreto de sua atenção por nós. Penso que a Igreja também deveria abrir hoje uma espécie de ‘pátio dos gentios’, onde os homens possam, de alguma forma, manter contacto com Deus, sem conhecê-lo, antes de encontrarem o acesso a seu mistério, a cujo serviço se encontra a vida interior da Igreja” (a vida interior de muitos, que os há,…acredito,  a vida exterior da igreja não, essa seria a vergonha de deus).

“Ao diálogo com as religiões deve-se acrescentar hoje todo o diálogo com aqueles que enxergam a religião como algo estranho, aqueles que desconhecem Deus” (os burros, os cegos de espírito) “e que, todavia, não gostariam de permanecer simplesmente sem Deus”, (quem o diz?) “mas aproximar-se dele, ao menos como Desconhecido” (quem disse tal coisa tão disparatada?). [Read more…]

A máquina do tempo: Santo Eugenio e os campos de extermínio

Bento XVI, apelou no domingo passado, durante a tradicional oração do Angelus na Praça de São Pedro, a um sentido mais religioso destas festividades, dizendo que o Natal «não é um conto para crianças», mas sim a «resposta de Deus ao drama da humanidade em busca da verdadeira paz».

A mensagem começou com uma expressão de pesar porque em «Belém, que é uma cidade símbolo da paz na Terra Santa e em todo o mundo, não reina a paz». Bento XVI explicou em seguida que o Natal «é profecia de paz para cada homem, compromete os cristãos na tomada de consciência de dramas, com frequência desconhecidos e escondidos, e dos conflitos do contexto em que se vive». Recordou que o Natal tem que fazer com que os homens se transformem em «instrumentos e mensageiros de paz, para levar o amor aonde há ódio, perdão onde haja ofensas, alegria onde haja tristeza e verdade onde haja erros».

Entretanto, a comunidade judaica critica a decisão do papa de aprovar as «virtudes heróicas» de Pio XII, primeiro passo para a sua beatificação, apenas faltando que se reconheça um milagre feito por sua intercessão para que Eugenio Pacelli seja considerado beato.

Será que os judeus têm razão? Vamos ver. [Read more…]

O equívoco da plutocracia

  

 

 

 

 

 Desde que deixei de pertencer ao grupo coral da igreja de Santo António da Polana (Lourenço Marques, Moçambique), raras foram as vezes em que presenciei à celebração de uma missa. Respeitando a Igreja e as suas tradições como é normal em qualquer português consciente do importantíssimo papel por ela desempenhado durante os séculos da formação da nossa nacionalidade, confesso não ter sido bafejado pelo sopro redentor da Fé. Talvez por ignorância ou atávica preguiça, os textos sagrados foram lidos como curiosidades filosóficas, histórias exemplares para a formação da conduta da res publica, ou no pior dos casos, como frutos da superstição necessária que consolidou gentes esparsas num mundo que já foi muito maior.

 

  O discurso pronunciado há uns tempos por Bento XVI em França, carece de cuidadosa atenção. No país de todos os laicismos e de todas as superstições iluministas, o Papa procedeu a um violento e implacável ataque a este novo capitalismo dos nossos dias que parece ameaçar a própria existência da até agora vitoriosa civilização ocidental liberal. Este chamado capitalismo que desde os anos oitenta do século XX foi sendo crismado consoante o surgimento deste ou daquele grupo de manipuladores do sistema, é um perfeito mas odiado desconhecido. Não se lhe reconhecem quaisquer regras nem limites. Não é um capitalismo quantificável em obras, nem materializável em metal sonante.

É uma simples e quimérica abstracção de números e de equações ou teoremas, quantas vezes imaginários, mas  que controlam efectivamente a vida de todos, desde o mais ignoto habitante da Matabelalândia, até ao refastelado accionista do NASDAQ novaiorquino.  Longe vão os tempos dos empreendedores florentinos que se alçaram à categoria principesca pelo patrocínio do Renascimento, pela criação material que fez o mundo ocidental saltar etapas e libertar-se da tacanhez territorial de uma Europa fria, pobre, suja, feudal e sem reminiscências daquele luxo oriental que auferira durante dois milénios.

Já não existem Médicis, nem Függers e no horizonte, erguem-se os guindastes que possibilitam a construção de novos polos económicos que nada têm que ver com a produção de novidades, a promoção de postos de trabalho que tranquilizam a sociedade, ou pelo menos, que se destinem a embelezar a vida dos centros urbanos. Estas provisórias torres de aço, gigantescos Meccano que parodiam aquele famoso guindaste medieval que durante séculos foi erguendo a Catedral de Colónia, servem apenas a mera especulação. Constroem casas de minguada dimensão, sem real valor de investimento e que se inserem naquilo que o medo incutido pela insegurança, habilmente designa por condomínio.

É este mundo de medo e de condomínios que arruina a segurança física e mental de todos. Medo do vizinho que menos pode, medo do estrangeiro que connosco se cruza na rua sem em nós sequer reparar, medo do continente mais a sul, mais a leste ou a  ocidente, onde se trabalha para uma improvável perdição dos nossos.

O simples exercício de um quarto de hora de zapping televisivo, demonstra-nos a fragilidade de todo um sistema perfeitamente virtual e logicamente dispensável. Uma breve visita ao canal Bloomberg ou à CNBC,  consiste num quase paranóico exercício de masoquismo, pois a linguagem cifrada da especulação mais chã e despudorada, evidencia-se na interminável passagem de cifras, siglas, onde uma multiplicidade de termos ininteligíveis procuram conformar aquilo que para a quase totalidade dos cidadãos é absolutamente inexplicável. Consiste num mundo de fantasia alicerçada no éter das suposições de uma economia que não encontra correspondência material na realidade visível. Os serviços – ou aquilo que se imagina existir como tal -, ocupam plenamente o espaço outrora reservado aos golpes de génio de cientistas e estudiosos que mediante aturado labor, nos deram mais tempo de vida, conforto e democracia no consumo acessível para aqueles que jamais conheceram algo mais que a miserável farpela que os protegia do frio, ou a malga de sopa e o bocado de pão que enganava a fome. Longe vão os tempos dos titãs da indústria e da finança. Onde estão os Krupp, os Thyssen, os Vanderbilt, Hearst ou Citroën? Onde param as portentosas realizações sociais daquelas empresas que dentro dos seus muros incluiam creches, hospitais, escolas técnicas, primárias e laboratórios de pesquisa onde o mais humilde podia ambicionar a glória da ascensão pela simples manifestação do talento? Onde estão os herdeiros dos Luíses XIV ou Joões V que  imortalizaram na pedra os sonhos de grandeza e nos proporcionam aquilo que orgulhosamente exibimos como a nossa cultura? Onde estão aqueles Alfredos da Silva que construíram impérios, arrancaram milhares à gleba ancestral e impeliram ao estudo várias gerações que nos deram o mundo moderno de que desfrutamos despreocupadamente e de forma tão ingrata?

 

Este capitalismo dos nossos dias, não é o capitalismo do conceito que aprendemos e que muitos até reprovaram de forma violenta, acabando-o até por copiá-lo travestido de estatismo. É algo de profundamente nefasto, mesquinho e brutal no seu apetite de exploração. Trata-se de uma manipulação iconoclasta que não conhece nações nem fronteiras, que não respeita homens ou locais de trabalho e que para cúmulo da nossa previsível infelicidade, abre de par em par as até agora bem aferrolhadas portas do nosso mundo, possibilitando o ímpeto oportunista de novos comunismos ou aventureiros de ocasião, desta vez providos do ensinamento da História e dos impiedosos recursos tecnológicos que farão sentir o esmagador peso de uma inaudita opressão. É isto o que o futuro parece reservar à totalidade das nações e países, mas teremos ainda a possibilidade de o esconjurar?