2020: o ano de todas as pandemias

2020 foi um ano difícil, que pode ser resumido em poucas palavras: vírus, epidemia, pandemia, medo, confinamento, distanciamento social, máscara, álcool-gel, negacionismo, contágio, zaragatoa, teste, ventilador, profissionais de saúde, SNS, layoff, crise económica, vacina e morte. Talvez pudessem ser acrescentadas mais algumas, que nem me ocorrem nem me apetece procurar, porque não pretendo fazer disto uma obra científica, mas este foi o léxico dominante, durante os nove últimos meses. E, não nos iludamos, continuará a sê-lo.

Muito foi dito e escrito sobre a pandemia. Da “gripezinha” à falsa sensação de segurança, passando pelas habituais conspirações, amplificadas pela ignorância militante, de repente éramos 7,8 mil milhões de especialistas em saúde pública, virologia e gestão de crises. Por cá fomos bestiais, depois bestas, e, quer-me agora parecer, terminamos o ano como culpados pelo agravar dos números. E não, não saíamos mais unidos, mais conscientes ou mais humanos de tudo isto. Saímos como entramos, com as nossas virtudes e defeitos, adaptados ao novo normal que, esperamos, já seja uma recordação distante daqui por um ano. [Read more…]

Sobre ser demasiado, ou as quotas de género

César Alves

A notícia dizia que a Câmara de Paris tinha sido multada por empregar demasiadas mulheres. Veio logo aquele arrepio na espinha: que raio de situação era essa, ainda por cima não sendo saída de um qualquer país demasiado conhecido pelo facto de as mulheres serem cidadãs de segunda?

O problema era simples: a lei das quotas de género, instaurada em 2013, que prevê que nenhum género esteja representado acima dos 60%, foi violada, uma vez que a Câmara de Paris emprega 69% de mulheres. A presidente do executivo, Anne Hidalgo, fez da multa um acto de activismo, assumindo a felicidade por ela e prometendo entregar pessoalmente o cheque.

Eu percebo genuinamente esta felicidade, uma vez que o problema da desigualdade entre homens e mulheres é gravíssimo, demasiado pesado e estrutural. Não a percebo do ponto de vista dos objectivos daquela lei que, desde a sua origem, tem pouco sentido. [Read more…]

A melhor história de 2020

A melhor história de 2020? No estado da Virgínia um grupo de moradores resolveu homenagear Anthony Gaskins, um funcionário da UPS.
Durante anos Anthony entregou cartas e encomendas, sempre sorridente e cumprimentando toda a gente. Nas semanas de confinamento, Anthony não só manteve um serviço eficaz como passou a bater à porta das pessoas para fazer entregas ou apenas para saber se estavam todos bem. Foi um apoio presente nos dias mais complicados, sendo inclusive um dos primeiros a ajudar quem se mudou para aquela localidade durante a pandemia.
Esta semana centenas de moradores organizaram-se para agradecer ao seu carteiro de forma sincera e bonita de se ver, como se pode comprovar no vídeo com a peça da ABC News. Sou fã destas coisas, destas pequenas coisas.
Paulo Franzini

Iluminismo Às Escuras: ideologia ou deriva ideológica?

  Há uns quantos iluminados que confundem o plano ideológico com o plano terreno. Ou então não é confusão, é propósito.
  Deixo aqui o meu manifesto, de uma forma redutora, mas para que não haja dúvidas: sou de esquerda, sou socialista democrata, defendo uma economia democrática, baseada no serviço público e posta em prática por cidadãos conscientes dos seus direitos e deveres em democracia política. Sou socialista, mas também sou democrata. Aliás, antes de ser socialista, sou democrata. Rejeito qualquer tipo de autoritarismo e totalitarismo partidário, rejeito regimes opressores de partido único, rejeito a repressão e a opressão, seja ela de direita ou de esquerda. Sou neto da democracia, da qual os meus pais são filhos e os meus avós são pais. O meu último objectivo, enquanto cidadão e enquanto pensador, é destruí-la. Por tal, não confundo teoria ideológica com a História real; como também não confundo a legítima fé dos Homens com fundamentalismos religiosos.
  Como tal, cada vez mais vejo pessoas da minha geração que parecem não ter aprendido nada com a História e, montadas no ideal (porque hoje o ideal vale mais do que o pensar sozinho), desbravam novos contos de fadas, onde partidos totalitários não são, afinal, assim tão totalitários, onde regimes imperialistas opressores não foram, afinal, tão imperialistas e opressores como pareciam e onde ditadores sanguinários que mataram em nome de um ideal não eram, afinal, tão assassinos como a História mostrou que foram.
  Ter um ideal não nos impede de nada. Não nos impede de questionar, não nos impede de abominar regimes opressores e não nos impede de preferir, sempre, a democracia ao totalitarismo. Identificando-me como socialista democrata, o partido com o qual melhor me identifico com assento parlamentar é o Bloco de Esquerda. Ora, o BE, de raízes pluri-dimensionais, nasceu por oposição a dois partidos: em primeiro lugar, ao PCP, por rejeitar os laivos autoritários e totalitários em que o PCP e os partidos comunistas clássicos redundam; e, em segundo, ao PS, por rejeitar o socialismo dito “real” e uma aproximação do socialismo e da social-democracia à direita. O Bloco de Esquerda é, e sempre foi, um partido que concentra em si várias formas de pensar, à esquerda, diferentes de si mas compatíveis entre si: desde marxistas-leninistas (uma minoria no partido), a trotskistas mandelistas (grande parte da formação do partido foi assente na ideia trotskista de combater o regime opressor soviético) e a socialistas democratas e a sociais-democratas. Não fosse o BE um “partido-de-partidos” (isto é, com base de fundação assente em vários partidos: a saber, UDP, PSR e Política XXI) e não haveria a pluralidade ideológica e de pensamento que existe no Bloco de Esquerda. É também por isto e levado por esta ideia de pluralidade que gosto do BE. Aconselho a leitura do manifesto fundador do partido, de 1999, e deixo aqui o link: https://www.bloco.org/media/comecardenovo.pdf
  Não posso é aceitar que um partido onde me encaixo albergue em si retorcidos mentais que são capazes de enaltecer atrocidades como as que se passaram na antiga URSS e tenham um discurso pró-Partido Comunista. Sei que os há, no Bloco de Esquerda. E, não sendo eu filiado, pouco ou nada posso fazer em relação a isso, senão repudiar e deixar aqui o testemunho da vergonha que sinto por tais factos e dizer-vos que não perceberam nada sobre como o BE surgiu e se fez notar. Comigo não contam para essa “esquerda alternativa” que mais não quer do que uma esquerda antiga baseada na usurpação dos poderes e assente na ladainha dos “trabalhadores e do povo”. Comigo não contam.
  Socialismo, por convicção e pensamento. Democracia, pela Humanidade e contra qualquer tipo de autoritarismo político.

Vem aí uma época de reforço de Lobbies…

Em vésperas de Portugal assumir a Presidência do Conselho da União Europeia, mais de 60 organizações da sociedade civil portuguesa subscreveram uma carta aberta exigindo que, em especial durante este período, o interesse público seja colocado acima dos interesses empresariais. Concretamente, a carta apela a que:

  • o Governo português assegure que os interesses empresariais não tenham acesso privilegiado às suas decisões durante a Presidência (e para além dela)
  • sejam promovidas políticas livres de interesses da indústria de combustíveis fósseis. E acrescenta: “Foi chocante saber que o plano de recuperação do coronavírus do Governo português foi elaborado por um representante da indústria dos combustíveis fósseis. Este tipo de acesso privilegiado deve terminar imediatamente; é contrário ao interesse público e profundamente inapropriado.”
  • seja defendida a transparência legislativa e de lobbying, sendo o Governo instado a “impulsionar o seu registo nacional de transparência dos lobbies, implementando urgentemente a proposta de lei nacional sobre lobbies.” e
  • que o Governo português abra o seu processo de tomada de decisões sobre a UE para permitir o escrutínio por cidadãos e deputados portugueses, afirmando a carta que: “os deputados em Portugal não têm grande capacidade de responsabilizar o Governo pela sua tomada de decisões da União Europeia, nem de escrutinar essas posições antes de serem apresentadas em Bruxelas.

Enfim, vamos tentando fazer ouvir a nossa voz nesta luta de David contra Golias…

Nenhuma nação foi bem-sucedida pondo em prática políticas de esquerda, excepto todas as que foram

Sempre que alguém ousa tecer uma crítica aos abusos do capitalismo, na sua forma mais selvagem e desregulada, rapidamente surge alguém que nos recorda uma de duas coisas (ou ambas): que 1) Cuba e Venezuela existem e que 2) nenhuma nação foi bem-sucedida pondo em prática políticas de esquerda.

Sobre o primeiro ponto, é interessante verificar que raramente se traz a China para esta equação, apesar de se tratar de um regime que monitoriza, persegue e oprime os seus cidadãos como nenhum, talvez com a excepção da Coreia do Norte. Imagino que tal não seja alheio a uma das características desse incriticável capitalismo, na sua forma mais selvagem e desregulada: a China é o seu motor. E porque, é bom dizê-lo, não faltam governos e governantes, no ocidente democrático, a sonhar com um poder (proporcionalmente) igual ao de Xi Jinping. Erdogan, Orbán, Bolsonaro, Borisov ou Morawiechi, os candidatos acumulam-se e já nem se dão ao trabalho de dissimular. [Read more…]

Massacre na Azambuja

Matar animais por satisfação pessoal é cruel, desumano, abjecto. Tenho para mim que existe uma linha que nos separa, humanos normais que cumprem mínimos de decência, dessa subespécie de homens e mulheres das cavernas que matam por um qualquer prazer sádico e doentio. Uma linha vermelha que separa a civilização da barbárie.

Massacrar animais não é caça. E se não é crime, talvez esteja na hora de legislar sobre o assunto, sem perder muito tempo. Porque a caça tem um propósito, ao nível do controle populacional, que, ao contrário de que alguns fazem crer, desempenha um papel fundamental na manutenção da biodiversidade. Mas isto não foi caça. Isto foi um massacre brutal, perpetrado por subgente hedionda que se regozijou com o resultado da matança. [Read more…]

O Chega como cavalo de Tróia do PSD

César Alves

Quem achasse que Portugal estava imune aos fenómenos de extrema-direita que, um pouco por todo o mundo, despontam, foi surpreendido pela ascensão meteórica de André Ventura.

O líder do Chega pode ser apenas a versão portuguesa do que se vê por aí mas, por outro lado, há a possibilidade de nos bastidores estarem a acontecer coisas, invisíveis aos nossos olhos, mas que daqui a uns anos nos façam pensar: como é que não vi isto.

André Ventura, ex-militante do PSD, foi candidato à Câmara de Loures, em 2017, pela mão de Pedro Passos Coelho. Com um discurso xenóbofo, dirigido à comunidade cigana, Ventura, apesar do 3º lugar, conseguiu melhorar o resultado face a 2013, numa autarquia historicamente comunista. [Read more…]

Vergonha nas Presidenciais: Tino de Rans fora dos debates

O presidente do Partido Reagir Incluir Reciclar – RIR, Vitorino Silva (Tino de Rans), momentos após entregar o seu processo de candidatura às Eleições Presidenciais, no Tribunal Constitucional, em Lisboa, 23 de dezembro de 2020. JOSÉ SENA GOULÃO/LUSA

Tino de Rans, por opção das três televisões, não participará nos debates frente-a-frente que ocorrerão nos dias 2 a 9 de Janeiro.

A candidatura de Tino tem, à face da Lei e da Democracia, o mesmo valor de todas as outras. Esta exclusão revela de um elitismo absolutamente escandaloso. O facto de a televisão pública ser cúmplice desta situação é ainda mais vergonhoso, mas, em Portugal, a televisão é pública para receber dinheiro e privada para o gastar.

Os restantes candidatos têm, aqui, uma ocasião para confirmar que fazem, verdadeiramente parte do jogo democrático. É fácil: deverão recusar-se a participar em debates, a não ser que esta situação seja alterada.

Este é, demasiadas vezes, o país do senhor doutor, do respeitinho e pasto da partidocracia. Há um cheiro a mofo muito perigoso, até porque a humidade pode dar cabo das fundações de uma casa.

Declaração desinteressante de interesses: até hoje, não estava a pensar em dar o meu voto a Tino de Rans.

Feliz Natal

A todos os autores, comentadores e leitores que nos visitam.

Breve pensamento avulso sobre a corrupção

Pensamentos lapidares de uma cultura nacional que vai custar muito mudar, para se conseguir melhores níveis de exigência e, também, de conduta:

  • Rouba mas faz obra.
  • São todos iguais.
  • Todos querem mama.
  • Se estivesses lá fazias igual.
  • Se eu pudesse também comia.
  • Não vai dar em nada.

E o mais lapidar de todos:

  • Estou-me a cagar.

Mudar isto é o grande desafio, pois não bastam leis. É preciso gente com vontade e com poder para o fazer.

Até lá, resta o estado de alerta reactivo da sociedade civil.

Manifesto anti-Natal

Faltam três dias para o Natal. Significa que chegou a hora do meu Manifesto contra o Natal. Atenção, eu celebro e até aprecio todo o espírito da época, mas não posso deixar de notar nos motivos que nos levam a fazer desta data tão especial.

O Natal é a maior prova de que o Homem tem noção da sua falibilidade. Iludimo-nos com a ideia de que o mundo está cada vez mais feito pelas pessoas, mas ainda continuamos a rejeitar a nossa natureza. Somos capazes de considerar a época do ano em que celebramos o nascimento de alguém que não conhecemos mais importante do que o nosso próprio aniversário.

Todos nós temos pensamentos reprováveis e instintos deploráveis. É o controlo sobre eles que faz de nós boas pessoas ou não. Implícita ou explicitamente, temos a noção dos nossos defeitos como seres errantes e precisamos de desculpas como o Natal, a Páscoa ou até mesmo aniversários.

Nesta época, podemos ver um dos grandes males do capitalismo geral em que vivemos. Sim, porque quando há liberdade, há espaço para o bom e para o mau. É nesta época que os sentimentos das pessoas são materializados de todas as maneiras. Somos obrigados a dar presentes por causa de uma data e não pela pessoa em si. Somos obrigados a estar bem dispostos na Consoada. Se pensarmos nisto sem qualquer preconceito ou tribalismo, não faz sentido. Não é o calendário que tem emoções, somos nós.

Durante o ano, nunca temos tempo para nada. Muito trabalho. Muitos estudos. Chega mais um aniversário de Jesus Cristo e todos nos lembramos que temos de mandar umas palavras aos nossos queridos amigos e familiares. [Read more…]

A Banalização da História

A História não é estática. Engane-se quem pensa que sim. A História é, antes de tudo, História. Contudo, o passado não nos pode amarrar nem, em sentido contrário, nos desprender. A História há-de ser sempre uma lição, um alerta e, sobretudo, um facto. Questionar a História faz-nos bem, desperta-nos e ensina-nos.

Há hoje uma tendência para a desvalorização histórica. O que não pode acontecer, não é aceitável e, em contra-senso, demonstra-nos uma falta de noção histórica de quem envereda pelo caminho da desvalorização e da falta de noção histórica.
Certas franjas à direita insistem hoje num discurso que envergonha a noção histórica.

Tenho ouvido, por mais do que uma vez, a comparação entre o tempo da Outra Senhora e os tempos que vivemos. Seja porque estamos hoje limitados na nossa liberdade de associação (por conta da pandemia), seja porque certa direita não aceita o Governo de esquerda que se encontra no poder. Desvalorizar os acontecimentos passados, comparando-os aos acontecimentos do presente é, antes de ser demagogia pura e dura, um “cuspir” na História e naqueles que a viveram. Antes de podermos entrar pela demagogia adentro e compararmos a democracia em que vivemos a uma ditadura passada, teremos de aprofundar as nossas noções históricas, quer sejamos de esquerda ou de direita.

A luta pelo regime democrático não pode escolher lados, mesmo que a ditadura que se instalou em Portugal durante mais de quarenta anos tenha sido de direita. A luta pelo regime democrático deve tocar-nos a todos: socialistas e todos no seu espectro, liberais e todos no seu espectro. Contra todo o tipo de extremismos: de direita ou de esquerda.

Quando se tenta encobrir e desdenhar tempos em que a PIDE ostracizava, perseguia, torturava e matava é desonesto, mas, acima de tudo, é uma atitude ignóbil e ignorante de quem não respeita nem estudou História. Compará-la aos tempos modernos é boçalidade. Repito: o combate aos nacionalismos, aos fascismos e aos atropelos contra a Humanidade, deve pertencer a todos os que acreditam na República e na Democracia.

Assumo-me de esquerda. Defendo o socialismo democrático. Num passado recente governou em Portugal um Governo de direita, encabeçado por Pedro Passos Coelho e apoiado em democratas-cristãos. Por muito que esse Governo tenha atropelado certos direitos e tido tiques de autoritarismo com cheiro a velho, nunca, mas nunca, o poderei equiparar a um Governo fascista, liderado por António de Oliveira Salazar, Governo esse que se regia pela opressão e repressão dos seus cidadãos, que se escudava numa polícia política impiedosa, injusta e assassina, e que reforçava o seu poder através das suas colónias.

A banalização da História é tema para os ignóbeis. O combate contra qualquer extremismo, seja de direita ou de esquerda, repito de novo, cabe a todos os democratas, sejam estes de direita ou de esquerda. O resto fica com a ignorância histórica. O resto, nunca mais.

Nos tempos modernos: fascismo nunca mais.
25 de Abril, sempre!

Aventando desde Belgrado

Fortaleza de Kalemegdan
Autor: Djordje Jovanovic

 

Chamo-me Paulo Franzini, sou natural de Vale de Cambra e resido em Belgrado desde 2011. É para mim um gosto juntar-me a este blogue de referência e largar também umas coisas ao vento. Para além dos temas normalmente aqui abordados, pretendo acrescentar algo sobre os Balcãs, ainda pouco conhecidos e quase exclusivamente associados aos conflitos que marcaram o fim da Jugoslávia. Mas acreditem em mim, os Balcãs têm muito para oferecer. Entre várias atracções destacam-se Belgrado, Sarajevo, Skopje (ou Escópia), a baía de Kotor no Montenegro, a costa da Croácia e Ljubljana. Conhecida como uma região montanhosa, apresenta várias riquezas naturais e um enorme acervo de contrastes culturais e históricos que influenciam desde a arquitectura a culinária.

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Quando um elogio é um insulto

João Miguel Tavares elogiou os professores. O Paulo Guinote já escreveu que dispensa certos elogios.

O combate às desigualdades sociais é muito complicado, especialmente quando as prioridades dos governos correspondem a outras áreas em que há fartura de desperdício de dinheiros públicos.

Essas desigualdades são especialmente revoltantes quando atingem crianças e jovens. São essas desigualdades que, se combatidas demasiado tarde, provocam atrasos culturais e mesmo cognitivos.

A Escola é, evidentemente, um das armas mais importantes desse combate. Por isso, retirar condições às escolas é criminoso – e os verdadeiros problemas continuam por resolver (número de alunos por turma, delírios curriculares, burocratização inútil do trabalho dos professores).

A dedicação de todos os que trabalham nas escolas é tão evidente e geral como frequentemente desvalorizada. E, na verdade, é nas escolas que muitos miúdos encontram pessoas que, fora da família, fazem alguma coisa por eles. As políticas sociais para a juventude assentam, então, em grande parte, na ausência do Estado e na presença da Escola. Acrescente-se que essa luta é feita, muitas vezes, para lá do que é imposto pela lei.

João Miguel Tavares e muitos outros opinadores chegam sempre a estes problemas com atraso ou acertam ao lado. Na maior parte dos casos, não querem saber. Como, de certo modo, já está instituído que as políticas sociais para a juventude se limita às escolas, o facto transformou-se em direito e passou a exigir-se às escolas que resolvam todos os problemas relacionados com a infância e com a juventude. [Read more…]

Fim da Linha

Linha do Algarve

The Rio-Ventura emoji-chatice connection

Não se descarte a possibilidade de estarmos perante uma conspiração de assessores do PSD e do Chega, a soldo de socialistas, da extrema-esquerda ou da Venezuela. Ou, quem sabe, perante uma coligação informal que, em princípio, terminará no dia em que Ventura, triunfante, regresse ao PSD para tomar conta do aparelho. Seria uma grande chatice, é certo, mas os emojis compensarão a maçada.

Ana Gomes: nem carne, nem peixe

A transição de um certo eleitorado bloquista disposto a votar em Ana Gomes é real e preocupa-me.
A minha análise pessoal é a de que as pessoas, dispostas a votar em Ana Gomes, não estão a ver todo o panorama eleitoral e as consequências políticas que daí podem resultar. Marisa Matias vai a jogo com o apoio do Bloco de Esquerda, ao contrário de Ana Gomes, que sendo do Partido Socialista, não conta com o apoio do partido. As consequências políticas de um futuro resultado de Ana Gomes e de Marisa Matias são diferentes; porque Ana Gomes e Marisa Matias, mesmo estando as duas à esquerda, são diferentes e candidatam-se com programas e propósitos diferentes.
Quando a eleição acabar, Ana Gomes continuará onde está. E Marisa Matias também. Ana Gomes como comentadora num qualquer canal generalista, a levantar muito a voz e a dar uma sua opinião sobre um qualquer tema. Marisa Matias como deputada no Parlamento Europeu, eleita pelo Bloco de Esquerda, em representação da esquerda europeia e de todos e todas nós, portugueses e portuguesas que, à esquerda, querem uma Europa mais livre, mais justa e mais igualitária.
A transição de eleitorado que, em legislativas, vota Bloco de Esquerda e que, dia 24 de Janeiro, pretende votar em Ana Gomes, esquece-se que votar na Independente é enfraquecer a esquerda (que segundo as sondagens não perfaz, junta, a votação de Ana Gomes – e falo de Marisa Matias e João Ferreira) e fortalecer a extrema-direita de André Ventura, ficando este à frente dos candidatos da esquerda e apenas atrás de uma Independente sem apoio partidário e de Marcelo Rebelo de Sousa, que segue para uma re-eleição tranquila, com o apoio da direita mainstream (PSD e CDS), e que, mais à frente, essa ultrapassagem (pela direita) poderá ter repercussões em futuras Legislativas. Muito menos aceito que certas pessoas votem em Ana Gomes levados pela “promessa” de André Ventura, de que, ficando atrás desta, se demitiria do Chega: 1- é óbvio que não se demitirá; 2- mesmo que o fizesse, isso tiraria o Chega do Parlamento e da vida política? A resposta é não.
Há duas coisas mais ou menos certas: Marcelo Rebelo de Sousa será re-eleito e Ana Gomes ficará em 2º lugar, seja com 16% ou 13%. Agora é convosco decidir quem fica em 3º, se o candidato da extrema-direita ou algum dos candidatos da esquerda. Menos dois ou três pontos percentuais em Ana Gomes continuarão a mantê-la em 2º, mas mais 2 ou 3 pontos percentuais em Marisa Matias ou João Ferreira podem ser a diferença entre fortalecer a extrema-direita ou colocá-la atrás da esquerda.
Falo, especialmente, para os jovens. Pensem à frente: uma eleição não é apenas uma eleição. Muito menos esta. Quem se diz de esquerda aproveitará este clima de facções e polarização política para reforçar, com o seu voto, a esquerda. Signifique isto votar em Marisa Matias ou em João Ferreira, não em Ana Gomes que vai em representação dela própria, votando em consonância com o presente mas, acima de tudo, com aquilo que se perspectiva no futuro. E esse futuro, estou certo, não terá Ana Gomes como cabeça de cartaz. Mas poderá ter Marisa Matias e/ou João Ferreira.

O estranho caso de Ihor Homeniúk

A morte de um ser humano em Portugal sob tortura perpetrada pelo Estado português, seria, não há muito tempo, razão para um escândalo de contundente repercussão política.

Todavia, o que se assistiu foi a uma brandura de tratamento, transversal a toda a sociedade portuguesa.

Até a página da Amnistia Internacional  Portugal, não deu grande relevo a semelhante crime ignóbil (o nome de Ihor Homeniúke é apenas referido num texto recente).

Isto numa sociedade como a portuguesa, marcada, fortemente, por valores humanistas que fazem de nós, enquanto povo, gente com repulsa pela violação da dignidade humana, gente solidária e predisposta a acudir.

Além da habitual “exigência” de “apuramento de responsabilidades”, pouco mais ou mesmo nada a dita sociedade civil e as organizações políticas em geral exigiram sobre algo que deveria ter causado engulho e revolta.

Quando, recentemente, as rede sociais começaram a movimentarem-se na demanda por explicações, aos poucos lá começaram a aparecer algumas reacções.

Começou-se, então, a construir na comunicação social a ideia de que o que se passou com Ihor Homeniúk é um problema de procedimentos do SEF.

Uma bela forma de transformar um homicídio numa mera relação de causa/efeito. [Read more…]

Demita-se!

Faça um favor a si mesmo e ao país, Eduardo Cabrita. Ganhe vergonha na cara e demita-se.

É um favor que faz também ao Primeiro-Ministro, o qual já tem culpa por manter a “total confiança” política em alguém que não a merece. E ao fala-barato presidencial que até agora se manteve reservado.

Mas, sobretudo, é um serviço que presta ao país, face ao enxovalho que recebemos internacionalmente e, sobretudo, ao assassinato de uma pessoa por parte dos que exercerem funções no Estado português.

Um assassinato!

Cabrita diz que andou preocupado nove meses. E porém, isso não o impediu de mentir ao parlamento e de demorar 17 dias a abrir um inquérito, quando o assunto foi tornado público pela comunicação social. No SEF e no ministério, primeiro tentaram esconder, depois usaram a peneira para tapar o sol e agora, apertados, estrebucham.

Sobre a ideia do botão de pânico, é uma constatação de que há motivos para pânico quando alguém vai ao SEF.

Dissolver o SEF? O problema não é a estrutura, mas sim as pessoas dessa estrutura. E estas não vão desaparecer. Mais do que mudar a estrutura, importa mudar os comportamentos que conduziram a este crime. Assim, com o que está a ser feito, mais parece um movimento para proteger o ministro do que uma tentativa de se resolver o problema.

Concluindo, é mais um episódio, este o mais grave de todos, de um ministro que não tem auto-crítica quanto ao que diz e faz.

Putin falou

 

Depois da Rússia ter dado os parabéns a Joe Biden ficaram os republicanos autorizados a reconhecer a vitória de Biden. Se assim não foi, parece.

O minion também abriu o bico.

Falta só arrumar o looser na prateleira dos candidatos a ditadores que viram o poder lhes escapar por inépcia própria, já que ele não se arruma a si mesmo.

Fecha-se metade do circo. A outra metade, essa que prefere ver gigantes onde há moinhos de vento, ainda continuará na sua bolha, encapsulados num mundo onde cabe a Terra Plana, o QAnon e a vitória de Trump.

Em Portugal, há quem seja condenado por fatos

Music with classical colours and a jazz touch, but fundamentally using the structure of pop music. (1)
A chord is made up of a tonic, a “third” (3 notes above the tonic) and a fifth. It’s the third that determines if it is major or minor. A tonic and a fifth is an “open” interval, like my two favorite notes C and G (also my initials) , a sound that is neither major nor minor. If the third is raised (E), it’s major. If it is lowered to the left (E flat), it is minor. Move your finger back to the right, and it’s major again. Left -minor. Right – major. Right-wing politics, left-wing politics… it’s all there. (2)
Chilly Gonzales

***

Efectivamente, em Portugal, há quem seja condenado por fatos relativos à prossecução dos seus objectivos e, como é sabido, há quem se esteja a marimbar para isso, nomeadamente quem nos meteu neste sarilho.

Que sarilho? Não sabeis?

Ei-lo:

Por vezes, em momentos destes, apetece-me fazer como Chomsky e dizer:

You just took me from the middle of a long article on new technical work to try to extend what’s called the Minimalist Program, which is an effort to provide genuine explanations for linguistic phenomena, by reducing them to elements so elementary that they satisfy conditions of evolvability and learnability, which are very narrow and strict empirical conditions. So it’s basically trying to show that, to put it kind of fancifully, that mother nature designed language as a perfect system for expression of thought – not very good for communication. That was not a consideration. But it’s very well designed for expression of thought. And it may, in fact, constitute thought- traditional view – which is not implausible, which, if correct, means that people like you are the only organisms with thought in the entire history of life and maybe in the entire universe.

Os meus votos de muita saúde, com Óptimas Festas e um Espectacular 2021.

Até para o ano.

***

Em causa: a coragem dos Ministros da Energia em relação ao TCE

Ontem e hoje está a decorrer a reunião do Conselho de Ministros da Energia da UE. Em cima da mesa, devido à enorme pressão da sociedade civil, está o Tratado Carta de Energia (TCE) – o maior obstáculo à luta contra as alterações climáticas na Europa.

É este um momento especialmente explosivo, dois dias antes da Conferência da Carta da Energia, que se realiza quarta-feira/quinta-feira desta semana.

Conseguirão os Ministros aprovar uma estratégia para a retirada colectiva da UE do TCE?

Até agora, os governos têm-se remetido para o processo de modernização do TCE que está em curso. Mas as alterações relevantes ao tratado exigem unanimidade dos membros, o que, segundo revelam as negociações, não é atingível. [Read more…]

Joe Biden

… já foi eleito tantas vezes, nas últimas semanas, que poderá ser obrigado a cumprir três ou quatro mandatos seguidos.

Portugueses que sabem que houve fraude nas eleições americanas

Há portugueses que têm a certeza absoluta de que houve fraude nas eleições americanas. Viram, com aqueles olhos que a terra há-de engolir ou que o crematório reduzirá a pó, vídeos e provas (evidências, em português técnico) que mostram irrefutavelmente a vergonha que foi a eleição de Joe Biden.

Eleição, ponto e vírgula, que aquilo não foi eleição nenhuma, foram truques atrás de truques, porque há coisas que não passam cá para fora.

(coisas que não passam cá para fora é uma expressão que só conseguimos encontrar em ambientes altamente especializados, frequentados por especialistas doutorados pela universidade da vida, do balcão de café e das caixas de comentários. As coisas que não passam cá para fora são escondidas lá dentro por gente que não quer que se saiba. Os especialistas em coisas que não passam cá para fora têm, no entanto, acesso privilegiado a toda essa informação. Aquilo que garante que sabem de que é que se está a falar fica patente em afirmações como “e mais não digo”, que é, no fundo, um diploma oral, ou “você sabe muito bem de que é que estou a falar”, frase acompanhada de uma fungadela elucidativa e de um sapiente arquear de sobrancelha) [Read more…]

Brandos costumes pidescos

Assinalou-se, na Quinta-feira, o Dia Internacional dos Direitos Humanos, e o momento não podia ser mais oportuno, na medida em que o país parece ter acordado para o estranho caso do cidadão ucraniano que foi espancado e torturado até à morte por inspectores do SEF, nas instalações desta força de segurança, no aeroporto Humberto Delgado. Uma bela forma de homenagear o resistente antifascista que dá o nome à infraestrutura.

Qual é o problema desta nossa indignação colectiva? É que já passaram nove meses desde que este atentado contra os direitos humanos foi perpetrado. E, com a excepção de algumas jornalistas, como Valentina Marcelino, Fernanda Câncio, Joana Gorjão e Daniel Oliveira, entre (poucos) outros, a opção pelo silêncio foi geral. Não tendo o caso sido abafado, pouca importância lhe foi dada nos headlines e alinhamentos noticiosos. As redes sociais, sempre implacáveis, não ebuliram como habitualmente acontece com casos de racismo, ou de tiradas xenófobas da extrema-direita. Um silêncio que envergonha, mais ainda por ter feito parte dele. [Read more…]

Por falar em cadáveres políticos

Donald Trump e seus fiéis seguidores viram a teoria da conspiração eleitoral mandada às favas pelo Supremo Tribunal dos EUA, onde os conservadores têm seis juízes, três dos quais nomeados por Trump, e apenas três progressistas. Mesmo assim, Trump perdeu. Neste como em todos os processos que a sua equipa moveu, no âmbito das presidenciais. E, mesmo sem provas, sem factos que sustentem a teoria, o lunático insiste no culto da fraude, qual líder espiritual a conduzir uma seita de milhões para o abismo do ridículo, mas também da radicalização cega, que não pode deixar de preocupar todos os democratas. Lá como cá. Porque isto não estará muito longe daquilo que seria ter que lidar com “vocês sabem quem” no poder.

Pessoas que dizem que os outros têm mas é inveja

A crítica é algo tão desagradável que chega a ser desagradável até para o crítico. O criticado nunca gosta – é como perder um jogo: pode-se disfarçar, pode haver contenção, uma piada descontraída, mas é sempre mau.

São várias as reacções do criticado. Se for educado, será contido, declara que aceita, mentindo em grande parte, mas pensando sempre que a crítica é o fumo que prova a existência de um fogo.

Há, contudo, muitos mais espécimes. Há o criticado que afirma aceitar a crítica, mas. E a seguir ao mas, vêm desculpas não necessariamente esfarrapadas, porque também há desculpas bem vestidas, perfumadas.

Dentro do criticado nitidamente desagradado, há uma grande variedade de raças. Uma delas é o que critica a crítica, reclamando que seja construtiva. Ora, a verdade é que a crítica só é bem feita se for destrutiva – porque a crítica serve para destruir, cabendo ao criticado reconstruir a partir das ruínas.

O meu preferido, entre os desagradados, é o criticado que acusa os críticos de serem unicamente motivados pela inveja. Neste caso, o crítico só critica porque, no fundo, quer ser como o criticado.

Um dos mais conhecidos exemplares desta variedade é José Rodrigues dos Santos (JRS), acolitado por muitos dos seus fiéis. Diante das críticas de que é alvo nas várias actividades que pratica, JRS limita-se a acusar os outros de [Read more…]

A minha social-democracia é melhor do que a tua

Vejo por aí muita indignação com a afirmação de Marisa Matias, que se autoproclamou social-democrata. Vinda dos lados do PSD é irónico, visto tratar-se de um partido que, de social-democrata, tem apenas o nome. Poderá até tê-lo sido até ao início da década de 80, mas fechou a social-democracia numa gaveta, há muitos anos, e nunca mais de lá a tirou.

Vamos a factos: o PSD é um partido de direita conservadora, cada vez mais liberal no que toca a políticas económicas, característica que se começa a evidenciar com Durão Barroso e que atinge o ponto alto com Passos Coelho. Já a social-democracia, ideologia progressista que se situa no centro-esquerda do espectro, é filha do socialismo e neta do marxismo. [Read more…]

André Ventura, a voz de toda a direita

Entre muita direita, mesmo a católica, há a ideia de que só está desempregado quem quer ou só é pobre quem não tem mérito para ganhar dinheiro.

O Chega, para viabilizar a geringonça açoriana, impôs a redução dos apoios sociais no arquipélago. Os pobres e/ou os desempregados têm é de se fazer à vida.

Essa mesma direita – que inclui o PS do Manuel Pinho que aconselhava a investir em Portugal, porque temos salários baixos – está sempre a gritar que é preciso criar uma legislação laboral mais flexível, que é preciso poder despedir mais facilmente.

André Ventura vem, agora, com a ideia de que é preciso pôr essa malta do Rendimento Social de Inserção (RSI) a trabalhar, continuando a pagar-lhes o mesmo.

Não sei se isto é próprio da esquerda, mas acredito que, num país civilizado, é assim: o trabalho implica salário e não esmola ou subsídio. Há trabalho para se fazer? Pague-se um salário.

É verdade que o Estado é um dos patrões que mais se alimentam de vários embustes, como o de não abrir vagas necessárias na Função Pública, impondo a precariedade – basta ver os milhares de professores que trabalham há anos sem vínculo, o que mostra que são necessários ao funcionamento de um sistema que só lhes quer pagar o mínimo possível, uma espécie de trabalhadores à jorna, carne para canhão. O inaceitável praticado por uns não torna aceitável qualquer inaceitável.

Ventura não diz as verdades, mas diz aquilo que muita gente de direita gosta de ouvir e nem sempre tem coragem para dizer, por saber que é eticamente vergonhoso. A subida do Chega faz-se à custa, aliás, desta gente que não gosta de sociedade e que prefere a selva, aquela em que apenas sobrevivem os mais fortes. Ventura é só um PSD que perdeu a vergonha.